Antes de começar a aula, a bagunça está generalizada. Carlos passa pelo meio da turma do canto e leva um tapa na nuca. Camila grita para Joana: ?Ô, gordinha, passa o livro.? João xinga Pedro de burro e Maria critica o cabelo de Jéssica. Até há pouco tempo todos esses comportamentos eram considerados normais. Mas, hoje, especialistas desaprovam completamente tais brincadeiras e até encontraram um termo: bullyng, termo que em português tem o significado parecido com ?agressão velada? para essas brincadeiras de mau gosto. O bullyng é usado quando crianças ou adolescentes que passam por situações humilhantes, sejam apelidos pejorativos, ameaças, agressões morais e físicas por parte dos colegas de classe.
De acordo com Adriana Pelizzari, gestora de educação infantil do Colégio Bom Jesus, as vítimas de tais comportamentos se tornam mais propensas ao isolamento social e a conseqüente queda no rendimento escolar. E o que é pior: em casos mais graves pode levar ao surgimento de doenças, como a depressão e, até mesmo, o suicídio. Em Curitiba, os dados ainda são insuficientes, mas uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (Abrapia), no Rio de Janeiro, mostrou a incidência de 60% de casos de bullyng nas escolas cariocas. Um trabalho coordenado por Adriana pretende intervir e, se possível, tentar evitar que alunos sejam humilhados e perseguidos na escola.
?Podemos identificar o bullyng até mesmo fora da escola. No condomínio, no clube e, até mesmo em casa, entre familiares, essas agressões podem acontecer?, reconhece Adriana Pelizzari. Para Aramis Lopes Neto, pediatra e um dos fundadores da Abrapia (Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência) os pais devem ficar alertas para modificações no dia-a-dia dos seus filhos, que podem estar relacionados ao comportamento.
?Cabe aos pais demonstrarem interesse pela vida escolar de seus filhos, perguntar não só sobre as notas, mas também sobre o prazer de estar na escola, sobre as amizades, a convivência e possíveis atos de violência física ou moral?, comenta o pediatra, salientando que tudo deve ser ouvido com atenção e valorizado em todos os sentidos, sem críticas ou atos de desconsideração. Por outro lado, o comportamento dos pais, em casa, também pode favorecer o desenvolvimento de bullyng. Aramis Neto cita casos de carências afetivas, falta de limites, desestruturação familiar e violência doméstica, como gatilhos para a incidência do distúrbio.
Adriana Pelizzari reconhece que a maioria dos estudantes não se envolve em atos de bullying, mas convivem com estes e reagem, muitas vezes, de forma negativa, reprovando tal comportamento. ?A nossa intenção é desenvolver um trabalho continuado, envolvendo toda a comunidade (professores, funcionários, estudantes e famílias)?, admite a gestora. A sugestão da Abrapia é para que os profissionais que atuam junto às crianças e aos adolescentes sempre os questionem sobre a convivência na escola. ?Também cabe à família prestar atenção ao processo de socialização e estar disposto a ouvir as queixas de seus filhos, sem críticas ou cobranças?, complementa Aramis Neto.
ENTENDA A DIFERENÇA
Brincadeiras são atos que trazem satisfação e prazer a todos os participantes.
Desavenças são desentendimentos passageiros, que passam, ou que levam ao rompimento de uma relação.
Bullying são atos em que um ou mais alunos praticam, repetidamente, contra um ou mais estudantes, causando perdas ou danos físicos e/ou morais a estes, sempre executados dentro de uma hierarquia de poder entre os agressores e suas vítimas.
Pais devem ficar de olho
* Nos desvios de comportamento: agressividade, isolamento, depressão, ansiedade, medo.
* Nos sentimentos: baixa auto-estima, desejo de morte.
* Na vida escolar: notas baixas, não cumprimento das tarefas, desejo de não ir à escola.
* Nos danos à saúde: dores de cabeça, dores abdominais, anorexia, bulimia, alterações digestivas.
* Em outras alterações: roupas e materiais danificados, feridas inexplicáveis, pedidos de dinheiro ou retirar dinheiro escondido, perda do lanche.
