É como se um jogador de futebol, acostumado às atividades físicas, sentisse a perna travar na hora de bater um pênalti.
De repente, sem entender, ele percebe que não consegue nem sair do lugar. Este é o sintoma inicial da esclerose lateral amiotrófica (ELA) uma doença que compromete a musculatura e causa deficiência motora progressiva.
De acordo com o neurologista Acary Souza Bulle Oliveira, como o próprio nome indica, essa doença se caracteriza pelo endurecimento dos músculos (esclerose), inicialmente num dos lados do corpo (lateral) e atrofia muscular (amiotrófica). Mesmo mal descrita até bem pouco tempo, sabe-se que é causada pela degeneração dos neurônios motores no cérebro e na medula espinhal.
“Embora o diagnóstico precoce seja fundamental para retardar a evolução da doença, na maioria das vezes, ele custa a ser feito”, explica o especialista. Sua evolução causa progressiva fraqueza, dificuldade de realizar movimentos e atrofia muscular que num período variável, de dois a cinco anos, na maioria dos casos, leva o paciente ao óbito.
Fraqueza muscular
Segundo dados do Sistema Único de Saúde (SUS) a incidência da ELA varia de 1 a 2,5 casos em cada 100 mil habitantes, ao ano. A doença não é contagiosa, incidindo, sobretudo em homens adultos, de etnia branca, entre 40 e 50 anos.
Além da fraqueza muscular, a patologia provoca cãibras, espasmos, reflexos exaltados e, em casos mais avançados, dificuldade para falar, engolir e respirar. Outras funções, como as faculdades mentais e psíquicas, nem a visão, audição, tato, olfato, paladar, tampouco as funções sexual, intestinal e vesical, são afetadas pela ELA.
A patologia recebe distintas designações em diferentes partes do mundo. Nos Estados Unidos, é conhecida por Doença de Lou Gehrig, em referência a um famoso jogador de beisebol, vitimado pela doença. Os franceses, por sua vez, optaram por aludir ao médico e cientista Jean-Martin Charcot ao citar a doença.
O médico foi o primeiro a discernir os sinais fundamentais para o reconhecimento de ELA, recebendo a denominação de Mal de Charcot. No Reino Unido recebe o nome de doença do neurônio motor, por pertencer à família de doenças de mesmo nome. A nomenclatura, todavia, predominante no cenário internacional é ALS – sigla de Amyotrophic Lateral Sclerosis, nome da doença em inglês.
Dificuldade de diagnóstico
Além dos elementos genéticos, constatou-se maior incidência do distúrbio em atletas.
Acredita-se que, de alguma forma, a elevada intensidade do uso da musculatura favoreça o processo que desencadeia a neurogeneração.
“Essa, porém, não deve ser uma causa isolada, visto que inúmeros esportistas não desenvolvem a doença”, afirma o geneticista Miguel Mitne Neto.
Afora as questões físicas, observou-se na Ilha de Guan (próxima ao Japão) alto número de pacientes com ELA em decorrência de fatores ambientais.
Devido à rápida evolução da doença, o diagnóstico em fase inicial adquire fundamental importância para os portadores. Todavia, é comum, pacientes despenderem de 10 a 11 meses entre o aparecimento do primeiro sintoma e a confirmação do diagnóstico.
A dificuldade em se atestar precocemente a presença de ELA se deve à ausência de um marcador biológico que facilite a identificação da doença, obrigando os especialistas a uma série de averiguações para o reconhecimento do quadro clínico típico, além da necessidade de eliminar a possibilidade de outras doenças que apresentem semelhantes manifestações.
Funções DA equipe multidisciplinar
* Fisioterapia – prolongar a estabilidade da função motora, flexibilidade e independência funcional do paciente.
* Fonoaudiologia – recuperar a fala prejudicada pela deterioração da comunicação oral.
* Nutricionista – auxiliar pacie,ntes com problemas na deglutição na melhor escolha dos alimentos.
* Pneumologista – Avaliar a necessidade do uso de técnicas de ventilação não-invasivas e o acompanhamento de pacientes que dependem de ventilação controlada.
* Psicólogo – Recuperar o equilíbrio emocional do paciente e seus familiares, exauridos pela evolução da doença.
* Assistente social – Proporcionar informações acerca de benefícios sociais e auxílio financeiro, além de prestar apoio psicológico.
Pouca sobrevida
Usualmente, a doença é confundida pelas miopatias, males da coluna, esclerose múltipla e, ainda, as relacionadas a compressões e lesões medulares. O diagnóstico clínico de ELA pode ser categorizado em diferentes graus de certeza, dependendo da presença de sinais de disfunção dos neurônios motores superiores e inferiores na mesma região anatômica: tronco cerebral, medula cervical e torácica.
“Os termos clinicamente definitiva e clinicamente provável descrevem os níveis de certeza, baseando-se somente em critérios clínicos”, expõem os especialistas. Os exames que ajudam no diagnóstico são a tomografia computadorizada, ressonância magnética raquidemular e encefálica, eletroneuromiografia e estudo do líquido cefalorraquiano, que se complementam com exames de sangue, urina e, muitas vezes, biópsia muscular.
Com o objetivo de retardar e se adaptar à realidade imposta pela doença, o tratamento da ELA volta-se para a manutenção da qualidade de vida dos pacientes.
Para isso, recorre-se ao trabalho multidisciplinar de profissionais de enfermagem, fisioterapia, fonoaudiologia, nutrição, psicologia, assistência social e pneumologia. Embora alguns avanços nas pesquisas, o Riluzol é o único tratamento que obtém alguns meses de sobrevida ao paciente: por enquanto, de três meses, em média.
Instituto Paulo Gontijo
O físico e engenheiro mineiro Paulo Gontijo escreveu uma história de sucesso na ciência, medicina e política. Também, transitou pelas áreas de educação, construiu destilaria de álcool e uma hidrelétrica. Escreveu quatro livros nas áreas de Física, Psicologia e Política, além de um (Tese de um condenado) sobre esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma patologia que compromete a musculatura e causa deficiência motora progressiva.
Dono de uma mente brilhante e idéias inovadoras, o físico descobriu em 2000 que era portador da doença de difícil diagnóstico e pouco difundida entre os médicos, cujo maior desafio é o diagnóstico precoce.
Doente e ciente do seu destino, Paulo Gontijo, antes de falecer, em 2002, deixou sua contribuição para a ciência, idealizando o Instituto Paulo Gontijo (IPG), entidade sem fins lucrativos.
Para incentivar os estudos sobre a doença nas áreas de diagnóstico, genética, tratamento ou epidemiologia, criou o Prêmio PG de Medicina, premiando em R$ 50 mil a melhor pesquisa.
Na primeira edição, o concurso teve âmbito nacional, premiando a bióloga brasileira Agnes Nishimura. Neste ano, o prêmio foi entregue ao pesquisador belga Peter Carmeliet. O IPG também possibilita a participação de especialistas brasileiros em simpósios e congressos internacionais, que debatem sobre a doença.