A cidade com brilho nos olhos

Diário íntimo em tom de confissão, o livro de memórias do antropólogo Gilberto Freyre – “De Menino a Homem”- começa na Revolução de 30, quando foi “convidado” a se exilar nos Estados Unidos, e nos diz da emoção de pegar pela primeira vez na mão um exemplar de “Casa Grande & Senzala”, chegando a contar de suas “experimentações homossexuais” na Europa e nos Estados Unidos. São revelações surpreendentes, diante da tão propalada vaidade do Mestre de Apipucos.

Vida íntima à parte – e as saborosas fofocas também -, interessante trecho do livro é aquele em que Gilberto Freyre conta de sua passagem pela Universidade de Stanford, quando teve a oportunidade de acompanhar as pesquisas do grupo de trabalho de Lewis M. Terman, o famoso psicólogo americano que em 1916 introduziu o conceito de Q.I (Quociente de Inteligência). Testes que logo se transformaram numa indústria milionária.

Dentre outras teorias abraçadas por Terman, numa delas estudou a influência do ambiente no desenvolvimento intelectual das pessoas. “Esse psicólogo – relata Gilberto Freyre – me referiu que uma das conclusões daquele grupo de pesquisadores fora a de que os indivíduos de gênio se fazem, quase sempre, notar por um brilho nos olhos, que, de ordinário, falta às pessoas comuns; e que, por esse brilho, eles se assemelham mais a adolescentes e a meninos do que a adultos comuns. O que não significava que fossem deficientes como adultos. Ao contrário: os indivíduos de gênio, ao contrário de vários mitos a seu respeito, raramente deixam de atingir – segundo Terman – maturidade tanto no desenvolvimento do físico como no da personalidade, em geral. O que eles conservam da meninice é a capacidade de continuarem a ver o mundo, depois de adultos, com os olhos de descobridores que não se cansassem da alegria de ver, de descobrir, de combinar, de maneiras novas e inesperadas, coisas convencionalmente ordenadas”.

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Curitiba tem agora no Bosque Gomm um símbolo de resistência pela qualidade de vida da cidade. Graças à persistência de um grupo de pessoas com brilho nos olhos, um resto de verde sobreviveu para contar à posteridade como era oxigenado o Batel. Com o aval do prefeito Gustavo Fruet, os preservacionistas do Gomm completam hoje uma agenda de festividades para este sábado, convocando a todos para fazer do movimento “Salvemos o Bosque da Casa Gomm” um exemplo muito bem sucedido de mobilização pelas mídias sociais, capaz de tirar o sono da burocracia em seu berço esplêndido.

“A questão agora é como manter o espírito, a vitalidade cívica que uniu a todos até agora” – conclama Luca Rischbieter, um dos resistentes, com o brilho nos olhos.