Tramita no Congresso a proposta que pretende alterar a ortografia do Português do Brasil. Segundo o jornalista Eduardo Aguiar, essa nova revisão ortográfica visa facilitar a vida daqueles que digitam com uma só mão enquanto dirigem. Ou para aqueles que dirigem o Brasil e que, por não saberem digitar um parágrafo sem o socorro de um “acesor” de gabinete, pretendem simplificar o idioma com sugestões como essa: acabar com o “ç”, “ch” e “ss”, além e abolir o “H” no início de palavras e o fim da vogal “U” depois da letra “Q”, em casos como “queijo”.

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É o que dá deixar na mão dos políticos o destino do idioma de uma nação. De fato, se o Brasil fosse um país sério e com dirigentes que conseguissem formular uma frase com começo meio e fim (a presidenta é um exemplo), as regras ortográficas seriam mantidas. No mínimo tão respeitadas quanto as regras do futebol, que não mudam sob o risco de um levante popular.

É de fazer rir (ou chorar) um projeto debatido na Comissão de Educação do Senado para “facilitar” ensino e a aprendizagem da língua portuguesa. Na França, essa incumbência seria confiada à Academia Francesa, instituição fundada em 1635 pelo cardeal Richelieu com a missão de estabelecer regras gramaticais, ortográficas e literárias, embora sem força de lei.

Na Espanha a fixação de normas ortográficas compete à Real Academia Espanhola, em cooperação com as academias dos países latino-americanos de expressão espanhola e a academia das Filipinas, ex-colônia de Madrid. Essa responsabilidade vem do século XIX, sem necessidade de qualquer acordo ortográfico destinado aos 21 países que usam o castelhano como língua oficial e aos mais de 400 milhões de pessoas com esse idioma materno.

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Na Inglaterra, assim como nos Estados Unidos e nos restantes 53 países onde o inglês é língua dominante, não existe nenhuma entidade reguladora. Muito menos uma convenção ortográfica comum e seria o fim do mundo a rainha Elizabeth trocar uma letra da obra de Shakespeare – como aqui tentam fazer com a obra de Monteiro Lobato.

Lembra o escritor português Pedro Correia (autor do oportuno livro “Vogais e consoantes politicamente incorretos do acordo ortográfico”), que “na velha tradição britânica de que não é função do Estado ocupar-se da gramática ou da ortografia, não existem sequer regras ortográficas oficiais do inglês, tendo o idioma na sua versão escrita estabilizado desde a segunda década do século XIX, na sequência da publicação dos dicionários de Samuel Johnson (1775) e Noah Webster (1806). As diferenças de escrita, dentro do mesmo idioma, são acolhidas com inteira naturalidade. No essencial, um escritor norte-americano, canadense ou australiano de hoje utiliza a mesma ortografia usada por Charles Dickens, que começou a publicar as suas obras muito antes de Eça de Queirós”.

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