Todo curitibano é um sujeito discreto. Até o mais “incomum” dos cidadãos é discreto. Essa talvez seja a chave para entender o porquê de os personagens de Curitiba serem mansos, pouco afeitos ao espalhafato. Do vampiro à santa popular, ninguém foge à regra. Nem mesmo o detetive curitibano. Quando o jornalista e escritor Edilson Pereira – precisa dizer que ele discreto? – criou Lindomar Stenzel não pensou em outra coisa que não fosse o um homem camuflado na multidão, mas nem por isso incapaz de solucionar os mistérios que lhe cabem da cidade. Esse ar insuspeito de Curitiba é o cenário perfeito para as histórias de crime, mistério e paixão escritas por Pereira. Seus novos livros, Uma mulher muito perigosa e O Português dos olhos verdes (Baskerville, 116 págs., e 245 págs.), lançados no formato “dois em um”, não criam contradição sobre a questão.

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Tanto o “patrício” misterioso quanto a mulher cheia de melindres são cidadãos acima de qualquer suspeita, que andam pelos mesmos lugares que qualquer um de nós. As duas histórias caem no colo de Stenzel que, apesar de sua discrição, não se faz de rogado. Pode parecer típico das histórias policiais, mas em Curitiba, uma espécie de Twin Peaks brasileira, nada é tão típico assim e merece ser vasculhado a fundo. Stenzel, a quem a inteligência e a sagacidade em nada deixam a desejar a Dale Cooper, é o encarregado de descobrir as peças de cada quebra-cabeça.

Em Uma mulher muito perigosa, Lindomar Stenzel recebe a visita de uma “dona de arrasar”: Maria Bevilacqua, que está à procura de sua irmã, desaparecida em Curitiba. Giovana fugiu com um arquivista chamado Henrique Vadjovski e Maria precisa encontrá-la. Aí entra o detetive curitibano. Já em O Português dos olhos verdes, Pereira usou uma experiência pessoal – ou quase – para contar a história de um homem, também muito discreto, que se revela um outro alguém. Edilson Pereira transpõe para Curitiba aquilo que Orson Welles narrou em O Estranho (1946).

“A história começou a partir de dois episódios: a compra de um livro de 1766 num sebo em Curitiba em outubro do ano passado. O livro é a versão para o alemão de “Metamorfoses” de Ovídio. Como chovia, eu fiquei conversando com a dona do sebo e ela me contou uma história curiosa. Ela comprou o acerto que pertenceu a um português, que morreu com 96 anos e cuja mulher queria se livrar daquilo rapidamente. A compra foi por um preço ínfimo. Ao chegar em casa e verificar com atenção o conteúdo de caixas de livros, máquinas fotografias, ela encontrou latas lacradas. Eu procurei responder a pergunta escrevendo o romance”, explica o escritor.

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É, mais ou menos, como Sylvia Plath escreveu – pouco antes de colocar sua cabeça dentro do forno – no poema “Daddy”: “toda mulher adora um fascista” 

Folhetim 

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Conhecido pelos folhetins publicados na Tribuna do Paraná e no Paraná Online, Edilson é um jornalista e escritor que se desdobra em muitos. Contos, poemas e peças teatrais também fazem parte do sua produção literária. A dramaturgia, por sinal,rendeu ao autor dois prêmios da Funarte. Os poemas foram publicados em antologias organizadas pelo governo do estado.

A jornada pelo folhetim começou em 2007, quando publicou na Tribuna A Dama do Largo da Ordem. Depois, outros quatro contos vieram. As séries “Tribun,a da Verdade” e “Crime da Paixão” se transformaram em coqueluche e demonstraram o interesse do público em uma literatura que muita gente já considerava fora de moda. Pouco a pouco, criou-se uma espécie de pulp fiction das araucárias.

“Depois, com o fim de O Estado do Paraná, passei a escrever histórias de crimes e paixão tiradas da vida real. As séries tiveram boa repercussão, a vida real alimentava a ficção. E foi assim quase naturalmente que o trabalho evoluiu nesta direção”, relembra Edilson.

Onde comprar

O livro duplo Uma mulher muito perigosa/O Português dos olhos verdes está à venda no Sebo Novo, por R$ 25. A loja fica na rua José Loureiro, 306, no Centro.

Leia a entrevista completa com Edilson Pereira.