Crítica: “Mundo escrito e mundo não escrito”, de Italo Calvino

O escritor italiano Italo Calvino (1915 – 1985) sempre caminhou entre a vanguarda e a tradição. Seus romances são flertes entre gêneros, formas e estruturas narrativas possíveis. O Castelo dos destinos cruzados, por exemplo, usa cartas de tarô para compor histórias à mesa de um suntuoso castelo. O Visconde partido ao meio narra os dias fantásticos de um homem que é, como diz o título, partido ao meio e cada uma das metades atormenta a outra. Mas Calvino tem outra face – como seu nobre e rachado personagem –: a de ensaísta.

Mundo escrito e mundo não escrito (Companhia das Letras, 312 págs., R$ 49,90), que acaba de ser lançado no Brasil, coloca uma nova luz sobre os escritos não ficcionais do italiano. Assim como Por que ler os clássicos?, os escritos são uma espécie de amálgama capaz de reproduzir a vertiginosa opinião de Calvino, que defende traduções e defenestra críticos.

O leitor também é tema para o escritor. O primeiro ensaio, “As Boas intensões”, trás a imagem do bom leitor, aquele que esperar ansioso as férias para poder se debruçar sobre os livros. É uma obsessão às raias da psicose borgeana com a leitura – Calvino, por sinal, considerada Borges o maior narrador intelectual do todos os tempos – que transforma o homem médio (o medíocre, de José Ingenieros) em um sujeito atuante.

Seguindo o raciocínio do autor, a literatura exerce poder, ainda que restrito e intelectual, ela permite ao leitor e ao escritor se revessarem em cadeiras imaginárias de uma elite pensante. Nesse sentido, Calvino não é comedido: para ele, o sujeito que lê é o único que está preparando para enfrentar o mundo – tanto o escrito quanto o não escrito.

Crítica

O autor de Cidades invisíveis não poupa ninguém. A sua análise sobre o mercado editorial italiano e a presença de romances estrangeiros (“A Temática industrial”, “A fortuna frustrada do romance italiano” e “Apontamentos para uma coleção de sondagem moral”) destacam a capacidade crítica e estratégica de Calvino.

Parece pouco comum aos escritores a preocupação com mundo editorial – em caráter mercadológico -, mas o italiano não se mostrava diletante ao perceber que a literatura – e a leitura – caminhavam para um apocalipse cultural que ainda está em andamento (basta atentar à coqueluche dos livros de colorir). 

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