Um novo estojo de maquiagem, mais uma camisa do seu time do coração, o recém lançado joguinho de videogame, o mais moderno aparelho celular e as guloseimas da moda.
É difícil para os pais resistirem às propagandas televisivas que fazem com que as crianças se tornem consumistas ao extremo.
Também é quase impossível faze-las desistir “daquele” produto anunciado na televisão e que a amiga já possui. Cada vez mais as crianças estão exigindo novidades e ditando as relações de consumo.
Já deixou de ser comum, vermos as meninas que frequentam o ensino fundamental usando roupas de marca, maquiadas, falando ou mandando mensagem via celular. Os meninos seguem a mesma tendência: tênis de grife, roupas e os games mais “irados”.
Nossos pequeninos nunca estiveram tão bem informados quanto aos lançamentos e tendências de brinquedos, roupas, tênis e fast foods. Para eles, é muito mais natural saber qual a marca do celular que sonha em comprar do que distinguir alimentos saudáveis em um prato.
Para medir a percepção dos pais com filhos entre 3 e 11 anos completos sobre alguns aspectos das propagandas direcionadas às crianças, o Instituto Alana encomendou uma pesquisa ao Datafolha, dentro do Projeto Criança e Consumo.
O levantamento foi realizado na cidade de São Paulo entre 22 e 23 de janeiro de 2010. Foram ouvidos 411 pais e mães de todas as classes econômicas, com destaque para a classe C, que correspondeu a 52% dos entrevistados. A margem de erro é de 5 pontos percentuais.
Análise de conteúdo
Sete em cada dez pais entrevistados afirmaram serem influenciados pelos filhos na hora da compra.
Para eles, o maior influenciador dos pedidos dos filhos, entre sete itens estimulados, são as propagandas (38%).
Em seguida estão os personagens ou filmes e programas de TV. Uma das conclusões do levantamento foi de que as questões de controle da programação de TV e do conteúdo das propagandas constituem motivos de preocupação para a maioria dos pais.
A pesquisa revelou ainda que 73% dos pais concordam que deveria haver restrição ao marketing e propaganda voltada às crianças.
Dentre aqueles que apóiam algum tipo de restrição, os pais citaram como possíveis medidas o controle de horário de veiculação das propagandas e uma análise do conteúdo delas, de forma a garantir publicidades mais educativas, além do controle sobre veiculações de produtos com apelo sexual ou que possam incentivar a violência.
Responsabilidade
Há concordância da grande maioria dos pais de que a propaganda na TV influencia os filhos na escolha dos presentes e que levam os filhos a serem consumistas.
Em consequência, a maioria deles é favorável a haver algum tipo de restrição ao marketing e propaganda voltada às crianças. Há aspectos relevantes atualmente para os pais de crianças de 3 a 11 anos, entre eles, violência, cuidados com alimentação, esporte e amizades dos filhos, mas a programação da televisão e do conteúdo das propagandas constitui motivos de preocupação para a maioria dos pais, bem como o controle do conteúdo disponível na Internet.
“Na verdade, a propaganda se relaciona estreitamente aos temas de maior preocupação dos pais, especialmente a violência e a alimentação”, avalia Ana Lucia Villela, presidente do Instuituto Alana, uma entidade sem fins lucrativos que ajuda a desenvolver atividades em prol da defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes relacionadas a relações de consumo em geral, bem como ao excessivo consumismo ao qual são expostos.
“Os pais não são os principais culpados”, disse Helio Mattar diretor-presidente do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente sobre o tempo que as crianças ficam em frente à TV e às telas de computador.
Ele afirma que os pais têm, sim, responsabilidade sobre os atos dos filhos. No entanto, comenta que grand,e parte da culpa é da indústria do marketing, que induz as crianças a quererem e sentirem necessidade de passar cada vez mais tempo brincando com jogos eletrônicos, por exemplo.
Desde cedo
Para o teórico político norte-americano, Benjamin Barber, que participou de um workshop sobre o tema em São Paulo, a perversidade da indústria da publicidade se manifesta principalmente na fidelização de consumidores que, na verdade, ainda não têm idade para tal discernimento.
O especialista acrescentou que bebês reconhecem logomarcas antes mesmo de reconhecerem palavras, o que é bastante preocupante. Isso quer dizer que os potenciais consumidores dessas marcas são cada vez mais jovens. Por isso o interesse em estimular o individualismo.
“Crianças que brincam sozinhas são crianças que, com certa idade, já podem ir a uma loja ou ao shopping sem os pais e comprar produtos que a mídia as faz crer serem necessários para sua diversão e felicidade”, afirmou Barber.
O marketing envolve a vida da criança do momento em que ela acorda até a hora de dormir. Para a psicóloga norte-americana, Susan Linn, também presente ao encontro, esta é a forma mais eficaz de “ganhar” a atenção dos pequenos durante todo o tempo, e tê-los como consumidores fiéis também quando se tornarem adultos. “Fazer com que a criança reconheça uma marca desde cedo faz parte da estratégia de fidelizar o consumo para sempre”, reconhece.
Culpa de quem?
A mestre em educação Ana Lucia Villela, presidente do Instituto Alana, também não acredita que a culpa seja dos pais. Para ela, tem uma indústria bilionária bombardeando a cabeça dos filhos deles, dizendo: comprem isso, comprem aquilo!. “Com isso, a propaganda pinta os pais como vilões, como os responsáveis por negarem os desejos dos filhos”, avalia.
Essa questão se soma à falta de tempo, correria do dia-a-dia e a ausência em casa, fazendo grande parte das mães e pais caírem nessa armadilha. Usam presentes e dinheiros para suprimir o vazio e o companheirismo necessário para uma relação saudável.
Com todo o amor que têm, o pai e a mãe fazem tudo para acertar. O que eles não conseguem perceber é que esse filho só vai se desenvolver no contato com a realidade e, portanto, no contato com a frustração, com o não, com o não dar, com o não pode, explica a psicanalista Ana Olmos.
Portanto, a regra número um é não ter medo de negar. Impor limites e explicar que não é possível comprar tudo o tempo todo, esclarecendo que o consumo deve ser pautado pela necessidade, é um bem que se faz ao filho, e não um mal.
Algumas estratégias
Algumas estratégias que podem ajudar os pais menos preparados a enfrentarem o fantasma do consumismo sem estresse a, ainda, incentivar a generosidade, a consciência ecológica, a simplicidade.
Pressa – Elas são impacientes e imediatistas. É preciso começar a ensinar por pequenos valores e prazos curtos. Não adianta falar em objetivos de meses à frente. Vá, gradualmente, ir aumentando os prazos, de acordo com a idade da criança.
Necessidade ou desejo – Explique a diferença entre escolher um chocolate ou um aparelho celular. Uma coisa ou outra – Mostre que, com uma nota de R$50 dá para ir ao parquinho e comer um lanche ou assistir um DVD e alugar um brinquedo para brincar em casa.
Empréstimos – Quem se acostuma a pedir coisas emprestadas toda hora é mais propenso a usar o crédito na idade adulta.
Mesada – Comece com a semanada, posteriormente dê a mesada. Se o dinheiro acabar antes do prazo, evite adiantamentos e valores extras.
Presentes demais – Brinquedos demais não deixam a criança mais inteligente, ao contrário, geram estresse para guardar, de não saber com qual brincar. Se quebrou um, não saia correndo comprar outro.
Ecologia – Preocupação com o futuro do planeta é uma das bases para deixar o consumo desnecessário de lado.
Atividades lúdicas – Momentos de lazer em que crianças interagem sem um professor dando respostas prontas são fundamentais para o desenvolvimento. Isso gera criatividade e iniciativa.
Fonte: Andréa Voute, consultora financeira
