Ao criar o mundo, Deus usou de todas as suas múltiplas vocações para fazer do planeta Terra um vasto campo de experimentações e, assim, colher subsídios para criar no futuro uma nova civilização. Com criaturas mais inteligentes e semelhantes ao Criador.

continua após a publicidade

Como arquiteto, botou todos os japoneses do Universo numa pequena ilha para ver como eles se sairiam com problemas de habitação, mobilidade e divisão de espaço. Engenheiro, Deus concentrou no Hemisfério Norte os terremotos, na esperança de que alguém lhe ajudasse a resolver uma falha de cálculo estrutural que nem mesmo Ele conseguiu resolver. O Deus da música fez nascer na Inglaterra quatro cabeludos, para sentir como a humanidade reagiria ao som do rock.

E assim por diante, até o Deus sociólogo criar Curitiba com a intenção de fazer um estudo do comportamento da classe média. Quando as estatísticas registram que a cidade é majoritariamente de classe mediana, não é apenas uma constatação socioeconômica. É a vontade de Deus.

De vez em quando o Todo Poderoso pergunta:

Como vai você, classe média?

Ela responde:

 – Vou levando, devagar e sempre, essa vidinha mais ou menos!

Com cinco andares abaixo da terra e mais de vinte quilômetros de corredores, era nas catacumbas romanas que os cristãos se refugiavam dos perseguidores, enterravam seus mortos e realizavam seus cultos de fé. Séculos e séculos depois, as catacumbas modernas são os nossos centros comerciais, com vários andares acima e abaixo da terra, quilômetros de corredores, onde os filhos de Deus se protegem da violência e celebram cultos à deusa Grife.

Abaixo e acima da terra, o homem do século XXI procura abrigo em cavernas de concreto e gesso, na linha do horizonte as ruas estão condenadas à morte. Em Curitiba, estamos assistindo a um genocídio viário. Barão do Serro Azul (com S no original e com C no nome da rua), coitado, morreu duas vezes. Como se não bastasse ter sido fuzilado na Serra do Mar, falecido está como uma via urbana baleada pela degradação da Rua Riachuelo, do Passeio Público e adjacências. Saldanha Marinho é um caso exemplar de desmerecimento da memória do vulto histórico. Ai!, as calçadas da Saldanha – fizeram dela um supermercado ao ar livre de drogas.

Cada tem a sua cruz, a da boemia é a Cruz Machado. Rua que faz esquina com a Visconde de Nácar, onde o ex-prefeito Saul Raiz quase morreu baleado, sem uma boa alma à vista para o socorrer. 

Para não dizer que não falamos de flores, que fim levaram as floriculturas à beira das calçadas? No enterro das ruas, não teremos nem mesmo o perfume dos lírios. Nas catacumbas modernas até as rosas cheiram a isopor.

continua após a publicidade