O mal do esquecimento constante

Uma pessoa acostumada a ler muito, muitas vezes é capaz de recitar trechos de diálogos encontrados nos livros.

Em certa ocasião, ao tentar contar o conteúdo de uma obra para um amigo, simplesmente não consegue lembrar das personagens.

Se essa pessoa está bem perto dos 65 anos, os outros dizem que isso é algo normal da idade. Que a pessoa não tem que lembrar de tudo e que isso não é motivo para preocupação.

Segundo o especialista em clínica médica e geriatria Antônio Augusto de Arruda Silveira Júnior, não é bem assim.

“Esquecer coisas pode até ser normal porque as pessoas têm memória seletiva, guardando, muitas vezes, apenas o que é realmente importante para elas”, explica, salientando que o problema acontece quando elas esquecem coisas que são realmente importantes. “Coisas como reuniões de trabalho, a panela no fogo, ou seja, coisas relacionadas à memória e que antes jamais esquecia”, frisa.

Piora gradual

Segundo o médico, esse distúrbio é conhecido por transtorno cognitivo leve (TCL) ou comprometimento leve da memória, e surge normalmente após os 45 anos – podendo acontecer inclusive antes, em algumas situações específicas – e deve ser sempre investigado por um especialista.

É um distúrbio exclusivo de memória, por isso, muitas vezes, passa despercebido das pessoas. Num paciente com TCL, a primeira coisa que precisa ser feita é afastar a possibilidade de depressão.

“Um paciente deprimido de 55, 60 anos pode muito bem estar apresentado um TCL”, diz. Nesse caso, além do transtorno de memória, existirão outros sinais e sintomas da doença depressiva.

Para não correr o risco de emitir um falso diagnóstico, o médico não pode se ater apenas ao fato dos lapsos de memória, o que seria o normal do TCL. É preciso verificar se não há outros diagnósticos como, por exemplo, o uso de medicamentos para dormir, altos níveis de estresse, comportamento depressivo, baixo nível educacional e hipotireoidismo. “Isso é muito importante”, segundo Silveira Júnior, porque o diagnóstico precoce é fundamental para a eficácia do tratamento.

Estudos científicos feitos com grupos de pacientes têm demonstrado que o comprometimento leve da memória apresenta piora gradual em 40% dos pacientes, podendo evoluir para demência em poucos anos.

“Temos de lembrar que 60% dos pacientes não costumam evoluir para a demência, mas, sem dúvida, também merecem atenção a seu quadro clínico”, enfatiza.

Declínio cognitivo

Para detectar o comprometimento leve de memória, médicos e psicólogos com especialização em neuropsicologia aplicam testes de avaliação, que devem ser feitos semestralmente, para verificar se há piora do quadro cognitivo e iniciar, assim, o tratamento medicamentoso. A avaliação neuropsicológica é a única que funciona nos casos de TCL, porque consegue adiantar em cinco anos o que mostram as ressonâncias magnéticas.

A causa do TCL ainda está em investigação, mas acredita-se que os possíveis gatilhos sejam os mesmos da demência. Para prevenir, deve-se evitar o uso abusivo de álcool, tabaco e o sedentarismo.

De acordo com Silveira Jr., o declínio cognitivo não é determinante do envelhecimento. O que é comum com a idade é a lentidão do raciocínio, motivada até por questões de inibição. As doenças degenerativas cerebrais são muito mais sacrificantes para a família do que para o doente.

Se a pessoa detecta os sintomas e não quer ser um ‘problema’ para a família, deve procurar ajuda. “O tratamento no momento adequado melhora inclusive as condições de vida do próprio paciente e não deve ser ignorado”, conclui.

No estilo de vida, a prevenção

A linha divisória entre os esquecimentos “normais” da idade e a senilidade pode ser traçada a partir da capacidade funcional e da cognição de um idoso. Por outro lado, ao se focaliza,r promoção e prevenção de saúde, o estilo de vida de uma pessoa na maturidade deve ser levado em alta consideração, dentre os outros indicadores de saúde. Nesse quesito, conforme a geriatra e gerontóloga Vera Lygia Menezes Figueiredo, desponta a importância do estilo de vida para a qualidade do viver na velhice.

A especialista salienta que estilo de vida e bem-estar são “bens” subjetivos, produtos da conscientização de cada pessoa em suas necessidades, desejos, limitações, potencialidades e, principalmente, do grau de aceitação e incorporação de novas experiências.

“Por isso, muitas vezes, algumas modificações dos hábitos de vida não são imediatamente aceitas e necessitam de eventuais adaptações ou ajustamentos”, considera.

A adaptação a essa nova fase da vida, para dar conta de transformações que estarão acontecendo ao longo do processo de envelhecimento, traz a necessidade de mudanças na postura diante da vida e o viver.

Assim, utilizando-se as habilidades individuais e os potenciais ainda disponíveis (às vezes até mesmo alguns inéditos), em forma de aprendizagem, a geriatra acredita que o indivíduo idoso terá condições de responder a esses desafios.

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