O desafio das mães-meninas

S., uma adolescente, de 16 anos de idade, começou a ter relações sexuais aos 13 anos. Seu namorado tinha 17. Ela diz que a primeira foi por insistência dele, dizendo que a amava e se o amasse também, ela tinha que provar esse amor envolvendo-se com ele. Envolveu-se com o rapaz e, no terceiro mês de relacionamento, engravidou. Diz que se arrepende e já se considera ?adulta?, pois tem a responsabilidade de criar seu filho. O pai não assumiu a criança. S. não tem mais tempo para passear e conversar com suas amigas como antes. A sua vida mudou muito. Por seu lado, R., uma menina de 15 anos, envolveu-se com um rapaz mais velho. Conta que manteve relações com ele, por ?umas? quatro vezes. Não sabe onde ele mora, só o conhece por ?Tom? nada mais. Agora, aos 7 meses de gestação não sabe o que será da sua vida.

Apesar do declínio verificado nas taxas de fecundidade desde a década de 1970, a incidência de gravidez inoportuna na adolescência segue um caminho inverso. Estima-se que, no Brasil, essas jovens meninas sejam responsáveis por 20% dos partos. E o que é pior: na maioria das vezes, esse tipo de acontecimento está relacionada à falta de informação e à não-conscientização das adolescentes. Darci Bonetto, da Sociedade Paranaense de Pediatria, explica que muitos fatores interferem para o aumento desses índices. Entre os principais, destaca as questões econômicas, carência afetiva e a falta de um projeto de vida.

Essa situação é considerada em diversos países como sério problema de saúde pública em virtude do impacto que pode trazer à saúde materno-fetal e ao bem-estar social e econômico de um país. Segundo a pediatra, apesar de atingir distintas faixas da sociedade, é a classe mais pobre que apresenta as maiores taxas de gravidez na adolescência. Famílias que ganham até um salário mínimo per capita concentram 65% das adolescentes grávidas. ?Geralmente, por questões financeiras, essas meninas não têm acesso aos métodos contraceptivos e por, muitas vezes, estarem fora da escola, ficam mais expostas aos relacionamentos sexuais sem mesmo conhecer o seu próprio corpo?, admite.

Riscos à saúde

Outra observação é de que essas adolescentes, na maioria das vezes, não têm trabalho remunerado, sendo dependentes financeiramente, seja da família, seja do companheiro. Paralelamente, a tendência para estabelecer união com homens adolescentes, muitas vezes desempregados, deixa-as em uma situação socioeconômica ainda mais precária, fato que, na opinião dos pesquisadores, pode torná-las mais expostas a outras situações de risco social, como o hábito de fumar, beber ou usar drogas.

Sabe-se que, mesmo nos países ricos, engravidar na adolescência reduz as chances de sucesso profissional e que uma gravidez inoportuna é, muitas vezes, um fator facilitador para a interrupção do desenvolvimento escolar, reduzindo, com isso, as futuras oportunidades no mercado de trabalho. Para a psicóloga Léia Cardenuto, esse é um dado preocupante, pois pode levar à perpetuação da pobreza. Um dos possíveis motivos que levariam a adolescente grávida a abandonar a escola, segundo a terapeuta, seria o receio de ser discriminada, uma vez que evidenciar a existência de uma vida sexual ativa nessa faixa etária ainda é um fato pouco aceito pela sociedade.

Outro importante fator, citado por Darci Bonetto, que contribui para a precocidade nas gestações é que a idade da primeira menstruação (menarca) vem se antecipando ao longo dos últimos anos. Assim, a mudança corporal também se dá mais cedo. ?Some-se a isso o explícito incentivo da mídia (revistas, internet e TV) voltado para a sexualidade e teremos um quadro alarmante?, assegura. Para completar, a desinformação quanto ao uso adequado dos contraceptivos e a deficiência de programas de assistência ao adolescente são outros fatores referidos como responsáveis pelo aumento, não só da gravidez, como também do abortamento e das doenças sexualmente transmissíveis na adolescência.

A ginecologista Selma Freire alerta para os riscos físicos da gravidez precoce, já que a Organização Mundial da Saúde considera adolescência dos 10 aos 19 anos. É um período, principalmente na primeira fase, que o útero está ainda em formação, o organismo não está preparado. ?É uma gravidez de risco, pois o bebê pode nascer prematuro, com complicações durante a gestação, principalmente de infecções perinatais?, reconhece a médica. Segundo ela, até o acompanhamento pré-natal, tão importante para garantir uma gestação e um parto sem problemas, é prejudicado na gravidez precoce. ?Muitas meninas demoram para comunicar à família e não fazem o pré-natal ou se fazem é de forma insatisfatória?. O recomendável é acima de seis consultas durante o período.

Principais causas da gravidez inoportuna

* Ausência de diálogo com os pais sobre vida sexual.

* Início precoce das atividades sexuais, por influência da mídia e do grupo de amigos.

* Confusão entre amor e sexualidade por parte de ambos os parceiros.

* Falta de informações sobre reprodução.

* Falta de informações sobre métodos anticoncepcionais.

* Resistência ao uso de preservativos.

* Necessidade de auto-afirmação.

* Rebeldia contra a família.

* Falta de perspectivas pessoais e profissionais.

* Ilusão de que por ser muito jovem ainda não é possível a gravidez.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo