Em um evento marcado por percalços causados pela rigidez excessiva do cerimonial do Palácio do Planalto, a Feira das Américas 2004, ocorrida na semana passada, no centro de exposições do RioCentro, Rio de Janeiro, acabou com saldo positivo. Além do crescimento de 4,8% do total de participantes em relação ao ano passado, o evento firma sua importância em âmbito nacional e também frente aos 34 países participantes por ter sido, mais uma vez, prestigiado por um presidente da República. A última Abav em que isso aconteceu foi a de 2001, em Brasília, em que o então presidente Fernando Henrique Cardoso abriu o evento com um inflamado discurso influenciado pelos efeitos dos recém-ocorridos ataques terroristas nos Estados Unidos.
Já, este ano, se por um lado a presença de Lula foi marcada por um forte esquema de segurança, que chegou a barrar a entrada da maior parte da imprensa especializada, além de várias autoridades do setor, e atrasou por uma hora e meia o início da feira, deixando milhares de agentes (os donos da festa!) para fora dos pavilhões, por outro, gerou expectativas positivas para um setor ávido por apoio e reconhecimento. “Se depender do governo federal, o setor de turismo vai deslanchar nos próximos anos”, afirmou o presidente já no início de um discurso improvisado e bem descontraído.
Lula disse ainda que considera o setor a forma mais eficaz e barata para fazer a inclusão social, gerando empregos e salários, um dos motivos pelos quais criou o Ministério do Turismo. “Acho descabido um país deste tamanho que faz fronteira com todos os países da América do Sul, com exceção do Equador e Chile, fazer o turismo um apêndice de outra área”, frisou, referindo-se a gestões anteriores em que o setor fazia parte de outros ministérios, como de Esportes e Cultura.
O presidente enfatizou ainda que os brasileiros também podem contribuir para a atração de turistas estrangeiros, falando bem do Brasil lá fora. “Temos que ter auto-estima e saber falar das coisas boas do Brasil. Não precisamos esconder as coisas ruins, mas temos que saber como tratá-las sem que isso afete a essência do nosso País”, disse.
O melhor do planeta
“O melhor negócio do planeta” foi a forma como o ministro do Turismo, Walfrido dos Mares Guia, se referiu ao setor, que gera US$ 3,7 trilhões por ano e representa 10% do PIB mundial. Para Mares Guia, o Brasil recebe somente 4,1 milhões (0,6%) dos setecentos milhões de turistas que viajam pelo mundo porque, até agora, não tinha focado o turista como fator de desenvolvimento econômico-social. Ele lembrou que a Política Nacional do Turismo, lançada em 29 de abril de 2003, tem como meta gerar 1,2 milhão de empregos atraindo nove milhões de visitantes e gerando US$ 8 bilhões em divisas até 2007. “Para isso, a Embratur está focada em promover o Brasil no exterior, por meio das feiras e escritórios”, frisou. Mares Guia informou que o governo tem um orçamento de R$ 140 milhões, além dos R$ 21 milhões da Infraero, somente para promoção nacional e internacional.
O ministro prometeu rever a questão da responsabilidade civil do agente de viagens, citada em discurso pelo presidente da Abav Nacional, Tasso Gadzanis, como um dos grandes problemas da categoria.
Depois de elogiar a iniciativa da presidência na criação do Ministério do Turismo, Gadzanis tocou em dois assuntos pertinentes: a existência da BBTur, do Banco do Brasil, que seria uma concorrente dos agentes de viagem, e o fim do visto para os norte-americanos. “A meta do governo em atrair US$ 8 bilhões em divisas até 2007 seria mais facilmente alcançada se os americanos não precisassem de visto para visitar e gastar seus dólares no Brasil”, disse o presidente da Abav. Quanto a isso, Lula se restringiu a dizer que “precisamos saber por que os americanos não vêm aqui e não é por causa de US$ 50”, citando posteriormente que os brasileiros falarem bem do Brasil aos norte-americanos também é uma forma de gerar curiosidade e despertar a vontade deles em visitar o País. A crise das companhias aéreas não foi abordada por nenhuma das autoridades.
Estrangeiros procuram novos destinos
A divulgação mais expressiva do Brasil no exterior, por meio de eventos e dos escritórios de turismo, está despertando mais o interesse de operadores de diversos países. A novidade é que, além dos produtos tradicionalmente interessantes lá fora, como Foz do Iguaçu (PR), Rio de Janeiro e Amazônia (AM), esses estrangeiros estão buscando informações também sobre destinos menos conhecidos internacionalmente.
Prova disso foi a expressiva participação de estrangeiros no workshop Brazil Today Destination, que ocorreu como parte do 32.º Congresso da Abav e Feira das Américas, na semana passada, no Rio de Janeiro. Um total de 41 operadores de dezesseis países puderam conhecer os produtos apresentados por trinta expositores do Paraná, Rio de Janeiro, Ceará, Mato Grosso, Bahia, Amazonas, São Paulo e Minas Gerais. Do total de países que enviaram representantes para viabilizar negócios no Brasil, seis deles – Finlândia, Noruega, Ucrânia, Eslováquia, República Checa e China – não tinham participado do evento de 2003.
As operadoras Heidi Ursinus e Katja Hoteinen, de Helsinque, na Finlândia, estavam ávidas por conhecer novos destinos brasileiros. Heidi disse que a série de reportagens que vem sendo publicada mais recentemente em jornais e revistas é que despertou seu interesse pelo Brasil. “O Brasil é interessante também porque oferece produtos a preços razoáveis”, comenta ela, que cita o Rio de Janeiro, Natal (RN) e Fortaleza (CE) entre os destinos prediletos dos seus clientes.
Katja comenta que seu público quer “algo novo, especial”, por isso seu interesse, por exemplo, por cidades históricas e locais para se fazer mergulho.
O foco de Filip Odrazka, operador em Praga, República Checa, era o novo material apresentado pelo Rio, Fortaleza e Foz do Iguaçu. “Eles querem conhecer destinos novos daqui, mas também querem saber mais sobre os mais conhecidos”, diz.
Segundo Filip, cerca de 10% de seus clientes vêm para o Brasil. (Danielle de Sisti)
Falhas e soluções para o turismo receptivo
Carência de capacitação profissional e de infra-estrutura para receber turistas, além de alta carga tributária e dificuldades de acesso às linhas de crédito disponíveis nos bancos oficiais são alguns dos problemas do turismo receptivo brasileiro. Essa é a conclusão dos oito encontros regionais promovidos nos últimos meses pelo Ministério do Turismo, em parceria com a Abav (Associação Brasileira de Agências de Viagens), Sebrae e SNC/Sesc/Senac.
“No Plano de Turismo lançado em abril de 2003 existe a previsão de receber nove milhões de estrangeiros até 2007, é um plano ousado, mas não impossível. Confesso que a Abav pouco se preocupou com o turismo receptivo e algo pode ser desastroso a partir do ano que vem”, comenta Tasso Gadzanis, presidente da Abav Nacional, durante a apresentação dos resultados dos encontros, semana passada, no Rio.
Falhas
A falta de capacitação, de modo geral, foi verificada principalmente no que diz respeito às empresas que trabalham com novos nichos de mercado (ecoturismo, turismo rural, GLS, etc.). O tratamento dispensado ao patrimônio natural e cultural é outra preocupação, juntamente à falta de infra-estrutura – ausência de locais para embarque e desembarque de turistas nos atrativos, equipamentos turísticos, terminais rodoviários, hidroviários e aeroportos, além da falta de manutenção na malha rodoviária e da sinalização turística, segurança e acessos adequados às áreas de visitação para portadores de deficiência.
Soluções
Algumas soluções apontadas para resolver problemas do turismo receptivo já estão em andamento. Uma delas é a lei geral de turismo, cuja elaboração está sendo finalizada, regulamentando as atividades e funcionamento dos serviços turísticos. Além disso, há um Programa de Normatização da Atividade Turística e o de Qualificação Profissional. O problema do turismo sexual deve ser enfrentado por ações interministeriais. Em dezembro, no Fórum Mundial para a Paz e Desenvolvimento Sustentável, que acontecerá em Salvador (BA), o Ministério do Turismo realiza um ciclo de seminários sobre Exploração Sexual Infanto-Juvenil no Turismo. (DS)
Balanço
A Feira das Américas 2004 fechou com um total de 18.343 participantes, dos quais 7.443 agentes de viagem, 4.586 congressistas e 6.314 expositores. Isso representa um aumento de 4,8% do total de participantes em relação ao evento do ano passado. A 32.ª edição do Congresso Brasileiro de Agências de Viagens cresceu também em área, ocupando quarenta mil metros quadrados em três pavilhões do RioCentro, dez mil a mais que em 2003. A área que abrigou os estandes somou 19.353 metros quadrados.
Dos cerca de 6,3 mil expositores, a maioria era de paulistas (52%), seguidos de cariocas (27%) e estrangeiros, que representaram 13% do total de expositores. Ao todo, a Abav recebeu 34 delegações do exterior.
Os paulistas também somaram o maior número de público, representando 25% dos inscritos. Em segundo lugar, estavam agentes do Rio de Janeiro (19%) e da Bahia (6%). Um total de 1.401 profissionais optaram por visitar a feira e voltar no mesmo dia para as suas cidades, no chamado bate-e-volta.
O tema que mais despertou a atenção dos visitantes no congresso foi “Novas tecnologias a serviço das viagens” (1.251 inscritos).
Isa Garbin, superintendente e coordenadora-geral do evento, anunciou que um dos planos da Abav é destinar um espaço para que estados e países apresentem um pouco de sua cultura, com apresentações folclóricas e gastronômicas.
Os próximos eventos já estão agendados. No ano que vem, a Feira das Américas vai acontecer de 26 a 30 de outubro; em 2006, entre os dias 25 e 29 de outubro e, em 2007, de 24 a 28 de outubro, sempre no centro de exposições do RioCentro, Rio de Janeiro.