A batalha anunciada

De tantos pesadelos nos últimos anos, é preciso dar certa razão ao desabafo do velho amigo, em meio a uma garrafa de vinho: “A esquerda que era o meu sonho de juventude, hoje é o meu pesadelo da velhice”. Sonhos são próprios da juventude, mas isto não exclui os mais velhos de algum esperançoso porvir. Afinal, a esperança é a última que morre.

Na noite de sábado, a possível batalha campal no Centro Cívico me tirou o sono – o pesadelo anunciado, melhor dizendo. O cenário do penoso sonho foi a alvorada do dia dos deputados votarem pelo confisco dos aposentados, com as colunas da Polícia Militar cercando a Assembleia Legislativa, em meio a uma bruma de se cortar com a faca.

Às dez da manhã, a vanguarda das tropas de segurança torna-se visível aos professores e demais funcionários públicos que a observam. O secretário Fernando Francisquini, na boleia de um camburão, está em meio à inspeção da armada quando três bombas o alertam para o avanço dos manifestantes em direção à Praça Nossa Senhora de Salete.

No Palácio Iguaçu, o governador Beto Richa observa os retardatários se movendo da Praça Tiradentes em direção ao Centro Cívico – colunas ensopadas de chuva deixando para trás a Catedral Metropolitana. Com a sua luneta, Richa estuda o avanço do inimigo. Surpreende-se ao notar que a tropa guarnecendo a Assembleia Legislativa é pequena e, sempre aparentando serenidade, preocupa-se com a possibilidade daquela marcha pela Avenida Cândido de Abreu ser apenas a vanguarda de uma força maior. Mesmo assim, o governador daria o primeiro tiro se não tivesse encontrado seus oficiais da Casa Militar fortemente indispostos a atacar os professores de seus netos.

Indeciso, ordena ao estrategista Francisquini que seus comandados – mais de mil policias militares envergonhados -, preparem as armas e esperem.

As fortificações de defesa da Assembleia Legislativa parecem impressionantes. A muralha de soldados é pontilhada pelas armas da cavalaria. Ao longo desta construção de defesa, ninhos de metralhadoras. A massa de manifestantes já aquartelados nos gramados em frente ao Palácio Iguaçu é claramente maior do que as forças governistas. E a julgar pela aparente movimentação fica claro que, olhando o povo indefeso e desarmado, nenhum ataque está por vir.

A situação na qual o governador Beto Richa se encontra é desconfortável. Muitos aliados a consideram desesperadora. Exércitos desacreditados normalmente não tentam avançar sobre linhas inimigas dez vezes mais motivadas. No entanto, é a própria nudez do governo que dita o ataque. Permanecer inerte diante da grave situação financeira do Estado é impossível; recuar também é igualmente impraticável. A única solução parece ser atacar.

Foi aí que eu acordei do pesadelo. A noite foi longa, veremos as próximas.

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Dante Mendonça está de férias. Vale a pena ler de novo suas crônicas.