Trauma, um triste recorde

O Brasil gasta 10% do seu Produto Interno Bruto (PIB) com problemas de saúde provenientes da violência. São mais de R$ 15 bilhões por ano, sendo que apenas as vítimas de acidentes de trânsito consomem R$ 6 bilhões. Mesmo com estatísticas que apontam 150 mil mortes ao ano, a questão é pouco lembrada em campanhas e alertas à população. ?No Brasil, a emergência ainda é muito desvalorizada?, reconhece Milton Stainman, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Atendimento Integrado ao Traumatizado (SBAIT). Segundo o médico, as vítimas quase sempre chegam às mãos de profissionais recém-formados e em prontos-socorros mal equipados, quando o que elas mais precisam naquele momento é de uma equipe experiente, com todos os recursos necessários.

Mas as causas externas de morte, também denominadas de "trauma", não param por aí. Mais do que no trânsito, os brasileiros são vítimas das armas de fogo, das facadas, das brigas, isso é, das chamadas violências interpessoais. No país, essas são as principais causas externas de morte, principalmente nas grandes metrópoles. As estatísticas revelam que quanto menos desenvolvida uma região, mais mortes por homicídios ela terá. Basta comparar: enquanto na Europa Ocidental o suicídio é a principal causa de morte por trauma (28,1%), no Brasil são os homicídios, que atingem 27,8% dos óbitos. O índice aumenta em regiões consideradas extremamente violentas. O Ministério da Justiça divulgou que 50% dos homicídios cometidos se concentram em 27 municípios, a maioria capitais.

Mobilização é diferente de educação

Visto durante séculos como resultado de uma série de acidentes, o trauma passou a ser encarado como doença há menos de meio século. Pesquisas alertam que o trauma já ocupa o segundo lugar entre as causas de mortalidade no país, perdendo apenas para as doenças do aparelho circulatório. Segundo o médico Jurandir Marcondes Ribas Filho, do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, o prejuízo para a sociedade é imenso, já que a maioria das vítimas perde em média cerca 30 anos produtivos, levando-se em conta que a vida produtiva de uma pessoa se estende até os 65 anos. ?Isso representa, normalmente, uma diminuição de mão-de-obra significativa?, atesta. Nos Estados Unidos, estima-se em US$ 1 milhão o custo de cada uma das mortes por trauma nessa idade, baseado na renda que deixará de ser produzida por esse jovem.

Para Milton Stainman, a preocupação é legítima, afinal os custos dessa verdadeira epidemia atingem em cheio o orçamento da saúde pública, que atende a maioria das vítimas e necessita, urgentemente, de melhorias. No entanto, o mais importante, segundo o dirigente, não são as mobilizações. "Mobilização é totalmente diferente de educação. As ações de impacto são importantes, mas precisamos mudar a mentalidade do brasileiro, que bebe antes de dirigir, que dispara tiros em brigas de bar?, ressalta. No seu entender, somente ações mais punitivas são capazes de educar a população. O médico cita que, por exemplo, no Japão, um passageiro que está ao lado de um motorista embriagado também é preso.

Ano a ano, a questão do trauma se agrava no Brasil. Nos hospitais, prontos-socorros e unidades básicas de saúde, as urgências e emergências crescem assustadoramente, exigindo uma maior estrutura de atendimento. ?Um dinheiro que poderia ser aplicado em outras áreas da saúde?, completa Jurandir Ribas Filho, salientando que o tratamento de um paciente com trauma custa, em média, 60% a mais que os cuidados com um paciente não complexo, devido a necessidade de se realizar exames mais especializados, como ressonância magnética e tomografia computadorizada.

NÚMEROS DO TRAUMA NO BRASIL

* 150.000 mortes violentas por ano.

* O número de pessoas com seqüelas definitivas chega a centenas de milhares.

* Cerca de R$ 9 bilhões são destinados ao atendimento ao trauma anualmente, quase um terço de tudo que é investido em saúde pública no País.

* Uma vítima grave de acidente automobilístico custa, em média, ao sistema cerca de R$ 100 mil.

* Dados da Unesco atestam que o Brasil é o recordista em homicídios por arma de fogo no mundo.

* No país, a cada 12 minutos uma pessoa é morta.

* 13% dos homicídios registrados no planeta acontecem aqui.

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