A carpideira do Jaguara

Não convidem para a mesma costela de fogo no chão duas das mais populares figuras dos Campos Gerais: Jaguara, o animador de velórios, e o polaco Stacho. É briga de ripa, na certa.

Tudo começou quando o Stacho veio para Curitiba fazer exame de DNA e saiu contando por aí:

– Ieu estando fazendo teste de DNA na capital. Resultado saindo mês que vem.

– Teste de DNA? Pra que isso?

Stacho responde a todos no seu mais legítimo dialeto “varsoviaco”, uma mistura do idioma de Varsóvia com o “polaquês” dos Campos Gerais, cuja maior característica é o gerúndio. Ou o “gerundês”. 

– Querendo ver se ieu não tendo algum jaguara na família!

A notícia se espalhou mais do que pinus nas coxilhas. Até cair no ouvido do próprio Jaguara, o animador de velórios, que reagiu indignado.

– Vou dar um pescoção nesse polaco despatriado!

As desavenças entre o Stacho e o Jaguara começaram por causa da morena chamada Rosário, uma carpideira profissional que faz dupla com o Jaguara em velórios.

Funciona assim: entre uma e outra piada do Jaguara, Rosário chora e assim, nesse revezamento, a noite vai passando mais depressa para os enlutados.

A parceria andava a mil maravilhas, não fosse o Stacho se apaixonar pela Rosário. O namorico dos dois era até permitido pelo Jaguara, mas a coisa desandou quando o Stacho pediu a morena em casamento.

– Se amanhã ela fica grávida, onde vou arrumar outra carpideira melhor que ela? – reclama o animador de velórios.

Rosário é uma carpideira de pura linhagem. Nascida em Foz do Iguaçu, a morenaça descende das vivandeiras da Guerra do Paraguai. Vivandeiras eram aquelas mulheres que seguiam na retaguarda do exército brasileiro, dormindo com os soldados vivos e chorando os soldados mortos. Além da tarefa no leito e nos funerais, as vivandeiras serviam na cozinha, cuidavam das crianças e tratavam dos feridos. Quando a tropa fazia prisioneiros, eram as vivandeiras que faziam o serviço macabro, matavam acorrentados. Mas antes da degola, as mulheres faziam um sorteio entre si para saber qual delas iria dormir com o inimigo para a última noite de sexo, para depois matá-lo a golpe de facão. Das vivandeiras vinham as carpideiras. Rosário era uma delas, com a capacidade de ficar chorando três dias e três noites, caso preciso.

Muito justamente o Jaguara é contra o casamento da Rosário com o Stacho.

– Essa carpideira é uma mina de ouro. Sem ela, o faturamento da empresa cai pela metade. No Brasil pelo menos o choro é livre e o “jus sperneandi” não paga imposto!

Stacho não quer nem saber dos negócios do animador de velórios:

– Ieu ficando com a Rosário e esse Jaguara ficando com a chorrrrradeirra! Se ieu não casando com ela, chorrrrremos todos!

Em “varsoviaco”, o verbo chorar se pronuncia com cinco erres.