A principal causa de morte súbita em hospitais ainda é subestimada no Brasil: o tromboembolismo venoso (TEV), distúrbio considerado de difícil diagnóstico pelos especialistas, mas muito mais freqüente do que, por exemplo, uma complicação cardiovascular, especialmente em pacientes hospitalizados ou acamados, mesmo aqueles que não tenham passado por cirurgia. ?Tanto episódios assintomáticos quanto aqueles clinicamente aparentes em pacientes hospitalizados, estão associados à doença?, reconhece o médico Jorge Timi, chefe do serviço de cirurgia vascular do Hospital de Clínicas da UFPR.
O especialista participou do Endorse, um estudo multinacional, apoiado pela sanofi-aventis, que mostrou que a maioria dos pacientes hospitalizados pesquisados tem risco de sofrer o distúrbio e não recebem a profilaxia recomendada. O TEV – que representa um espectro de doenças que inclui a trombose venosa profunda, a trombose associada a cateteres venosos centrais e, a sua mais grave complicação: o tromboembolismo pulmonar – mata mais do que a somatória das vítimas de aids, câncer de mama, de próstata e os acidentes automobilísticos. ?A questão é que o distúrbio pode ocorrer como conseqüência secundária a outro problema de saúde pelo qual o paciente foi hospitalizado?, observa o Timi.
No entender do cirurgião vascular, outro equívoco é pensar que o tromboembolismo venoso é freqüente apenas em pacientes que passaram por cirurgia de grande porte ou ficam imobilizados por períodos mais longos. Apesar de estes serem os perfis básicos das vítimas do TEV, a doença pode ser causada por uma série de fatores, combinados ou não, como câncer, acidente vascular cerebral (AVC), uso de medicamentos contraceptivos orais, presença de varizes e uma série de outros distúrbios.
Epidemia silenciosa
A explicação dos médicos é de que, ao sofrermos algum tipo de ferimento, o organismo reage e aciona um sistema de coagulação para estancar o sangue. São plaquetas se dirigem para o local do ferimento e formam uma barreira, conhecida por trombo. Depois de algum tempo, este coágulo se dissolve e a circulação volta ao normal. A situação se complica no organismo de algumas pessoas que, por algum motivo, criam esses bloqueios em locais onde não houve sangramento, ficando mais sujeitos à trombose.
O TEV engloba duas manifestações clínicas distintas: a trombose venosa profunda – quando o coágulo obstrui o fluxo sangüíneo das veias dos membros inferiores – e sua maior complicação, a embolia pulmonar, situação em que o trombo se desprende, migra para os pulmões, podendo levar ao bloqueio parcial ou total das artérias pulmonares e, inclusive, à morte. De acordo com Jorge Timi, se isto ocorrer em uma artéria que irriga o coração poderá obstruir a passagem de sangue e fazer com que o órgão parar de funcionar.
Essa verdadeira epidemia silenciosa está presente no dia-a-dia dos hospitais brasileiros, cujos médicos, muitas vezes, desconhecem a magnitude do problema. No estudo Endorse no Brasil, 5% dos médicos não tinham conhecimento sobre o tema e 40%, apesar de conhecer, não faziam a profilaxia corretamente. Algumas medidas preventivas são recomendadas para os pacientes com risco de TEV, entre elas, elevar os pés das camas do paciente, recomendar o uso de faixas ou meias de compressão, fisioterapia e acelerar a retirada do paciente do leito, quando possível. ?Nos casos mais complicados, a profilaxia deve começar pela indicação de anticoagulantes?, recomenda Jorge Timi.
Diretriz precisa ser mais disseminada
Preocupadas com as proporções do problema, há um ano, doze sociedades médicas definiram em conjunto, com o apoio da sanofi-aventis, a primeira diretriz para prevenção da TEV em pacientes clínicos. Em uma reunião realizada em Curitiba, com a participação de cirurgiões vasculares, cardiologistas e médicos intensivistas, Edison Paiva, professor colaborador da clínica geral do Hospital das Clínicas de São Paulo e um dos coordenadores do estudo, comentou que, apesar de obter avanços, o objetivo da diretriz, que é buscar uma maior eficácia na profilaxia da trombose, necessita ser ainda mais disseminado.
O foco da diretriz é alertar os médicos para a incidência alarmante da TEV e facilitar a identificação dos pacientes com risco de desenvolver o distúrbio. “Infelizmente, a avaliação dos pacientes por parte dos médicos ainda é precária”, ressalta o coordenador do grupo formado enfermeiros, farmacêuticos, fisioterapeutas e médicos de diversas especialidades. Paiva compara a incidência da trombose a um iceberg, cujo maior perigo não está visível, já que 80% dos casos não causam sintomas que chamam a atenção e em mais de 70% dos doentes a causa mortis só é detectada em autópsia.
A diretriz recomenda, entre outros coisas, que todo paciente com idade igual ou superior a 40 anos, internado por mais de três dias, com mobilidade reduzida e outros fatores de risco associados deve receber tratamento preventivo para evitar a TEV e suas conseqüências.
Fatores de Riscos
Algumas condições podem predispor o paciente a sofrer de trombose
* Idade acima de 40 anos
* Traumatismos e imobilização prolongada
* Obesidade e fumo
* Varizes grandes
* História anterior de trombose
* Alterações genéticas que afetam o mecanismo de coagulação
* Cirurgias de grande porte
* Infecções e doenças graves
* Gravidez e pós-parto