A recusa em manter um peso adequado para a sua estatura, o medo intenso de ganhar peso e a distorção da imagem corporal são as principais características da anorexia nervosa, transtorno alimentar que surge, geralmente, na adolescência e se manifesta em 90% dos casos em meninas. Foi o que apontou uma pesquisa realizada por especialistas da Universidade Federal de Santa Catarina que buscou identificar prevalências de sintomas do transtorno e de insatisfação com a imagem corporal em adolescentes, com idade entre 10 e 19 anos.
Foram entrevistadas mais de mil adolescentes em Florianópolis, mas os pesquisadores atestam que os índices de sintomas de anorexia nervosa são semelhantes àqueles observados em outras regiões brasileiras. A equipe comandada por Emilaura Alves entrevistou mais de mil adolescentes. De acordo com o levantamento, a primeira manifestação dessa alteração é uma restrição dietética auto-imposta e insidiosa, acompanhada de exercícios físicos planejados para redução do peso e quase sempre despercebidos pelos familiares. ?As adolescentes insatisfeitas com a imagem corporal freqüentemente adotam comportamentos alimentares anormais e práticas inadequadas de controle de peso, como uso de diuréticos, laxantes, auto-indução de vômitos, realização de atividade física extenuante, entre outros?, concluiu a especialista.
Perfeição corporal
O distúrbio parece ter uma prevalência bem maior em sociedades industrializadas. ?Elas são mais vulneráveis às pressões sociais que definem um padrão de beleza e estética, em que ser atraente está ligado à magreza, ou seja, a doença está voltada, basicamente, a questão comportamental?, ressalta endocrinologista e nutróloga Ellen Simone Paiva. São meninas que buscam a perfeição corporal a todo o custo, mesmo que isso represente enormes prejuízos à saúde e à qualidade de vida. Fatores culturais também podem influenciar as manifestações do transtorno. A médica aponta que, mesmo com pouca incidência, a doença pode se tornar reflexo de outros distúrbios, como desconforto epigástrico ou antipatia por certos alimentos.
De acordo com a psicóloga Silvana Martani, negar a comida passa a ser uma solução para atingir a imagem desejada, que, no espelho, para ela, tem muitos quilos a mais. A especialista salienta que essa deformação da imagem se dá quando o corpo que ela imagina é infinitamente diferente do que existe na realidade. ?Assim, o corpo que emagrece é o que está na sua fantasia e, como nunca está perfeito, pois seu nível de exigência é muito alto, passa a definhar?, explica Silvana.
Negação e agressividade
Os resultados da pesquisa mostram que as prevalências de sintomas de anorexia nervosa e de insatisfação com a imagem corporal foram de 15,6% e de 18,8%, respectivamente. Os sintomas do transtorno estiveram mais presentes nas meninas com faixa de idade de 10-13 anos. Outros ?gatilhos? da doença referidos nas entrevistas foram sobrepeso, obesidade e insatisfação com a imagem corporal (a variável de maior risco para incidência do distúrbio). Segundo Emilaura Alves, esperava-se que as adolescentes de mais idade apresentassem as maiores prevalências dos sintomas, no entanto, o estudo apresentou resultado contrário. Pode-se supor que as adolescentes na faixa etária dos 10 aos 13 anos estejam em uma fase de exposição aos fatores de risco para o desenvolvimento do transtorno. Muitas vezes, ninguém da família percebe que a menina está passando por um grave processo psíquico. Ellen Paiva adverte que é muito difícil abordar a pessoa com uma doença dessas. ?Normalmente, elas negam todo e qualquer questionamento que lhe façam, adotando às vezes uma postura agressiva ou extremamente irritada?, realça.
De qualquer forma, o estudo serve de alerta para a necessidade de investimentos em programas de educação nutricional inseridos no ambiente escolar. O objetivo, conforme os pesquisadores, é promover mudanças nos conceitos de imagem corporal, conscientizar sobre os prejuízos que os comportamentos assumidos para redução de peso podem desencadear a saúde e orientar para escolhas alimentares mais saudáveis. ?Esses programas precisam ser dinâmicos e com uma abordagem diferenciada para cada grupo atendido?, avalia a coordenadora.
Fique de olho
Os primeiros sinais da anorexia surgem quando adolescentes
>> Evitam refeições com a família
>> Cortam os alimentos em pedaços bem pequenininhos e escondem parte da comida
>> Só falam em perder peso, tipos de regimes e dietas
>> Usam sempre roupas largas
>> Praticam incessantemente atividades físicas
>> Buscam informações na internet sobre sites de anorexia para trocar experiências
>> Competem com outras meninas para ver quem fica mais tempo sem comer ou quem perde mais peso
A difícil tarefa
Essa é uma doença grave, multifatorial, com comprometimentos físicos e psíquicos. Por isso, necessita de muitos profissionais em seu tratamento, notadamente de médico, psicólogo e nutricionista. A família deve apoiar o trabalho da equipe e precisa ser muito bem orientada.
>> As pacientes anoréxicas desconfiam da maioria dos profissionais de saúde, pois sabem que todos têm muita preocupação com sua alimentação
>> Afirmam que sabem muito bem como se alimentar e não seguem as orientações nutricionais prescritas
>> Discutem sobre cada item da dieta proposta, as alternativas e possibilidades de substituição, mas continuam comendo da maneira que acreditam ser a melhor
>> Não têm vergonha de argumentar que estão gordas, mesmo quando magérrimas, e não se intimidam ou se sensibilizam com a alegação de que podem adoecer e, até, morrer
>> Recusam-se a aceitar qualquer atitude que as faça recuperar o peso perdido
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