Dura Lex Sed Lex, no cabelo só Gumex

A Justiça brasileira é cara. Juízes, desembargadores e ministros ganham bem, principalmente levando-se em conta a relação salarial entre categorias profissionais no Brasil e em países desenvolvidos como Suécia, Estados Unidos, e outros. Nossa Justiça cara, em vez de funcionar, numa parte preocupante dos casos é uma grande lambança. Resumindo: é prepotente, soberba e incompetente. Lenta, injusta e burocrata: não funciona a contento. Basta ver o número de presos que já cumpriram penas e estão presos e a multidão dos que deviam estar presos e estão soltos. Resumindo mais uma vez: é uma esbórnia. Isto seria uma humilhação para qualquer sistema jurídico. Menos aqui. O Brasil é a casa da mãe Joana.

Agora mesmo mais um capítulo da novela que só falta ter beijo na boca no final: postergado mais uma vez o caso Fernando Carli. Uma vergonha! Isto para saber se o cara vai ser julgado por júri popular ou impopular. E o atropelamento irresponsável que vitimou dois inocentes vai fazer cinco anos. Mais um pouco prescreve. Eu leio matéria na edição de sexta-feira da Tribuna sobre a Vila Araguaia, no Capão da Imbuia. Um caso absurdo em que a Justiça em vez de trabalhar na solução dos problemas sociais, fez justamente o contrário: ela os agravou. Naturalmente, favorecendo na ponta os que têm mais dinheiro. E penalizando a parte honesta da população pobre que, além de lutar contra o desemprego, violência e outras mazelas, vê os seus míseros caraminguás migrarem para os bolsos poderosos.

A Justiça brasileira ganhou fama de prostituta: quem tem dinheiro deita e rola e quem não tem se ferra. O caso da Vila Araguaia é o seguinte: há mais de 20 anos a Justiça deu ganho de causa para um sujeito que reivindicou uma área que era um brejo. A Justiça deu ganho de causa em primeira instância. E como tem segunda e terceira instâncias para o caso transitar, ela deveria ter colocado cláusula de impedimento para o sujeito não sair vendendo ou comercializando a área até julgamento final e definitivo. Mas o que ocorreu foi que o sujeito, com a decisão na mão, terraplanou, loteou e vendeu os terrenos. E naturalmente um monte de gente comprou.

Aquilo valorizou e um tempo depois apareceu um sujeito alegando que era dono e que queria de volta sua terra. Ele entrou na Justiça reivindicando seus direitos. A Justiça disse que o cara era o dono e que o outro não era. A própria Justiça, como uma bêbada, fez a maior lambança. Nesta altura do campeonato, as pessoas que compraram os terrenos na boa fé construíram casas, a prefeitura asfaltou, o bairro é hoje um bairro normal, com apenas um detalhe: virou briga na Justiça entre o antigo dono e o que a própria Justiça garantiu ter direito. E quem se ferra e é ameaçado é o pobre que comprou, construiu casas com dinheiro suado. Agora tem gente ameaçada de despejo. O estresse é tão grande que dois sujeitos já morreram do coração.

O presidente da associação, Anatólio Novaes, trava luta de Davi contra Golias. Que é a luta do pobre contra os poderosos para os quais a Justiça, na prática, trabalha. Os moradores estão desamparados e o próprio Anatólio de tanto estresse anda com um marca-passo no peito e voz cansada de tanto lutar. E mais: meteu a boca no trombone e foi processado por ex-prefeito que prometeu resolver o problema e este ex-prefeito não resolveu nada e ainda perdeu na Justiça ação que moveu contra o líder dos moradores. Desta vez a Justiça funcionou. Mas só de vez em quando. Porque na maior parte das vezes ela ronca e não apresenta solução porque, em muitos casos, principalmente este, foi ela quem criou o problema. Lembrando o imortal Ary Barroso: “Dura Lex Sed Lex, no cabelo só Gumex”. Nossa Justiça é Justiça de fachada. Como aqueles almofadinhas antigos que passavam brilhantina no cabelo, mas não queriam trabalhar – e muito menos saber de pobre. É o retrato da Justiça brasileira. Que de primeiro mundo tem apenas a remuneração de seus magistrados.