As importantes mudanças que ocorreram no comportamento alimentar infantil nos últimos anos têm aumentado a incidência de fatores de risco cardiovascular em crianças. Dentre os principais fatores de risco, atualmente, a obesidade e o sobrepeso na infância aparecem em proporções epidêmicas. Para a nutricionista, professora doutora de endocrinologia, Ana Maria Lottemberg, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, o padrão alimentar praticado na infância causa efeitos em longo prazo sobre a saúde, já que podem ser desenvolvidos nos jovens, determinando o aparecimento de complicações maiores na vida adulta.
?Atualmente, a maior parte das crianças não se alimenta adequadamente e algumas estratégicas e recomendações alimentares precisam ser estabelecidas?, alerta a especialista. Inicialmente, conforme a nutricionista, é importante que os pequenos entendam a importância de modificar seus hábitos alimentares. Além disso, a noção da importância de hábitos saudáveis só ocorrerá se forem criados meios práticos para isso, que dependem da atitude dos pais, como, por exemplo, não cederem às vontades dos filhos, estimularem o bom hábito alimentar e estarem igualmente conscientes sobre os riscos e a necessidade de mudar.
Sedentarismo
Cerca de 20% das crianças brasileiras sofrem de obesidade. O mal atinge as crianças de todas as classes sociais, segundo dados da Sociedade Brasileira de Pediatria. Além das possíveis complicações com a auto-estima, que o apelo estético de um padrão sempre magro impõe, a doença traz inúmeras conseqüências clínicas. A obesidade deve ser prevenida tão logo a criança nasça, evitando assim o surgimento de obesos no futuro, com sérios riscos de doenças como a hipertensão, diabetes, doenças respiratórias, transtornos coronarianos e problemas ortopédicos.
Para a endocrinologista Margaret Boguszewski, é muito importante os pais terem em mente que a maioria das crianças gordinhas não apresentam nenhum distúrbio hormonal. ?Apesar de o fator genético trazer uma importância significativa, em geral a maior causa da obesidade infantil ainda é o erro alimentar, o crescente hábito da ingestão excessiva de alimentos nocivos à saúde, como sanduíches, frituras e doces?, alerta.
Outro fator que contribui para a proliferação da doença é a falta de atividade física. Pesquisas revelam que cerca de 30% das crianças, entre 8 e 16 anos, passam 4 ou mais horas em frente à televisão diariamente. Com isso, deixam de correr nas praças, andar de bicicleta e participar de outras brincadeiras de boa atividade física. Esses estudos procuram relacionar o hábito de ver TV, jogar videogame e navegar na internet com a obesidade infantil.
Cardápio específico
De acordo com a médica, crianças em idade pré-escolar (até 6 anos) que apresentam apetite exagerado ou uma preocupação acentuada com alimentos merecem atenção especial. ?Nesta idade, normalmente, as crianças não dão muita importância à comida?, observa Margaret. Para elas, a médica sugere uma educação nutricional, nunca uma dieta. Detectado o problema, deve ser recomendado um tratamento completo para a obesidade, que inclui um cardápio específico, atividades físicas e, também, um eventual tratamento emocional, recomendam os especialistas.
Atualmente, poucas famílias conseguem preservar o hábito de realizar as refeições em casa, junto à família. Crianças que ainda têm essa oportunidade apresentam alimentação de melhor qualidade, ?pois ingerem maior quantidade de frutas, vegetais, fibras, cálcio, ferro e vitaminas do complexo B e E?, atesta Ana Maria Lottemberg. Outras alterações do comportamento alimentar em crianças foram observadas na freqüência e na composição das refeições e lanches. Poucos jovens tomam café da manhã, abusando cada vez mais dos lanches. ?Aproximadamente 98% dos pequenos se alimentam de três ou mais lanches por dia, e destes, mais da metade o faz por cinco ou mais vezes?, completa a nutricionista.
Inimigo em casa
Além de transferir genes aos filhos, os pais transferem também o seu próprio estilo de vida. As crianças observam atentamente e repetem as ações dos pais. Muitas se negam a absorver um comportamento diferente do que o que foi ensinado pela família. Não há como fazê-las mais ativas, se os pais são sedentários. Não há como obrigá-las a tomar café da manhã, se os familiares saem em jejum para trabalhar.
“As crianças não fazem compra no supermercado”, lembra a endocrinologista Ellen Paiva, lembrando que elas comem o que os pais compram. São os pais os responsáveis pelo cardápio da família e é tarefa deles oferecer opções saborosas e saudáveis de alimentos às crianças. Quando não há organização por parte dos pais, as crianças ficam à mercê da propaganda de alimentos, comem guloseimas e beliscam fora de hora.
A especialista comenta que, quando se investiga o preparo dos alimentos nas residências das crianças obesas, estas questões tornam-se bem claras. Em muitos casos, os erros não estão na forma de preparo dos alimentos, mas na escolha deles. Na maioria das vezes, segundo Ellen, a família consome alimentos industrializados em excesso. São “sopões”, macarrão instantâneo, lanches monótonos e pouco nutritivos. A principal alegação dos pais é de que não têm tempo para cozinhar ou não sabem preparar uma refeição. “Certamente, esta criança não terá hábitos saudáveis, pois, quando bebê, não se acostumou aos alimentos mais nutritivos”, reconhece a endocrinologista.
Mudança no comportamento alimentar
* Deve existir um equilíbrio na ingestão energética
* A prática de atividades físicas e de jogos esportivos deve ser diária
* Limitar o sedentarismo, deixando a criança não mais do que duas horas por dia em frente à TV, videogame e / ou computador
* Acostumar a oferecer legumes, frutas e verduras durantes as refeições
* Leite e derivados devem ser consumidos diariamente
* Crianças e adolescentes que apresentam hábitos alimentares inadequados devem contar com a intervenção da família
* Os pais precisam controlar o que os seus filhos comem e quais são os momentos adequados para o consumo de cada tipo de alimento
* É fundamental que os pais adotem o modelo “coma o que eu como” e não “coma o que eu mando”