A despedida de Julio Iglesias e a canja do desembargador

O cantante espanhol Julio Iglesias irá se despedir dos palcos com uma turnê pelo Brasil nos meses de setembro e outubro. O adeus a Curitiba acontece no dia 1º de outubro, em única apresentação no Teatro Guaíra. Aos 70 anos, um dos artistas mais aclamados da música latina é um estimado conhecido dos curitibanos, não só pelos sucessos “Manuela”, “Hey”e “Crazy” como por “Begin the Beguine”, o clássico que originou em Curitiba a famosa “Lenda do Gato Preto”.

Assim que foi anunciada a despedida de Iglesias no Teatro Guaíra, alguns amigos me perguntaram por que não aproveitar a despedida para checar a veracidade da “Lenda do Gato Preto”. Se querem saber, digo que se a história for verdadeira perde a graça. Prefiro a lenda!

 Para quem não conhece, a história, ou lenda, teria acontecido quando Iglesias, hospedado no Hotel Bourbon, sumiu na noite curitibana. Na portaria ninguém sabia dele e, mesmo depois de muitas buscas, nem mesmo nos braços de uma formosa hóspede o belo se encontrava.

Depois de muitas buscas, onde estaria Julio Iglesias? Foi chamada então a Polícia Militar que, em seguida, recebeu a ordem de enviar a viatura urgente ao Gato Preto. Um quebra-quebra estava acontecendo no local, dizia o rádio. Quando os dois patrulheiros chegaram ao Gato Preto (a poucas quadras do hotel), quem estava no meio da confusão, agarrado pela turma do “deixa-disso”? Ele, todo vestido de preto, o próprio Julio Iglesias.

Como Iglesias foi parar no Gato Preto não se sabe com certeza. O que se sabe é que ele teria chegado sozinho, foi direto ao músico que estava no teclado de uma “porrinhola” e pediu para cantar uma música: “Begin the Beguine”.

O azedo tecladista respondeu, sem levantar os olhos:

– Begin the Beguine? Eu só tocaria essa música para o Julio Iglesias! Te manda, cara! Aqui, canja só a de galinha.

– Pero… yo soy El próprio Julio Iglesias!

– Aqui no Gato Preto, se você é o Julio Iglesias eu sou o Frank Sinatra!

O próprio Julio Iglesias insistiu, o tecladista destratou o desconhecido, o cantante revidou, o da “porrinhola” deu um chega pra lá no gajo, a celebridade arrancou o microfone da mão do músico enfurecido, chegaram os seguranças e começou o entrevero!

Julio Iglesias voltou ao hotel dentro da viatura da PM, com o terno preto amarrotado e ainda repetindo o refrão:

– Carajos… me gustaria cantar Begin the Beguine, solamente una canja!

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“Assim ou assado”, o fato é que o Gato Preto é um ponto turístico de Curitiba. Instituição da boemia que merece ser preservada com todas as suas lendas e histórias. Muitas delas reais, como foi o caso dos quinze balaços que mataram dois travestis e deixaram feridos outros três. Segundo testemunhas da rua Ermelino de Leão, esquina com Cruz Machado, dois homens armados chegaram até a frente do Gato Preto numa moto Yamaha amarela e se identificaram como policiais. De posse de pistolas calibre 40 e 380, os marginais solicitaram que o segurança se virasse contra a parede. Invadiram o restaurante e começaram a atirar em direção ao grupo de travestis.

Além do criminoso caso de homofobia, o que causou espanto foi a informação de que um desembargador aposentado, que jantava no Gato Preto no momento do incidente, foi atingido por um tiro na perna.

– O que um desembargador estaria fazendo lá? – era só o que se perguntava na sauna do Clube Curitibano.

– Ora, o ilustríssimo estava tão somente apreciando a famosa canja de galinha do Gato Preto!