Uma técnica denominada biofeedback tem sido utilizada tanto pelas equipes olímpicas dos Estados Unidos, Japão e Canadá – para que seus atletas atinjam desempenhos máximos de excelência – quanto por profissionais da área da Saúde para indicar os níveis de reabilitação e pontos que precisam ser trabalhados por pacientes com problemas de incontinência urinária ou anal. Para Gisele Regina de Azevedo, do Conselho Científico da Sociedade Brasileira de Estomaterapia, docente da Faculdade de Enfermagem da PUC/SP e diretora da Clínica Sinergia, o biofeedback tem se mostrado eficaz também em pacientes que além da incontinência apresentam disfunção erétil.
O termo biofeedback tem sua origem na junção da palavra grega bio, que significa vida, com as palavras inglesas feed (alimentar) e back (volta, retorno). O termo em português poderia receber o nome de “Bioretroalimentação”. De acordo com Gisele, o processo por meio do qual um sinal biológico (bio) é captado e depois reapresentado (feeedback) à pessoa que o gerou, possibilita seu controle voluntário.
O processo de biofeedback tem início quando o paciente é conectado a um instrumento sensível capaz de captar um sinal biológico. Entende-se aqui por sinal biológico qualquer manifestação produzida pelo organismo. Na maioria das vezes, o que se monitora são os movimentos involuntários, como respirar, piscar, contrair os músculos responsáveis pela retenção e liberação da urina ou fezes, por exemplo. Os sinais captados pelo aparelho são transformados em som ou imagem que o paciente aprende a controlar. À medida que consegue detectar esse som ou imagem, ele (o paciente) aprende a controlar o sinal que lhe deu origem, modificando, assim, seu funcionamento orgânico.
Para compreender a evolução que conduziu a tecnologias como a do biofeedback, é importante reconhecer o avanço nos estudos do cérebro. Não é por menos que a década de 90 foi considerada nos Estados Unidos como a década do cérebro. Os avanços nessa área permitiram o desenvolvimento das mais variadas técnicas de abordagem da mente e do corpo em um nível nunca antes imaginado.
Até então, o conhecimento que se tinha sobre o funcionamento do sistema nervoso autônomo era o de um conjunto de funções biológicas inconscientes, involuntárias e auto-reguladas. A auto-regulação era concebida como um processo imutável, onde leis rígidas definiam o modus operandi de funções como o ritmo cardíaco, a freqüência respiratória, o fluxo sanguíneo entre inúmeras outras. No início dos anos 60, Neal Miller – um dos mais renomados psicólogos experimentais – manifestou sua convicção de que as funções biológicas sob controle poderiam ser manipuladas e colocadas sob o controle consciente através da aprendizagem instrumental.
Miller acreditava que se houvesse um indicador revelando o estado de alguma dessas funções, seria possível condicioná-la, do mesmo modo como fora possível condicionar as funções do Sistema Nervoso Somático. Vencidas certas dificuldades técnicas, o psicólogo demonstrou inequivocamente a factibilidade e o acerto de suas suposições. Se Pavlov demonstrara a possibilidade de se condicionar a salivação em cães com o som de uma campainha, Miller foi além e demonstrou ser possível condicionar-se animais a regularem a quantidade de sua salivação, para mais ou para menos. A partir daí, a experimentação laboratorial confirmou a viabilidade do condicionamento de uma gama de funções autonômicas. Com o desenvolvimento tecnológico, principalmente na área da computação, criou-se condições para o controle instantâneo de um conjunto de funções autonômicas em seres humanos. Surgiu assim o biofeedback.
O biofeedback vem sendo classificado como o mais revolucionário e promissor meio de abordagem do funcionamento mental e corporal, podendo ser considerada uma das terapias que predominará no século 21. A técnica tem sido muito difundida em países desenvolvidos como EUA, Japão, Canadá ou França. No Brasil, poucos profissionais a utilizam porque só recentemente essa tecnologia foi adotada.
Gisele conta que a terapia com o biofeedback para pacientes com problemas de incontinência urinária e anal é utilizada nas clínicas e laboratórios. “Mas durante o tempo em que a pessoa está fora, existe uma série de exercícios muito simples que podem (e devem) ser feitos regularmente e que ajudam no processo de reabilitação, desde que orientados por profissional capacitado”. Segundo a enfermeira, essas técnicas devem ser realizadas diariamente, em sessões de 15 minutos, e podem ser feitas em qualquer local porque são imperceptíveis para as pessoas que estão ao redor. Um desses exercícios é a contração repetitiva dos músculos do períneo, que deve ser executada sem que se contraiam as coxas, o abdômen ou as nádegas.
Para a enfermeira Gisele Regina de Azevedo, os exercícios específicos para a região pélvica podem ser praticados por todas as pessoas, mesmo sem a manifestação de problemas de incontinência ou disfunção erétil. Entre os benefícios estão o tratamento ou a prevenção da incontinência urinária (muito comum nas mulheres) e da incontinência anal, o estímulo ao funcionamento regular dos intestinos, o alívio das dores pélvicas (como a cólica menstrual), a melhora no trabalho de parto, o aumento do prazer durante o ato sexual e a diminuição da dispareunia (dor que muitas mulheres sentem durante o ato sexual).