Entre todos os carros antigos que rodam por aí, o Fusca é o mais presente – em boas condições ou os de portas amarradas com corda. O Fusca deixou de ser fabricado há anos e agora quem pode comprar um, até por razões afetivas, o faz e se empenha em restaurá-lo. Como nos tempos em que saía zero quilômetro da fábrica, o Fusca continua o velho companheiro: não dá trabalho, dá pouco gasto e com aquele monte de aço, impõe respeito nos carros novos de materiais mais leves, justamente para reduzir o impacto sobre a pessoa em caso de eventual colisão. Bater num Fusca é arriscado. Ele não vai sentir cócegas.

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Em Curitiba há uma categoria de motoristas que amam carros antigos. O Fusca é um deles. Claro que não só de Fuscas vive a categoria romântica e saudosista. Há anos, a uma quadra do Parque São Lourenço, perto de onde era o Bavarium, havia aos domingos reunião dos donos de Opala. Os caras eram tão faceiros que pareciam namorados de misses. Opala também é carro que exerce fascínio sobre amantes de automóveis antigos. Estes carros são amados por seus donos porque eram fiéis, quase não davam problemas e eram pau para toda obra.

Agora quem quer show de bola tem mesmo que ir nas manhãs de domingo na Feira do Largo – começa no Largo da Ordem, se esparrama na direção do Largo do Rosário, e vai além do tradicional e luxuoso Palácio Garibaldi onde o ator Anthony Quinn gravou cenas do filme “Oriundi”. Aliás, o ator esteve no Solar do Rosário. É justamente entre estes dois pontos – o Palácio e o Solar, no começo da Rua Jaime Reis, que se reúnem os orgulhosos donos de carros antigos da cidade. No entanto, os aficionados por carros antigos têm uma associação com sede no Parque Barigui, onde há museu com modelos raros.

Na feira tem de tudo. Simca, Impala, Cadilac, Mercedes, velhos cupês Ford dos anos 30, Citroen dos anos 40, calhambeques dos anos 20, todo tipo de carro antigo. Os donos recebem o olhar reverente de curiosos e anônimos. O sujeito que reconstrói uma peça daquela investe boa grana. Muitos carros foram praticamente reconstruídos com peças semelhantes às originais. Entre eles, claro, encontra-se um e outro Fusca dos anos 50, nos trinques. Mas aqueles carros, quase todos, ao contrário do Fusca, são como madames: não saem toda hora e quando saem é para mostrar a formosura.

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O Fusca não. Ele e seu dono andam pela cidade normalmente, em tarefas cotidianas. Sem contar que para “restaurar” um Fusca, investe-se menos, até pela facilidade de encontrar peças. E pela facilidade de encontrar Fuscas em boas condições, pela sua utilidade, pelo baixo custo na manutenção e restauração, os donos de velhos Fuscas são mais numerosos e formam uma espécie de subclasse de colecionadores de carros antigos. Aqueles que gostam destes carros, mas usam-nos como fossem novos. E aí o Fusca entra como luva.  

E, mais uma vez, agora na condição de objeto de colecionador, o Fusca se mostra produto popular, econômico e eficiente, como sempre foi. Talvez no dia em que os carros desaparecerem – esta parece uma tendência real em virtude da impossibilidade dentro de alguns anos de se colocar nas ruas todos os carros produzidos todos os anos – certamente ainda vamos encontrar um velho Fusca, em alguma garagem. Pronto para qualquer emergência. Porque o tempo passa e nenhum modelo tem tanta história e ofusca o velho Fusca. Um dos maiores êxitos da indústria automobilística. O carro surgiu no começo do século passado para ser uma solução e acabou virando gerador de um dos maiores problemas atuais – o excesso de veículos nas ruas. Mas o Fusca não tem nada com isso. Sempre vai haver na garagem, nas ruas ou no coração das pessoas um espaço para ele.

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