Apesar das barreiras éticas, morais, filosóficas, culturais e religiosas a serem transpostas pelo conhecimento a ser adquirido por meio do seqüenciamento do Genoma Humano, acho que boa parte dos enigmas mais cruciais do ser humano, ?de onde nós viemos??, ?quem nós somos?? e ?para onde nós iremos?? poderão ser pelo menos parcialmente respondidos quando compreendermos a real mensagem que o livro da vida chamado Genoma pode nos revelar.
Fica cada vez mais evidente que ao menos uma parte da resposta para a pergunta ?de onde viemos?? estará escondida nos ensinamentos que vamos aprender quando compreendermos melhor as funções dos introns, os ?fósseis genéticos? que carregamos dentro de cada célula do corpo. Saberemos um pouco mais sobre ?quem nós somos?? analisando os exons e as diversas proteínas das suas múltiplas combinações. No entanto, a pergunta mais importante, ?para onde nós vamos??, não poderá ser respondida dentro dos laboratórios e nem pelos cientistas do Human Genome Organization (Hugo).
Penso que os cientistas devem continuar a ser movidos pelo instinto, e ter garantida a liberdade de ir em frente em suas pesquisas sem se preocupar aonde ela os levará. Mas dependerá da sociedade organizada determinar para onde devemos caminhar. Mesmo assim, alguns questionamentos ainda ficam no ar: como a sociedade poderia ter atuado de modo firme e decisivo para definir que a invenção ?avião? só poderia ser usada para transportar pessoas de um local para o outro, e não para despejar bombas? Que a manipulação dos átomos deveria ser usada exclusivamente como fonte de energia, e não para fabricar bombas devastadoras?
Nos intervalos do Hugo, olhando para Berlim, com seus horrores do passado muito recente ainda estampados nas ruas, eu e meus colegas cientistas discutíamos se é realmente possível aprender com os erros do passado para construir um mundo melhor e mais justo. Concluímos que a nova Berlim, unificada e sendo reconstruída até hoje, mas sem vergonha de esconder os horrores cometidos no passado recente, talvez possa servir como exemplo. O enorme potencial de reduzir o sofrimento causado por milhares de doenças foi agora trazido ao mundo pelos cientistas. Cabe à sociedade definir para onde iremos com o genoma humano seqüenciado.
Salmo Raskin, Doutor em Genética e presidente do XVII Congresso Brasileiro de Genética Clinica ? Curitiba (8 a 11 de junho) – www.genetica2005.com.br.
