Cada vez mais, entidades e instituições ligadas ao segmento de saúde, como hospitais, universidades e centros médicos, entre outros, aderem a uma prática médica recente e que tem gerado resultados expressivos no tocante ao relacionamento e humanização dos tratamentos clínicos.
Trata-se dos Cuidados Paliativos, programa que nasceu da necessidade de melhorar a qualidade de vida dos pacientes em fase terminal, além das famílias envolvidas com o problema.
A prática dos Cuidados Paliativos utiliza um grupo multidisciplinar especializado como médicos, enfermeiros, terapeutas ocupacionais, psiquiatras, psicólogos, fisioterapeutas, assistentes sociais, nutricionistas e até tanatoterapeutas (tanatoterapia é uma nova especialidade que ajuda ao paciente enfrentar o momento da passagem com menos dor) para oferecer suporte às necessidades orgânicas, psicológicas, sociais e espirituais dos pacientes terminais. O programa já é adotado por diversos hospitais, ambulatórios e clínicas, contando com centros especializados em medicina paliativa.
Processo de perda
De acordo com a tanatoterapeuta Mara Wiegel, os cuidados paliativos são essenciais para se obter melhor qualidade de vida para o paciente e para a sua família.
“Tão fundamental quanto ter uma vida boa é ter a possibilidade de uma morte mais digna e humana”, afirma a especialista. Ela conta que chega a aplicar técnicas alternativas, conforme o estado de saúde de cada paciente, além de muito diálogo.
A confiança e a comunicação, conforme Mara, tornam-se aliadas no sentido de se compreender melhor o processo de perda e da necessidade dos “perdões” entre todos os membros envolvidos nesta difícil etapa da vida.
Já para o oncologista clínico Sâmio Pimentel, que desenvolve seu trabalho seguindo as premissas desse tipo de atenção à saúde, a oncologia é a especialidade médica que mais se beneficia com essa nova abordagem .
“Tanto o diagnóstico do câncer quanto o momento da comunicação da doença ao paciente e à família devem ser feitos de maneira serena e com técnicas que não traumatizem o paciente”, constata Pimentel. Para o especialista, uma relação indevida e descuidada pode causar sérios problemas no tratamento e piorar o quadro clínico, além de dificultar qualquer atenuação dos sintomas.
Necessidade
Para Ana Maria Goretti Sales Maciel, diretora científica da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), entidade fundada em fevereiro de 2005, atualmente, os cuidados paliativos se constituem em uma necessidade em todos serviços e níveis de atenção à saúde.
“As pessoas já percebem isso muito mais claramente, pois há uma busca cada vez maior dos profissionais para se especializarem e atender a essa demanda”, reconhece a médica, salientando que esse é um momento muito positivo em que se começa a descobrir o que é cuidado paliativo.
Para ela, existe a necessidade de que os cuidados paliativos sejam inseridos no currículo formal de graduação para todos os profissionais da área de saúde, e de que sejam reconhecidos como área de atuação.
“Grandes avanços científicos e tecnológicos das últimas décadas tornaram a vida cada vez mais prolongada e inauguraram um contexto em que a morte constitui não um episódio, mas um amplo e complexo processo, que pode se estender por dias, anos ou mesmo décadas”, completa Ana Maria Goretti Maciel.
Amenizar a dor
De acordo com o livro Cuidado Paliativo, uma publicação do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), no momento final da vida, aquele em que o processo de morte se desencadeia de forma irreversível e o prognóstico de vida pode ser definido em dias a semanas, os cuidados paliativos se tornam imprescindíveis e complexos o suficiente para demandar uma atenção específica e contínua ao doente e à sua família, prevenindo uma morte caótica e com grande sofrimento.
Esses cuidados não pretendem antecipar e nem postergar a morte. Pretendem, sim, promover o alívio da dor e de outros sintomas estressantes, e oferecer, um sistema de suporte que auxilie o paciente a viver tão ativamente quanto possível, até a sua morte, entre outros objetivos.
Para o anestesista português Lourenço Marques, a dor, por exemplo, é um sintoma fácil de tratar, mas muito difícil de suportar, por isso deve se colocar sempre como prioridade na avaliação dos especialistas.
“Nos locais em que a especialidade está mais difundida, existem recursos importantes para efetivamente controlar esses sintomas em praticamente cem por cento dos casos”, admite.
Para o médico, não é possível controlar a dor apenas com medicamentos, que apesar de serem fundamentais, necessitam da contribuição de, praticamente, todo um grupo de atenção multidisciplinar que atuam no serviço.
“O doente necessita de tratar a dor a tempo e não protelar o início do tratamento, e a medicina em cuidados paliativos sabe tratar esta dor e de uma forma relativamente simples e com efeitos secundários mínimos”, enfatiza Marques.
