Há sempre um bar de portas abertas

O estabelecimento comercial mais popular e numeroso no Brasil é o bar – é encontrado em quase todas as ruas, com exceção das exclusivamente residenciais e em quase todos os bairros. E ainda assim é capaz de algum esperto botar um bar clandestino na garagem de sua casa – coisa que já vi. Eu não tenho números absolutos para fazer a afirmação, é algo absolutamente empírico, mas uma passada de olhos pelas ruas, mesmo a bordo de um busão, confirma a premissa. O bar é o estabelecimento de sociabilidade que restou – e não só no Brasil. O resto foi pra cucuia. Naturalmente que existem bares e bares, os chiques, os mais ou menos e os que parecem um pardieiro. E para cada um deles tem quem goste.

O curioso do bar é que não existe fórmula para o sucesso. Também com base no empirismo diria que o segredo do sucesso de um bar está no carisma do dono, na capacidade de ele funcionar como catalizador da clientela. Cansei de ver iniciativas fracassadas de fundar bar bem organizado, bonito, com belo estoque e boa localização; e de bares sujos, encardidos, com clientela da pesada se transformar em verdadeiros cases de sucesso empresarial. E como cada dono de bar é diferente de outro, não se pode dizer que há um perfil psicológico de dono de bar. Eu conheci um japonês que espantava a clientela e quanto mais ele era ranzina, mais popular o bar ficava.

Foi em Londrina, na Rua Piauí, o Bar do Lema. Depois das 21 horas, o dono ficava maluco, queria ir embora. Os frequentadores não se perturbavam e se limitavam a dizer: “Manda mais uma gelada e não enche, Jorge!”. O japonês servia e ficava na porta esperando para fechar o estabelecimento. E ficava lá até meia-noite, porque o pessoal não arredava o pé. O bar era um sucesso com suas linguiças que pareciam fritadas em graxa de motor de Fenemê. Também em Londrina presenciei um projeto de bar que se evaporou. Um amigo jornalista, o Jerê, pegou grana do acerto com a TV Coroados e montou um bar no Jardim Leonor. Comprou estoque e depois resolveu cuidar da parte física. Quando terminou a parte física, os amigos tinham consumido o estoque. Ele fechou o bar por falta de estoque. Foi, na realidade, um bar privê.

Jornalista tem mania de abrir bar. Conheço poucos de sucesso na empreita. O mais bem sucedido foi Jonny Basso, ex-editor de Economia de O Estadinho. Ele abriu o Café Curaçao em Curitiba. A coisa pegou. E verificou que no fim do ano o movimento diminuía em Curitiba e então levou o bar para Guaratuba, para onde migrava boa parte da clientela. E assim criou a principal casa de espetáculos do litoral paranaense – não conheço outra com tamanha atividade. Em dias de espetáculo a região do Curaçao parece ponto de romaria. Outro jornalista que entrou no ramo há algum tempo é o Edmundo Inagaki, que abriu estabelecimento na Mateus Leme, ponto de encontro de amigos e dos amigos dos amigos. Além de outras pessoas, claro.

Há algumas semanas foi a vez de João Alceu, também ex-editor de Economia de O Estadinho, abrir o Café Casablanca, cafeteria no Centro Cívico. Boa sorte pra ele. O nome é sugestivo. Lembra a cidade de um dos bares mais famosos do mundo: o Rick Café, de Richard Blaine, do filme Casablanca, clássico do cinema – e um clássico de filme de bar. Aliás, filme baseado no livro “Todo mundo vai ao Café do Rick”. O sujeito abre um bar no fim do mundo para esquecer uma mulher que o abandonou em Paris e um belo dia ela aparece faceira, mais linda e gostosa que uma manga madura. Aparece com o marido. Que não sabe de nada. Todo mundo bebeu, todo mundo amou e todo mundo sofreu. E o nazista morre no fim.

Quando Rick vê a dona, enche a cara e resmunga: “De todos os bares, de todas as cidades do mundo e ela entra justamente no meu”. Mas o bar é isso. O segundo lar de muita gente, ponto de encontros, de surpresas, algumas agradáveis, outras nem tanto. E é claro que nos bares sempre se encontra um bêbado ou quase fazendo discurso engraçado. É divertido. Quem vai ao bar não precisa de analista: primeiro porque não sobra tempo, depois porque não sobra dinheiro. E no final a vida segue do mesmo jeito, neurótica como sempre. O bar, para muita gente, é o amigo de portas abertas. Talvez por isso existam tantos bares espalhados por todos o,s cantos da cidade. De todas as cidades do mundo.