A comovente farsa do estelionatário Mon Amour

Eu conheci Mon Amour – também denominado Michel Schwartz – em junho de 2007 no restaurante Casa Rosada em Guaratuba. Ele me pareceu simpático. Ele me disse que era judeu e me relatou alguns rituais judaicos dos quais eu nunca ouvi falar. Na realidade ele me deu a impressão de fazer uma salada de expressões que me pareceram meio confusas, mas como ele era judeu e eu não, achei que ele devia ter razão e não eu – ou seja, que ele sabia do que estava falando. Ele disse: “Morei em Paris dez anos. Paris é um encanto, é a cidade que toda pessoa sensível devia conhecer”. Eu concordei. E no íntimo o invejei. Eu sou um cara sensível que gostaria de conhecer Paris.

E sempre quando se fala em Paris eu me lembro da cidade nos anos 20, de Hemingway, Gertrude Stein, Pablo Picasso, Sergei Diaghilev e outros. Não tem como não sentir saudades ainda que não se tenha vivido aqueles dias e aquelas noites. Como este tempo não volta a cidade ainda está lá para quem gosta da Paris daqueles anos matar a saudade. Mon Amour, que tem este nome porque chama todo mundo, homens e mulheres, de Mon Amour, disse que era íntimo de judeus parisienses. E eles o introduziram nos círculos intelectuais e artísticos. Eu quis saber como Mon Amour vivia e ele confessou de forma afetada: “Mamãe tem propriedades. Quem cuidava delas era meu irmão mais velho. Mas ele morreu e por isto eu tive que voltar para o Brasil para administrar os bens de mamãe”.

Pelo que ele me disse, a mãe era uma matrona judaica milionária que teve três filhos todos bem sucedidos, embora o mais novo – Mon Amour -, fosse uma espécie de dândi. A conversa naquela noite no Casa Rosada foi agradável e depois daquela noite eu não encontrei mais Mon Amour. Até uma manhã destas, exatamente na frente das Lojas Americanas, no centro da cidade. Eu o encontrei na Rua Ébano Pereira e ele me convidou para tomar café num daqueles estabelecimentos que ele achava charmosos, “porque me lembra de Paris”. O nome era Café Colonial. Fui e ele me perguntou o que eu andei fazendo. Disse que tinha lançado alguns livros e ele disse que ficou sabendo por que leu nos jornais e me desejou todo sucesso do mundo. Gostei de ouvir aquilo.

Eu perguntei o que ele andou fazendo este tempo e ele disse que fez muita coisa. Mas nas últimas semanas retornara de Punta Del Este, onde esteve com um amigo milionário, americano bonito e que passou com ele quinze dias maravilhosos. Não achei nada extraordinário, porque Mon Amour era homossexual e estes encontros repentinos – assim como as rupturas repentinas – são até normais. No entanto, ao contrário da vez anterior, não achei Mon Amour tão confiante. Pensei que eu poderia estar equivocado. Quando cheguei em casa, um amigo de Guaratuba me ligou e então eu lhe contei que tinha conversado com Mon Amour num café do centro da cidade e narrei as coisas que ele me disse.

Este amigo falou: “Mon Amour é o maior mentiroso do mundo”. Fiquei surpreso. Ele continuou: “Ele morava com um amigo meu, os dois quebraram o pau e este amigo contou a verdade para todo mundo”. Mon Amour ameaçou o sujeito com uma “praga judaica”. Eu nem sabia que existia isto. Foi aí que a ascendência foi desmascarada: “O outro disse que ele podia jogar quantas pragas judaicas ele quisesse porque ele não era judeu e o nome dele era Jacinto Cavalcante”. Eu perguntei: “E a mãe dele? A milionária?”. Este amigo respondeu: “A milionária anda de bicicleta e é enfermeira. A coitada torra as economias para tirar os filhos da cadeia”. Aquilo foi ainda mais surpreendente.

“E a temporada em Punta Del Leste?”, perguntei. O outro disse: “Temporada na cadeia, que ele pegou porque passou cheque sem fundo. Sorte dele que não foi para pagar traficante, se não estava ferrado”. Por fim eu quis saber por que ele fazia isto: “Por que ele acha chique ser um milionário judeu”. Bom, claro que é chique ser milionário. Mas eu acho que Mon Amour considerou que se ele dissesse que era judeu ninguém ia fazer perguntas. Na cabeça dele todo rico era judeu. Ou vice-versa.