Afinação de Conversa

Maestro da parolagem, o “Afinador de Conversa” tem sua função só reconhecida em Curitiba, sendo que o nosso maior expoente na arte da boa prosa foi o publicitário Sérgio Mercer (foto), tibagiano que infelizmente nos deixou falando sozinhos. Por ser um ofício a caminho da extinção, considerando-se que hoje a maioria das pessoas só conversa pelo celular, o também perito conversador Ernani Buchmann redigiu os estatutos do recém-criado Instituto Curitibano de Afinação de Conversa (ICAC).

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Art. 1º. Fica criado o Instituto Curitibano de Afinação de Conversa, a partir de agora referido como Instituto.

Parágrafo único. O Instituto tem como patronos, por ordem alfabética, Gilberto Ricardo dos Santos, Nireu Teixeira, Osíris de Brito e Sérgio Mercer, personagens da cena curitibana, “que se fuerón a ayer a Chacarita, pero están vivos para nosotros”.

Art. 2º. O Instituto é uma entidade com fins lucrativos, cuja sede se localiza em torno da mesa de um restaurante previamente escolhido, ocasião em que se reúne.

Parágrafo único. Por fins lucrativos entenda-se a necessidade dos componentes lucrarem alguma coisa com as histórias contadas pelos demais.

Art. 3º. O objetivo do Instituto, por supuesto, é afinar conversas, conceito que permite a participação de personalidades diferentes na mesma mesa, unidas pela graça do tema proposto e reverenciando o que seja inteligente, saboroso e engraçado.

Art. 4º. As reuniões do Instituto permitem que se fale mal dos ausentes.

Parágrafo primeiro. Será permitido falar mal dos presentes se houver aquiescência dos referidos, quando lhes poderá ser dado o direito à palavra.

Parágrafo segundo. Sobre o previsto no parágrafo anterior, há controvérsias.

Art. 5º. O Instituto incorpora o patrimônio da extinta Fundação Osíris de Brito, incluindo o capital intelectual e etílico que ela amealhou, além de alguns de seus componentes.

Art. 6º. O Instituto é uma entidade que privilegia a diversidade, tendo entre seus componentes canhotos, polacos, obesos e idosos, mas sobre isso não há unanimidade.

Parágrafo único. O Instituto não aceita a entrada de chatos e obtusos em geral, por serem considerados desafinadores de conversa.

Art. 7º. Aos associados do Instituto cabe a proposta de admissão de novos componentes, a serem aprovados por ampla maioria dos presentes.

Parágrafo primeiro. Ampla maioria quer dizer todo mundo. Candidato com veto vai jantar em outra freguesia.

Art. 8º. O Instituto será dirigido por diretoria a ser eleita provisoriamente com mandato até 2046, quando serão convocadas eleições gerais.

Art. 9º. Fazem parte do Instituto os seguintes associados:

Parágrafo primeiro: quem a gente considere nosso amigo.

Parágrafo segundo: quem seja amigo dos nossos amigos, desde que submetido à aprovação da maioria, conforme o artigo 8º.

Art. 10º. Revoguem-se as disposições em contrário e vamos ao que interessa.