Na mensagem anterior, foram considerados, sumariamente, alguns aspectos relacionados com as bases genéticas dos seres vivos, direcionados particularmente ao ser humano.
Hoje serão considerados alguns aspectos relacionados com o outro extremo da vida: a morte.
No campo da Bioética, a morte constitui tema de significativa expressão, cercado de incertezas e de insegurança. No entanto, é acontecimento que envolve todo ser vivo, cuja trajetória de vida inicia com a fecundação. Segue-se o nascimento para crescer, reproduzir-se e morrer.
É, pois, acontecimento para o qual todos os seres vivos caminham inexoravelmente.
A transiçãod a vida para a morte é tema que merece consideração da vida terrena para a vida eterna, aplicável ao ser humano, criado à imagem e à semelhança de Deus.
Diante da morte previsível, o procedimento médico, e não apenas do médico, mas de todos os profissionais da área da saúde, requer detida análise e meditação. É imperioso ter presente que a missão dos profissionais da saúde é de preservação e de defesa da vida e, tanto quanto possível, da saúde integral dos pacientes. Vale dizer, da integridade física, sob todos os aspectos, e também psicológica e espiritual.
O empenho no sentido do prologamento do processo da morte por meio de tratamento e de recursos tecnológicos capazes de prolongar a vida biológica do paciente, é denominado Distanásia.
Distanásia – Palavra de origem grega, para definir morte lenta, difícil, penosa. O prefixo “dis”, significa distúrbio, disfunção, distúrbio tanásia, em grego “thanasia”, significa morte.
O procedimento médico e da equipe que assiste o doente, tem por objetivo proporcionar-lhe conforto, evitar-lhe o sofrimento e, na medida do possível reverter um quadro aparentemente inviável.
Alguns fatores da conduta distanásica:
1 – Angústia do médico pelo insucesso terapêutico e a resistência em aceitar a morte do paciente.
2 – Condições do paciente, inclusive sociais e políticas, de grande prestígio.
3 – Ilusão de que a evolução do quadro do paciente para a morte poderá reverter e mudar de direção.
4 – Exigência de familiares, reivindicando o impossível, até mesmo ignorando os desejos do paciente, expressos quando ainda se encontrava consciente.
Paciente muito jovem.
Diante da morte iminente, alguns fatores precisam ser considerados: Pacientes terminais, especialmente os cancerosos e, em cada caso, o grau de comprometimento; Doentes crônicos com evolução desfavorável, acometidos por complicações irreversíveis.
O que se espera do médico e de sua equipe diante do paciente cuja probabilidade de reversão do grave comprometimento do seu quadro clínico? É de se esperar uma conduta de equilíbrio, que assegura ao paciente as melhores condições de conforto, sob todos os aspectos. Contudo, é importante não contrariar a natureza: A morte natural, compatível com a dignidade humana.
Não é raro que ocorra, por parte dos familiares, uma diminuição e até mesmo perda de confiança no médico assistente. Quando isto acontece, não significa obrigatoriamente que o médico esteja falhando na sua orientação. Uma série de fatores pode condicionar a desconfiança familiar. O mais comum é o excesso de zelo e a falsa convicção, inerente a todo ser humano, da pretensa inestinguibilidade: viver esta vida terrena como se fosse eterna. O raciocínio é de que aconteça somente com os outros, em outras famílias. No fundo, esse modo de ver e de sentir prenuncia a outra etapa da existência humana; para os que crêem, começa a partir da transição terrena. Ou seja, após a morte física.
Diante da insegurança dos familiares, a qual se confunde com a perda, ou diminuição da confiança no médico assistente, uma iniciativa importante é a solicitação do concurso de outro profissional, ou mais de um, sempre de comum acordo com os familiares, e até mesmo por sua iniciativa e indicação. É a denominada conferência médica, outros a intensamente utilizada, hoje quase ignorada.
Outros fatores que devem ser considerados:
– Respeitar o direito dos pacientes e dos seus responsáveis de aceitarem ou recusarem o tratamento. Nesta circunstância, é importante, indispensável mesmo, orientação jurídica; manter o paciente, ou seus responsáveis, devidamente informados.
O emprego de meios extraordinários, ainda que possam oferecer perspectivas favoráveis, antes de torná-los viáveis é necessário considerar eventuais dificuldades. Considerar que os benefícios possam não corresponder ao objetivo almejado, além de inconvenientes que possam causar.
Acresce o fato de que o procedimento ordinário e o extraordinário não apresentam uma divisória clara. É um dilema com o qual o médico se depara, com relativa freqüência. Uma séria reflexão poderá facilitar ao médico a definição adequada:
1.º – Procurando situar-se na condição do paciente, interrogando-se quanto à eficácia do procedimento. O que desejaria que se lhe aplicasse, fosse ele, médico, o paciente.
2.º – Considerar que aquilo que pode ser comum, rotineiro mesmo, para expressivo número de casos, pode não o ser para alguns poucos. Daí a importância de considerar-se procedimentos ordinários e extraordinários. Serve como referência, não somente para o médico, que tem a responsabilidade de decidir, mas ao próprio paciente e também para manter os seus familiares devidamente informados e esclarecidos.
Em determinado momento surge a difícil mas necessária decisão: face à condição do doente e dos recursos médicos, é correta a decisão de deixá-lo morrer, com dignidade, cercado de todos os cuidados que lhe propiciem conforto; ou que continue a viver, mediante a utilização de recursos tecnológicos extraordinários?
Eis um impasse?
O apelo à eutanásia, que é a interrupção da vida; portanto, a morte provocada, segundo os que a defendem, praticada por misericórdia.
A eutanásia é absolutamente condenável, extremamente polêmica, antiética e ilegal. Fere todos os princípios e atributos da vida.
Será objeto de outras mensagens.
Ary de Christan é da Academia Paranaense de Medicina.