Crítica: “A Zona de interesse”, de Martin Amis

As atrocidades do holocausto e as consequências – leia-se: sequelas – são temas recorrentes na literatura e no cinema, mas ninguém havia conseguido o que Martin Amis fez em A Zona de Interesse (Companhia das Letras, 392 págs., R$ 54,90): tratar Auschwitz com um toque de humor. As editoras que publicavam o autor ao redor do globo fecharam-lhe as portas recusando publicar o novo romance – que em alguns países da Europa saiu por casas menores.

O livro é a história do cotidiano de um campo de concentração sob os olhos de três personagens: Golo Thomsen (um oficial nazista), Paul Doll (comandante responsável por Auschwitz) e Szmul (prisioneiro que chefia um grupo de judeus encarregados da logística do holocausto, como o transporte dos mortos). A hierarquia e a instrução são pontos fundamentais para entender a compreensão de cada uma sobre o que está acontecendo.

O ponto de partida é o interesse de Thomsen por Hanna, a esposa de Doll. O oficial conta ao amigo Boris as investidas sobre a mulher do comandante e mostra aquilo que parece ser um plano perfeito de um Rodolfo Valentino do Terceiro Reich. Aos poucos, Paul vai deixando claro que é menos cego do que todos pensam. Enquanto isso, Szmul vai vivendo um dia por vez – “não foi hoje e não será amanhã”, repete.

Amis é hábil ao trata a ética e a moral dentro de um regime como o nazismo – que estraçalhou qualquer possibilidade de manter de pé os pilares de uma sociedade sã. A ironia carregada do romance é, sem dúvida, o grande atrativo e recobre de ouro um tema batido, trazendo a discussão sobre os anos da Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) novamente à tona.

O realismo dos personagens deixou alguns críticos irritados. Tanto Thomsen quanto Doll e Szmul são retratados como pessoas normais – sem exageros ou hipérboles que poderiam nascer da necessidade de imprimir um drama a mais ao holocausto. Os pensamentos deles são caseiros, preocupados com as questões diárias e também com o sexo.

Hitler

Talvez o mais incrível seja Martin Amis se debruçar sobre o nazismo e – ainda assim – não mencionar uma única vez o nome do führer alemão (somente no epílogo, quando o autor arremata as pesquisas bibliográficas que executou, Hitler é citado). Em 1942, ano em que romance é ambientado, a Alemanha ainda vivia uma época gloriosa no confronto, mas já caminhava para a decorada três anos adiante.

O escritor tentou se manter à margem da polêmica, focando seus esforços nas questões históricas e literárias, deixando de lado o frisson causado no meio editorial por um romance que figura entre os mais originais ao tratar de algo tão delicado.

Leia aqui um trecho do romance.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo