Paraná tem baixos índices de transplante de órgãos

Apesar dos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul apresentarem altos índices de doadores de órgãos, com o Paraná, estado da mesma região, isso não ocorre. Segundo relatório divulgado no início de fevereiro pela Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), os outros estados da Região Sul, têm mais que o dobro de doadores por milhão de população (pmp) do que os paranaenses. No Paraná esse índice é de apenas 6,4 pmp, abaixo da média nacional, que é de 7,2. Considerando todos os estados brasileiros, o Paraná está em nono lugar.

Para agravar ainda mais a situação desvantajosa, em nosso estado, quando o assunto é transplante de órgãos, houve ainda uma diminuição de 19% no número absoluto de doadores de 2007 para 2008, segundo a ABTO.

Enquanto isso, Santa Catarina registrou um acréscimo de 13%. Problemas na captação dos órgãos nos hospitais, resistência dos familiares da pessoa que teve morte encefálica – condição para a doação da maior parte dos órgãos – são apontados por especialistas como os principais entraves da melhora nos índices no Paraná, um dos únicos estados cujo sistema não informa o número de mortes encefálicas, nem o perfil dos doadores.

Passos lentos

Na opinião do presidente da ABTO, Valter Garcia, apesar dos avanços – o Brasil passou do índice de 6,2 pmp, em 2007, para 7,2, em 2008, e ainda um aumento de 10% no número de transplantes, segundo o Ministério da Saúde – ainda caminha-se a passos lentos.

A meta, segundo ele, é passar de 8,5 este ano no país, e dez, no Paraná. Os maiores problemas estão nas medidas organizacionais e educacionais. Ou seja, ainda faltam aparelhos, laboratórios adequados, profissionais qualificados, cirurgiões disponíveis 24 horas, carros e aviões para transporte. “Falta, também, que os profissionais de saúde sejam melhor preparados para passar informações à população”, avalia.

Para a médica responsável pelo setor de transplantes do Hospital Evangélico de Curitiba – referência no transplante de rins -Fabiana Contieri, as campanhas de conscientização contínuas são fundamentais.

Os dados da ABTO mostraram que houve incrementos de até 200% na quantidade de transplantes realizados em alguns estados depois do caso Eloá – a moça que foi morta pelo namorado em Santo André, interior de São Paulo, no ano passado.

No Paraná, o aumento chegou a 266%. Segundo a médica, também é necessário mais informação entre os profissionais de saúde. “Ainda existe desinformação até sobre o diagnóstico da morte cerebral e sabemos de hospitais que nem notificam a central de transplantes sobre isso”, surpreende-se. Para ela, é necessário, ainda, melhorias no sistema de captação, com equipes abordando as famílias nos hospitais.

Combate aos “fura-filas”

O transplante de rim mudou a vida do securitário Pedro da Silva, de 49 anos. Até receber o órgão, no começo de fevereiro, ele sofria com os efeitos da hemodiálise, que fazia três vezes por semana: vômitos constantes e até um princípio de AVC (derrame).

Ainda bem que os quatro anos de sofrimento acabaram. “Agora eu só penso em fazer tudo que eu não podia fazer antes, como viajar, levar minha família para passear, pois com a hemodiálise ficava preso e os familiares compartilhavam meu sofrimento”, relatou Silva. Ele recebeu o rim de sua cunhada, depois de vários exames, anos de espera e muita burocracia.

Quando o órgão não é doado por uma pessoa da família, é preciso autorização judicial, para evitar negociações escusas. O Ministério da Saúde (MS) pretende dificultar essas ações com uma portaria que deverá “burocratizar” ainda mais esse processo, a fim de evitar ilegalidades.

A idéia é que esse tipo de doação de, não-parente passe por uma comissão de ética do hospital, depois pela central de transplantes do Estado, e somente depois, pelo juiz.

Além da compra de órgãos, que segundo a ABTO ainda é bastante comum, há casos de pessoas que passam na frente das filas, o que é menos recorrente no país. O dobro de doações.

Tomando como exemplo o transplante renal, há mais de duas mil pessoas na fila aguardando o órgão no Paraná. A técnica da Central, Schirley Nascimento, explica que o grande problema é a espera. Para ela, apesar do número de transplantes estar crescendo ano a ano, ainda não é suficiente justamente porque as filas não diminuem na mesma proporção.

No caso do transplante de córnea, por exemplo – órgão que não é tão difícil de ser conseguido – são realizados 90 transplantes por mês no Paraná, mas entram na fila outras 120 pessoas. “Seria necessário, então, o dobro de órgãos para resolver o problema”, lamenta.

Na opinião de Schirley, a população ainda tem a cultura do não doar e a solução é a educação.

“Algumas pessoas têm medo. Há até cidades cujos hospitais não têm conhecimento sobre o que é a doação de órgãos”, disse. Segundo ela, ainda há muitos problemas a serem resolvidos na fila, como as pessoas que vêm de outros estados – alguns estão até deixando de liberar pacientes – e a falta de eficiência da triagem. “Temos muitos pacientes que desaparecem e quando vamos buscar contato já faleceram, principalmente quando se trata de rim e córnea”, lamentou.

Sistema deficiente

* O Paraná foi o estado que mais realizou transplantes cardíacos no ano passado, perdendo apenas para o Ceará. Segundo dados ABTO, a taxa por milhão de população (pmp) de transplantes de coração no Paraná foi de 3,3. Os números estão bem acima da média nacional, que é de 1,1.

O estado que menos fez transplantes cardíacos foi a Bahia, com 0,1 pmp. Os serviços cardíacos da Santa Casa de Misericórdia e do Hospital de Clínicas, de Curitiba; e do Hospital Angelina Caron, em Campina Grande do Sul, são os que mais realizam transplantes no Paraná.

* Na Santa Casa foram 24 transplantes no ano passado, contra 27 no ano anterior. O cirurgião responsável pelo serviço, Sérgio Augusto Veiga Lopes, conta que o número de famílias sensibilizadas vem aumentando, embora a quantidade ainda não seja suficiente. O cirurgião lamenta que ainda haja deficiências no sistema.

“Todo hospital tem uma pessoa responsável por notificar a central de transplantes, mas, muitas vezes, esse profissional está sobrecarregado e passa para outros profissionais não preparados para esses casos”, reconhece, preocupado com o número de pessoas que acaba morrendo pela falta de doadores.

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