Crítica: “Homens, mulheres e filhos”, de Chad Kultgen

1969 foi o ano em que o homem pisou na Lua e foi quando o escritor Philip Roth lançou o polêmico O Complexo de Portnoy. Considerado uma das obras mais importantes da literatura norte-americana, o livro foi um dos primeiros a tratar explicitamente do sexo e suas disfunções, além de abrir caminho para uma nova abordagem literária. Os filhos de Portnoy são inúmeros e, com o passar dos anos, a maioria já nem reconhece a paternidade. Homens Mulheres e Filhos (Record, 351 págs., R$ 35), de Chad Kultgen, é uma das crias mais recentes.

A dimensão dos relacionamentos ente pais e filhos e a busca pela libertação sexual é a chave do romance, celebrado como um dos mais impactantes sobre o tema em tempos de internet. A intrincada combinação de personagens e personalidades funciona como um chamariz superficial para o leitor comum, mas que permite uma visão mais aprofundada sobre o assunto – para olhares mais treinados.

Kultgen possui uma carreira muito mais proeminente no cinema que na literatura. Isso explica, talvez, a oralidade nos diálogos e capacidade criar subtramas que vão se resolvendo ao longo do romance. Ao contrário do que Roth faz com Alexander Portnoy, em Homens Mulheres e Filhos os pais também são culpados pelas proles desajustadas. E a única maneira de se criar um cenário como esse é rechear o livro com pais e mães à beira de um ataque de nervos, sedentos para fugir de um casamento monótono e monogâmico.

O espelho criado pelo autor é simples: uma transcrição do real. A tal ‘literatura de identificação’ que existe em Murakami também está aqui – mas com menor poder artístico. Os dilemas também são diferentes, mas ambos se equivalem no sentimento angustiante de inadequação.

Obsessões

Cada personagem carrega alguma espécie de obsessão. Tim Mooney larga o time de futebol americano para se dedicar as noites a jogar “World of warcraft” e encontra a explicação para a insignificância de sua vida – um resultado do divórcio dos pais – no vídeo “Pálido ponto azul”, de Carl Sagan. Enquanto muitos de seus amigos esperam ansiosos pela primeira experiência sexual, Tim vive em mundo paralelo sem perceber.

Na febre do “reality shows”, a mãe de Hannah, uma menina “mais desenvolvida que normal para a sua idade”, quer a todo custo que a filha se torne famosa e cria um site controverso para a garota. Dawn é um atriz fracassada e não quer o mesmo destino para a filha. A construção do romance se dá, justamente, nesses pequenos pontos de conflito social, moral e de geração.

Não existe certo ou errado para Kultgen, mas uma comédia de costumes – e uma valorização do jeito americano de ver o mundo.