Usar o trajeto de casa para o trabalho para colocar a leitura em dia é algo comum na vida de quem depende do transporte coletivo. Mas você já pensou em escrever um livro enquanto espera chegar o seu ponto? Foi isso que fez o jornalista Jessé Andarilho dentro dos trens do Rio de Janeiro. Fiel, lançado recentemente pela editora Objetiva, é o fruto desse novo processo criativo.
Apesar de a ideia de escrever um livro não tenha surgido dentro dos vagões, o autor só tinha aquele momento para colocar em prática os seus pensamentos literários. “Decidi escrever no bloco de notas do meu celular, para aproveitar o tempo que perdia nos trens de casa para o trabalho e do trabalho pra casa”, contou Andarilho. Depois, o texto era passado para um caderno e, posteriormente, ganhava as páginas digitais do computador.
A fluidez da história também estava na cabeça de Jessé. Para ele, não bastava ser boa, a história precisava cativar o público. “Lia cada paragrafo em voz alta. Se alguma palavra travasse, eu mudava pra ficar mais dinâmico’, revelou.
Descoberta
O amor de Andarilho pelos livros não foi repentino. Nascido e criado em uma comunidade pobre da capital fluminense, ele se encantou com a literatura e percebeu que também poderia contribuir para esse universo. Por isso, a importância de criar um texto leve, mas que contivesse uma mensagem positiva.
Divulgação |
---|
Fiel foi escrito para quem não gosta de ler. |
Nas palavras do autor, “o livro foi escrito para pessoas que não gostam de livros. Planejei amarrar os capítulos para prender o leitor até o final, disputando com todas as redes sociais, jogos, televisão ou o que for. Começou ler o Fiel, vai até o fim”.
Pouco a pouco a lista de autores lidos por Jessé foi criando um caldo, grosso e substancial. Entre suas leituras estão Camus e Orwell.
Vida real
Fiel conta a história de Felipe, um menino que tinha “tudo para dar certo”, mas acaba atraído pelo mundo do crime. O garoto não é propriamente o alter-ego do escritor, mas carrega um pouco de suas tintas. “O lance de dormir nos ônibus e a adaptação da A Arte da Guerra para resolver as coisas na vida são reais”, contou Jessé.
A obra é também uma tentativa de resgate e alerta. Como o personagem, muitos amigos do escritor se perderam entre as promessas e falsos privilégios de quem mergulha no submundo. No que diz respeito ao tráfico, ele é incisivo e categórico: “O tráfico de drogas é sedutor. Se não tiver uma atenção especial dos pais, já era”.
Mas, ao mesmo tempo, ele usou o trem para buscar elementos que pudesse ajudar na criação da narrativa. Muitos passageiros e muitas histórias que ouvia dentro da condução se transformaram em passagens do livro.