Tem gente que acha que acontecem histórias estranhas hoje em dia. A realidade é que sempre aconteceram coisas estranhas não apenas nas ruas de Curitiba, como também de outras cidades. Cada história estranha tem a sua época e a sua cidade. Esta que eu vou contar hoje é uma história antiga. Dos anos 30, de um tempo em que o bonde ia para os arrabaldes do Portão e para os confins do Bacacheri. E quem perdia o bonde, chegava atrasado. A cidade era pacata e um bairro como o Alto da Glória era cheio de grandes terrenos baldios, alguns tão grandes que pareciam chácaras – e nestes lugares criavam-se animais.

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Num destes terrenos morava o Sr. João Bozza, que trabalhava de operário na Companha Força e Luz do Paraná. O Sr. Bozza morava com a mulher e as filhas numa casa modesta de madeira, com quintal grande. Quando nasceu o filho mais novo do Sr. Bozza, ele pensou na alimentação da criança e pensando em economizar o dinheiro do leite e levando em conta o amplo terreno que tinha no Alto da Glória, ele pegou as suas economias e comprou uma vaca. O objetivo era ter um animal saudável para produzir leite para a criança. A família achou a decisão acertada.

A vaca ganhou o nome de Bolinha. Era da raça Gersey. Era um belo animal malhado de preto e amarelo. No entanto, a vaca veio com um bezerro que ao chegar à nova propriedade, contava com sete meses. O bezerro precisava mamar e o filho do Sr. Bozza também precisava mamar. O Sr. Bozza era um homem sábio e como a vaca produzia leite em profusão ele decidiu que o leite de Bolinha seria destinado em parte para o bezerro e em parte para a criança. A sentença salomônica não funcionou porque a vaca começou a falhar na produção de leite: um dia dava muito leite e no outro não produzia nada. O Sr. Bozza trabalhava em empresa de energia, mas entendia alguma coisa de animais. Ele achou que aquilo não fazia o menor sentido.

O homem confidenciou para a mulher que alguém estava roubando o leite da Bolinha. A mulher contemporizou, temendo que o marido arrumasse encrenca com os vizinhos. Afinal, se o leite estava sumindo do quintal, os primeiros suspeitos seriam os vizinhos. Mas Sr. Bozza insistiu: “Está acontecendo algo estranho neste quintal.” A mulher pediu para ele se acalmar. O Sr. Bozza disse que ia ficar calmo, mas prometeu a si mesmo investigar o sumiço do leite da vaca. Ele ficava atento aos vizinhos, achando que algum piá pulava a cerca para furtar leite de sua vaca. No entanto, numa manhã, antes de ordenhar a vaca, ele soltou o animal pelo quintal para ver o que acontecia. E foi então que ele desvendou o mistério que rondava a sua casa.

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A vaca Bolinha se dirigiu faceiramente para um canto do terreno, bem aos fundos e mugiu, mugiu apaixonadamente. Alguns minutos depois apareceu um porco de cerca de oito meses, escandalosamente gordo e belo. Ele passou por baixo da cerca e se aproximou de Bolinha. E com naturalidade ele pôs-se a mamar nas tetas da vaca. O Sr. Bozza ficou boquiaberto com a traição da vaca. Bolinha negava leite para sua cria e para o filho de seu dono, mas amamentava um porco gordo, estranho e safado. “Porco infame”, murmurou o Sr. Bozza. E ficou assim esclarecido o caso do sumiço do leite da vaca no Alto da Glória.

O porco de pelo negro e luzidio conseguiu seduzir a vaca do Sr. Bozza para roubar-lhe o leite. O Sr. Bozza ficou com vergonha de levantar suspeitas dos vizinhos. Mas no dia seguinte ele teve que atender o berro da vizinha assustada: “Sr. Bozza, corra, venha socorrer a vaca, que tem um porco comendo a teta dela!” Ele correu para espantar o porco enquanto respondia: “Ele não está comendo a teta. Ele está roubando o leite. Este porco safado!”. Foi um sufoco se livrar daquele porco. E quando o Sr. Bozza se livrou do porco, a vaca ficou deprimida. Este caso aconteceu na primeira quinzena de outubro de 1937, no Alto da Glória, e ficou conhecido como o caso do roubo do leite por um porco safado.

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