NOTA: 4.5/5
O que temos aqui é uma reinterpretação interessantíssima de um dos ícones mais duradouros do cinema de horror. Eggers retoma a história do Conde Orlock, baseada no roteiro do Nosferatu de 1922, incorpora elementos do romance original Drácula, de Bram Stoker, adicionando seu próprio toque de autenticidade e terror visceral.
A escolha de Eggers é clara: ao invés de revisitar a estranheza ou a melancolia que marcaram as duas versões anteriores, ele opta pelo horror puro, que rejeita qualquer traço de esperança ou redenção.
Como (quase) todos sabem, o original de 1922, dirigido por F.W. Murnau, foi uma adaptação não autorizada de Drácula, o que obrigou a mudança de nomes e detalhes da trama. Ainda assim, seu impacto é inegável: o visual distorcido e a atmosfera de estranheza deram ao gênero do horror uma linguagem visual que reverbera até hoje.
Em 1979, Werner Herzog trouxe uma releitura melancólica e existencialista da história, transformando o vampirismo em uma metáfora para a solidão e o peso da imortalidade. Eggers, no entanto, segue um caminho diferente: ele constrói um universo em que o vampiro não é apenas uma figura trágica, mas um símbolo absoluto de destruição e desespero.
A estética do filme é característica de Eggers: uma fotografia escura e dessaturada que transporta o espectador para um pesadelo sem fim. Como em seus trabalhos anteriores, ele utiliza elementos do folclore local para dar à narrativa uma textura autêntica e profundamente inquietante.
A praga que acompanha o Conde Orlock à pequena vila alemã é apresentada com um realismo brutal, transformando o horror gótico em uma tragédia quase palpável. Não há glamour ou mistério no vampirismo aqui; é pura violência e subversão.
A performance de Bill Skarsgård como Orlock é um dos destaques absolutos. Sua presença é animalesca, sensação reforçada por sua voz gutural e respiração doentia. Eggers rejeita a iconografia clássica do vampiro para criar algo único, ainda que possa desagradar os mais puristas. É uma criatura faminta e implacável, mais próxima de um predador ancestral do que de um aristocrata amaldiçoado.
A diferença de tom entre o Drácula de Coppola, e este Nosferatu é marcante. Enquanto Coppola optou por uma direção maravilhosamente extravagante, repleta de excessos visuais e uma estética que mistura o romantismo gótico com o espetáculo teatral, Eggers segue um caminho mais sóbrio e contido, ainda que recheado de momentos absolutamente aterradores.
O romantismo e a sedução do vampirismo, tão evidentes na versão de Coppola, dão lugar a uma abordagem brutal e despojada, que expõe a essência predatória e animalesca do Conde Orlock. Seu desejo pela protagonista não é amor; é pura obsessão e possessão, desprovido de qualquer humanidade.
Lily-Rose Depp surpreende como a jovem desejada pelo vampiro, trazendo à personagem uma profundidade inesperada. Sua trajetória é marcada por uma dose dolorida de loucura, sacrifício e resignação, além de uma tristeza imensa por conta da maldição que a persegue desde o nascimento. Nicolas Hoult, por sua vez, faz o que pode como o marido cuja ambição o leva à desgraça, num papel historicamente limitado pelas convenções do gênero.
Já Willem Dafoe, mesmo com pouco tempo de tela, entrega uma performance inesquecível como o personagem que, na prática, assume o papel de Van Helsing nesta nova adaptação. Seu personagem, um estudioso que conhece os horrores por trás do mito de Orlock, transmite uma autoridade inquietante, como alguém que carrega o peso de verdades inomináveis. Eggers aproveita ao máximo o talento de Dafoe, que domina seus diálogos com uma mistura perfeita de determinação e vulnerabilidade, tornando-se um dos elementos mais memoráveis do filme.
O resultado é um filme que, mais do que revisitar a mitologia do vampiro, mergulha nas profundezas da crueldade e da desesperança. A presença de Orlock é menos marcada pelo indivíduo e mais um presságio de um mal eterno, algo que já existia antes dos personagens e que continuará depois deles.
A ausência de redenção é uma escolha perfeitamente alinhada à visão implacável de Eggers. O plano final do filme, ao mesmo tempo belo e aterrador, encerra essa obra magistral com uma nota inesquecível. Nosferatu já é uma das experiências cinematográficas mais perturbadoras do ano, confirmando Eggers como um mestre do horror moderno.
Nosferatu (2024)
🎬 Diretor: Robert Eggers
🎭 Elenco: Bill Skarsgård, Lily-Rose Depp, Nicolas Hoult, Willem Dafoe
📅 Estreia: 2/1/2025
⏳ Duração: 132 minutos
Sinopse: Uma releitura sombria e visceral do clássico do cinema de horror. Eggers mergulha nas profundezas da desesperança, trazendo uma história de terror autêntica e impactante, marcada pela ausência de redenção.