Ana Carolina Reston, de 21 anos, tinha 1,72 m e pesava 40 kg. Ela se achava gorda. Estava internada desde outubro com insuficiência renal. O quadro se agravou e a modelo teve infecção generalizada. Causa da morte: anorexia. O enterro foi realizado em Pirapora do Bom Jesus, a 53 km de São Paulo. São as adolescentes da faixa etária de 15 a 19 anos que apresentam uma maior incidência de anorexia nervosa, uma doença caracterizada pela completa falta de apetite (inapetência). O termo significa ?perda do apetite ou da fome?, mas pode não ser de todo correto, tendo em vista que não há uma verdadeira perda do apetite, mas sim, uma recusa em se alimentar.
Na morte de mais uma modelo, a doença tem exposta a sua face mais glamourosa, mas não é só no mundo das passarelas que a anorexia coleciona vítimas. O distúrbio resulta em uma distorção da imagem corporal presente em qualquer classe social. Inicialmente, a menina expressa uma preocupação com o peso corporal e começa a se interessar por dietas e pela quantidade de calorias dos alimentos. Progressivamente, ela começa a abolir de suas dietas os alimentos mais calóricos e passa a fazer um controle rigoroso na alimentação. Seu peso começa a ficar abaixo da média. O jejum é freqüente e, muitas vezes, deixa de ingerir líquidos com a alegação de que aumentam o volume do abdome. Se a menina chegou a essa fase, não é difícil notar a anorexia nervosa avançando por meio da distorção da imagem corporal.
Pressões sociais
São meninas que buscam a perfeição corporal a todo o custo. ?Mesmo que isso represente enormes prejuízos à saúde e à qualidade de vida?, constata a endocrinologista e nutróloga Ellen Simone Paiva. A doença parece ter uma prevalência bem maior em sociedades industrializadas. ?Elas são mais vulneráveis às pressões sociais que propõem um padrão de beleza e estética, em que ser atraente está ligado à magreza. Ou seja, a doença está ligada, basicamente, a questão comportamental?, ressalta a médica. Fatores culturais também podem influenciar as manifestações do transtorno. Mesmo não sendo proeminente, a doença pode se expressar por outros distúrbios, como desconforto epigástrico ou antipatia por certos alimentos.
De acordo com a psicóloga Silvana Martani, negar a comida passa a ser uma solução para atingir a imagem desejada, que, no espelho, para ela, tem muitos quilos a mais. A especialista salienta que essa deformação da imagem se dá quando o corpo que ela imagina é infinitamente diferente do que existe na realidade. ?Assim, o corpo que emagrece é o que está na sua fantasia e, como nunca está perfeito, pois seu nível de exigência é muito alto, passa a definhar?, explica Silvana.
Imagem corporal
Muitas vezes, ninguém da família percebe que a menina está passando por um grave processo psíquico. Ellen Paiva adverte que é muito difícil abordar a pessoa com uma doença dessas. ?Normalmente, elas negam todo e qualquer questionamento que lhe façam, adotando às vezes uma postura agressiva ou extremamente irritada?, realça. Conforme depoimento da mãe, era assim que agia Ana Carolina.
Para a endocrinologista, a doença, certamente, tem causas complexas, como a própria predisposição às graves distorções psíquicas. De acordo com a psicologia, há um grande vazio existencial, além de um grande apego ao corpo psíquico infantil, de modo que qualquer mudança corporal, perfeitamente normal na puberdade, seja percebida como ameaçadora.
No entender da especialista, o último século valorizou e firmou a imagem como um dos grandes pilares para se atingir o sucesso. Os meios de comunicação passaram a divulgar um padrão de beleza que servia muito mais para mostrar roupas e não vestir roupas. Nada mais justo para essa adolescente querer ficar igual à imagem da revista. O caminho então é procurar uma ajuda especializada e receber orientações sobre a melhor maneira de auxiliar na conscientização dessas meninas.
A difícil tarefa de tratar as pacientes
Essa é uma doença grave, multifatorial, com comprometimentos físicos e psíquicos. Por isso, necessita de muitos profissionais em seu tratamento, notadamente de médico, psicólogo e nutricionista. A família deve apoiar o trabalho da equipe e precisa ser muito bem orientada.
* As pacientes anoréxicas desconfiam da maioria dos profissionais de saúde, pois sabem que todos têm muita preocupação com sua alimentação.
* Afirmam que sabem muito bem como se alimentar e não seguem as orientações nutricionais prescritas.
* Discutem sobre cada item da dieta proposta, as alternativas e possibilidades de substituição, mas continuam comendo da maneira que acreditam ser a melhor.
* Não têm vergonha de argumentar que estão gordas, mesmo quando magérrimas, e não se intimidam ou se sensibilizam com a alegação de que podem adoecer e até morrer.
* Se recusam a aceitar qualquer atitude que as faça recuperar o peso perdido.
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