Sempre existirão aqueles autores em que a fama os precede. Antes mesmo virar a folha de rosto de “Caim” (2009), já tem gente achando que Saramago é difícil – sem nem mesmo ter lido uma linha sequer do português. Com o angolano Valter Hugo Mãe não é diferente. Pouco conhecido no Brasil até ganhar o Portugual Telecom por conta de “Máquina de fazer espanhóis”, o escritor se transformou em uma das sensações do universo cult da literatura.
Prestes a lançar por aqui “A Desumanização”, Mãe – que já tem no catálogo brasileiro “O Filho de mil homens”, “O Apocalipse dos trabalhadores”, “Nosso reino”, “O Remorso de Baltazar Serapião”, além do romance premiado já citado – tem recebido cada vez mais destaque entre os escritores contemporâneos, principalmente, depois que Saramago o chamou de “tsunami literária” – o que é a mais pura verdade.
O melhor de tudo, é que o angolano convence. Não que ele tente vender ideologias, ideias, conceitos e outras bugigangas intelectuais, ao contrário, na simplicidade de contar uma história o autor coloca em xeque as nossas verdades e, digo mais, os melhores argumentos desse rapaz são, justamente, as suas parábolas, os diálogolos por ele criados, os personagens que forjou sem a necessidade de fórceps, pois é tudo tão natural que eles parecem viver como nossos vizinhos. Como nós mesmos.
Vejo um paralelo entre a escrita de Mãe e o arsenal fílmico de Lars von Trier. Ambos usam a melancolia e os desastres cotianos para criar uma obra angustiante, mas que não sufoca, apenas liberta daquele eufemismo que é a felicidade. É possível que um conheça a obra do outro, entrementes, não creio que a relação seja proposital, sendo somente – e tão somente – uma daquelas coincidências que só são possíveis graças à arte.