O mínimo sinal de infecção basta para que a secretária Marilene Bastos procure uma farmácia e compre medicamentos antibióticos para ?solucionar de vez? o mal-estar do seu filho Renan, 12 anos. Desde pequeno foi assim: dor de garganta, tosse e resfriado, sempre foram tratados dessa maneira. Para muitos, essa é uma situação corriqueira. Algo que se tornou tão rotineiro que tem levado não apenas à automedicação, mas ao surgimento de marcas preferidas, como se tais medicamentos fossem refrigerantes ou sabão em pó.
Uma das causas da crescente prescrição de medicamentos antibióticos é a pressão dos pais para que isso aconteça. Essa constatação é o resultado de pesquisas internacionais na área da pediatria. As estatísticas apontam que cerca de 30% dos médicos receitam antibióticos pressionados pelos pais que insistem, geralmente por excesso de precaução, na prescrição desse tipo de medicamento para solucionar as infecções em seus filhos. Esse é um dos motivos que mais faz crescer a ?antibioticoterapia?.
Para o farmacêutico Jackson Rapkiewicz, da Central de Informações de Medicamentos do Conselho Regional de Farmácia do Paraná, o tratamento com antibióticos deve ser ?rigorosamente racional?, ou seja, a prescrição por parte do médico deve contemplar seus riscos e benefícios para o paciente. Além disso, não deve ser interrompido de maneira nenhuma. Rapkiewicz explica que nos primeiros dias a ação do antibiótico consegue eliminar somente as bactérias mais fracas ? apesar de amenizar os sintomas da infecção. Assim, as bactérias mais fortes sobrevivem e criam uma resistência que só é destruída pela prescrição de medicamentos mais potentes.
Infecções virais não precisam de antibióticos
?O uso indiscriminado de qualquer medicamento sem a indicação correta é muito perigoso, os riscos de se sofrer efeitos colaterais é considerável?, explica o pediatra Luiz Ernesto Pujol, considerando que a utilização irracional dos antibióticos é pior ainda. O costume mais prejudicial, segundo o médico, é a insistência que muitos pais têm de repetir alguma receita ou ministrar um medicamento que ?deu certo? para algum conhecido ou parente.
?Não existe a necessidade de se receitar antibióticos para tratar resfriados simples, nem para a maioria das infecções de garganta ou bronquite?, afirma o especialista. Essas infecções são virais e autolimitadas (evoluem e melhoram sem medicação), garante, salientando que 90% das infecções intestinais também não necessitam dos antibióticos no seu combate.
Os cientistas alertam que ?a guerra contra as bactérias está sendo perdida?. O ponto mais preocupante é que a proliferação de microorganismos resistentes aos antibióticos tem ocorrido em velocidade e freqüência muito superiores ao ritmo de produção de novos medicamentos. Tão logo surge um novo antibiótico, os microorganismos começam a desenvolver resistência a ele, atestam.
Ambulatórios e postos de saúde devem mudar sua orientação
Infelizmente a realidade vivenciada nos serviços de emergência dos hospitais ou dos postos de saúde também faz com que os antibióticos sejam bastante prescritos. A justificativa é de que, no atendimento emergencial, o profissional tem poucas condições de aguardar a evolução da doença na criança, daí prescrevem-se mais antibióticos. Fato que dificilmente ocorre nos consultórios, onde é possível aguardar uma reavaliação do paciente e fazer um melhor acompanhamento do resultado da medicação prescrita.
Essa tese é rechaçada por Pujol, que considera uma obrigação ética do profissional de saúde orientar sobre o uso correto dos medicamentos e, no caso de qualquer intercorrência, colocar o serviço de atendimento emergencial à disposição do paciente. ?O tratamento pode ser acompanhado, preferencialmente pelo médico que prescreveu o medicamento; na sua falta, esses serviços contam com plantonistas que têm totais condições de verificar sua evolução?, frisa, reconhecendo que não é por esse motivo que a prescrição indiscriminada de antibióticos deva prevalecer.
Considerações básicas sobre o use do antibióticos:
Sem receita médica não dá.
Reaproveitamento de receitas anteriores também não.
Ao usar, tome o medicamento durante o período indicado pelo médico (nem mais nem menos).
Alguns tipos de infecções de ouvido requerem antibióticos, mas não todas.
Bronquite aguda ou tosse não precisam.
Tratar de infecções virais com antibióticos não serve para evitar infecções bacterianas.