Quando amamos, queremos nos sentir amados também. Isso inclui vontade de receber atenção e demonstrações de carinho frequentes. Para muitas pessoas, ganhar presentes e ser surpreendido com programas bacanas pelo companheiro é parte fundamental da relação. Para outras, isso não faz a menor diferença. O fato é que no Dia dos Namorados, essas pessoas “do contra” podem ter sérios conflitos, pois não gostam de comemorar e presentear por motivos variados. A situação se agrava quando tudo ao redor entra no clima “12 de junho”: lojas decoradas, propagandas na televisão, os amigos escolhendo um presente ou o namorado dando pequenas indiretas sobre o que vai dar e o que quer ganhar.
Em vários lugares do mundo há datas diferentes para os pombinhos comemorarem o amor e o relacionamento. No Brasil, o dia 12 de junho antecede o dia de Santo Antônio que, para os fiéis, é o santo casamenteiro – é ele o responsável por atender aos a quem quer conseguir um casamento. A data passou a ser comemorada a partir de uma campanha publicitária da loja Clipper, uma magazine de São Paulo, em 1948. Seu mentor, o publicitário João Dória, criou o slogan: “não é só com beijos que se prova o amor”.
Mas, de acordo com a psicóloga Suzana Alves, da Unifesp, apesar do caráter comercial, essa data tem, para muitos, uma grande simbologia sentimental. “É um momento de sair da rotina, de pensar no parceiro, algo que, em um mundo ideal, deveria ser feito com frequência, mas com pouco tempo, quase ninguém consegue fazer”, diz a especialista.
Todos os dias ou só 12 de junho?
Um dos argumentos de quem é contra, é que a data não favorece ninguém. Marcelo Segall, biólogo e um dos partidários de que “o dia dos namorados é uma das maiores forçações de barra já inventadas”, sintetiza: “se você está solteiro e mal resolvido, a data te lembra dessa frustração. Se você está solteiro e feliz, sair com alguém pode não ser um bom negócio, porque a data inspira seriedade e compromisso para muitos. Para os ‘enrolados’, cria uma saia justa, na qual ignorar a data, pode fazer a pessoa achar que você não gosta dela – e se apostar em um programa especial para o dia, ela pode achar que você quer namorar. E ainda pode ocorrer de uma das partes comprar presentes e a outra não. Além do óbvio, que para quem não gosta do dia e namora, pode ter o incômodo de ser pressionado para sair e dar presentes”, aponta Marcelo.
O ato de presentear, no entanto, tem sim certa importância nos relacionamentos, mesmo que não seja com bens materiais – pode ser uma poesia, um recado, um momento de apoio, que são muito mais valiosos. E dar carinho é fundamental para manter uma relação saudável todos os dias do ano. “Quem presenteia, doa um pouco de si ao outro, em um gesto de escolher o que o parceiro gosta e criar laços de identificação de personalidade com ele. Além do que, deixa uma lembrança de algo especial, bonito ou útil, que pode ficar guardado para a toda a vida, nem que seja na memória”, explica a psicóloga.
Mas por que tem gente do contra?
Para algumas pessoas, há um, ou até uma lista de motivos para não comemorar esse dia, que podem envolver questões psicológicas, financeiras ou ideológicas. Para Caio Cabral, estudante de filosofia, a data não faz o menor sentido. “Discordo da data, porque minha ideia de namoro e relacionamento não condiz com uma campanha publicitária. A origem desta data é unicamente comercial, foi uma grande jogada de marketing.”
Além daqueles que implicam com a campanha publicitária, há também (ou ao mesmo tempo) os que tiveram algum tipo de trauma relacionado ao tema. A psicóloga da Unifesp explica: “na adolescência, fase mais comum para inseguranças em relação à própria autoestima, muitos jovens penam um bocado quando não têm uma companhia. Outros foram vítimas dos ‘arrasadores de coração’, que terminam um relacionamento exatamente no Dia dos Namorados”, explica Suzana.
Há também razões bem práticas que podem estar envolvidas no ódio ao 12 de junho, como falta de dinheiro para comprar presentes (agravada pelo fato de os preços de presentes, viagens e passeios ser maior nessa época), falta de paciência para encarar enormes filas nos motéis, restaurantes e cinemas e a memória fraca, no caso daqueles que não se lembram sequer dos aniversários do mais próximos. Esses inimigos do calendário implicam justamente com o fato de a data se repetir todo ano, como no caso da jornalista Nathalie Folco. Ela diz: “me sinto agradecendo a pessoa por me aguentar por mais um ano, em vez de supostamente estar agradecendo-a por estar ao meu lado, algo que posso fazer em outros momentos, de livre e espontânea vontade, com ou sem presente.”
Cilada sem saída?
Para a psicóloga Suzana Alves, quando há discordância sobre comemorar ou não essa data, como em todas as divergências de um relacionamento, alguém terá que ceder – ou ambos fazem um acordo, o que é sempre mais satisfatório.
Um ponto bastante importante é que os dois deixem claras as posições sobre o tema, para que o parceiro possa se orientar. “Achar que o outro tem bola de cristal sempre dá errado e no romance, pode criar terríveis dilemas”, de acordo com Suzana. Caio Cabral acerta nesse ponto: “eu sempre deixo bem clara essa posição. Em algumas vezes, há um certo estranhamento, porém, com a explicação, a pessoa costuma entender e, em alguns casos, concordar”.
Do lado dos que acham que a data não pode passar em branco, vale abandonar o drama sheakesperiano caso o companheiro não compre um presente ou não chame para um passeio a dois. “Um bom exercício mental é cultivar o pensamento de que não gostar dos ‘rituais’ desse dia é uma característica da pessoa, e não falta de sentimento – e que a data pode trazer um incômodo a aquele que você ama.”
Do lado dos críticos de plantão à data, vale fazer uma força, caso seu par faça questão de comemorar. Lembrar e comunicar os sentimentos e as qualidades da pessoa não faz mal a ninguém, afinal se você tem um relacionamento saudável, seja recente ou antigo, profundo ou superficial, é porque sente algo bom e admira essa pessoa. Não precisa fazer nada elaborado que demande tempo e dinheiro: vale uma simples mensagem de texto, e-mail, telefonema ou uma visitinha. E não precisa nem mencionar a data, já que ela te incomoda tanto assim.