As armadilhas de M. Night Shyamalan

Hoje vamos mergulhar na fascinante filmografia de M. Night Shyamalan, um diretor que, a partir do fim dos anos 1990, se tornou um ícone do suspense e do terror psicológico, amado por uns, odiado por outros.

No aguardo da estreia de seu mais novo filme, Armadilha, este é o momento para refletir sobre o impacto que o diretor teve no cinema ao longo dos anos.

Após uma estreia tímida na comédia Olhos Abertos, o diretor explodiu no cenário mundial com O Sexto Sentido (1999), uma obra-prima que não só assustou, mas também emocionou o público com seu inesquecível plot twist.

O sucesso continuou com o magnífico Corpo Fechado (2000), que desafiou as convenções dos filmes de super-heróis, e Sinais (2002), que trouxe uma abordagem única e inquietante sobre invasões alienígenas. A marca registrada de Shyamalan, a reviravolta no enredo, se tornou quase obrigatória em seus filmes, uma armadilha da qual ele até hoje não conseguiu mais escapar.

A lua de mel com o público foi parcialmente interrompida com A Vila (2004), um ótimo filme vendido de forma errada e que dividiu opiniões. Os sequentes fracassos críticos e comerciais de A Dama na Água (2006) e Fim dos Tempos (2008) o levaram a aceitar conduzir obras completamente fora de seu estilo, quase decretando sua aposentadoria compulsória.

Mas eis que Shyamalan mostrou resiliência e criatividade, retornando com força em A Visita (2015), um thriller de baixo orçamento que surpreendeu a todos com sua eficácia no manjado estilo found footage. Logo depois, veio Fragmentado (2016), que não só solidificou seu retorno, como ainda fez uma conexão inesperada com o universo de Corpo Fechado, culminando em Vidro (2019).

Neste artigo, vamos analisar a filmografia completa de M. Night Shyamalan – a partir de O Sexto Sentido -, do melhor ao pior, explorando cada reviravolta, cada susto e cada momento que nos fez prender a respiração. Preparem-se para uma jornada cinematográfica repleta de surpresas e mistérios – e spoilers, claro!


01 | CORPO FECHADO (2000)

Não apenas o melhor filme de Shyamalan, mas um dos melhores filmes de super-heróis do cinema. Corpo Fechado trabalha com os clichês dos quadrinhos de forma sutil e elegante, numa trama de tom melancólico sobre dois homens que buscam compreender o seu lugar neste mundo. Entre o protagonista relutante vivido por Bruce Willis e o antagonista de roupas púrpuras e objetivos tão claros quanto distorcidos de Samuel L. Jackson, temos aqui uma das melhores releituras do gênero, que equilibra com genialidade os elementos fantásticos da trama com um olhar repleto de sensibilidade sobre o que estabelece o que é ser um herói.

02 | O SEXTO SENTIDO (1999)

Mesmo que não tivesse o famoso plot twist que lhe deu fama mundial, O Sexto Sentido já seria um belíssimo filme de suspense e terror, graças à direção precisa de Shyamalan, que usa e abusa dos cânones do gênero e à interpretação antológica do pequena Haley Joel Osment. Mas aí o diretor, que engana o público da forma mais inteligente possível, joga uma revelação que faz com que você reescreva toda a sua percepção sobre a obra, criando uma das experiências mais impactantes da história.

03 | SINAIS (2001)

Shyamalan usa do batido gênero da invasão alienígena para criar uma fábula tocante sobre o luto, sobre escolhas, sobre fé e, principalmente, sobre coincidências, tema que foi brilhantemente burilado por Jordan Peele em seu Nope. Trabalhando em um cenário quase restrito de uma casarão em meio a um milharal, o diretor cria uma obra intimista com diversos momentos assustadores e, mesmo com aquela conclusão que até hoje incomoda os mais chatos, com uma das melhores catarses da carreira do diretor.

04 | A VILA

Poderia funcionar como um episódio de Além da Imaginação. Vendido erroneamente como um filme de monstro, A Vila funciona muito mais como um registro do efeito da violência numa comunidade isolada em pleno século 19, comandada por um grupo de anciãos e que eventualmente é ameaçada por sinistras criaturas, estabelecendo o medo como forma clara de controle. A revelação de que tudo se passa nos dias de hoje não chega a ser tão impactante quanto poderia, mas a discussão social aqui é plenamente justificável.

05 | FRAGMENTADO (2016)

O retorno oficial de Shyamalan não poderia ter sido melhor. A trama sobre o homem com múltiplas personalidades foi esquisita e inquietante o suficiente para atrair o grande público. A atuação inspirada de James McAvoy, a presença sempre curiosa de Anya Taylor-Joy e as sequências de puro horror com a chegada da Besta compensam plenamente algumas shyamalanices que se tornaram usual em sua filmografia. E como surpresa final, uma inesperada conexão com o universo de Corpo Fechado.

06 | VIDRO (2019)

Muitos se incomodaram com a forma como Shyamalan finalizou essa inusitada trilogia. Sim, há diversas situações que requerem uma força de vontade imensa por parte do espectador, mas Shyamalan entrega aqui um filme audacioso, que quebra diversos clichês do gênero, e que assume sem medo algumas escolhas corajosas, como matar o herói David Dunn em uma mera poça de água. O heroísmo puro, a estratégia calculista e a brutalidade animal se encontram no lugar mais óbvio para tudo isso: um hospício. Não tem como ser melhor!

 07 | BATEM À PORTA (2023)

Um casal e sua filhinha pequena são aterrorizados por um grupo que acredita que o destino do mundo está em suas mãos. Abraçando a fantasia apocalíptica, Shyamalan repete aqui uma estrutura que ele conhece muito bem: eventos mundiais e seus reflexos no microcosmo retratado em mais uma casa isolada no bosque. Com uma atuação impressionante de David Bautista, Batem à Porta é um filme que discute a intolerância e o fanatismo com total propriedade

08 | A VISITA (2015)

Ok, é preciso aceitar a premissa de que dois jovens criados na Internet vão visitar os avós sem sequer saber como eles se parecem. Uma brincadeira com o estilo found footage, A Visita é um exercício básico e eficiente de suspense, com algumas imagens bem perturbadoras e uma conclusão tensa ao extremo. Um filme pequeno de um grande diretor.

09 | TEMPO (2021)

A premissa é das mais enigmáticas: uma praia na qual as pessoas passam a envelhecer de forma muito rápida, cerca de 10 anos por hora. Uma parábola sobre a perenidade humana, o filme só não se sai melhor por conta de diálogos autoexplicativos meio vergonhosos e pela necessidade quase patológica do diretor em jogar uma luz de racionalidade em eventos fantásticos que, por si só, nem deveriam ser explicados. Mas é fotografado de forma magistral, com alguns dos planos mais impactantes da sua carreira.

10 | A DAMA NA ÁGUA (2006)

Um dos filmes mais estranhos da carreira do diretor, o que temos aqui é uma obra repleta de analogias e metáforas que poucos conseguiram captar plenamente. No mais, o que fica é uma história caótica sobre uma jovem que surge da piscina de um condomínio e que parece ter um vínculo com um livro fantástico e suas criaturas. Ou algo assim. A trama confusa, o ritmo irregular e o excesso de simbolismos deixam tudo meio incompreensível, ainda que o conceito seja dos mais interessantes.

11 | O ÚLTIMO MESTRE DO AR (2010)

Um versão live action do anime Avatar, é um filme visualmente interessante, mas não é a seara de Shyamalan. O diretor parece constrangido em construir suas sequências de ação e soa incapaz de gerar qualquer simpatia para o seu elenco. Não chega nem a ser ruim, é só insípido mesmo

12 | DEPOIS DA TERRA (2013)

Nada funciona aqui. Temos o filho menos talentoso do Will Smith fingindo que atua, temos Will Smith deitado em 90% do filme mandando mensagens de autoajuda para o seu pequeno e aquela trama monótona do jovem que precisa encontrar a sua coragem enquanto enfrenta criaturas monstruosas em um planeta inóspito. É isso.

13 | FIM DOS TEMPOS (2008)

Este aqui tem um dos melhores começos da carreira do diretor, mostrando uma onda mundial de suicídios que ninguém consegue explicar [a sequencia dos trabalhadores se jogando do alto dos prédios até hoje impressiona]. É uma pena, portanto, que a coisa degringole num nível inacreditável, com momentos hilários e constrangedores como aquele em que um grupo precisa fugir do vento e, claro, a cena em que Mark Wahlberg conversa com uma planta. Não dá para defender.


E você, qual o seu filme preferido do Shyamalan? Conta aqui pra gente!

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