José Domingos Fontana

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Fotos: Divulgação

Dois notáveis da ciência brasileira estiveram em Curitiba.

Em junho, Curitiba foi palco do Encontro Satélite de Aprendizado e Memória da IBNS – (Intl. Behavioral Neuroscience Soc.). Aqui aconteceu a homenagem ao 70.º aniversário do professor Ivan Izquierdo (radicado no Brasil desde 1973), médico pela Universidade de Córdoba, doutor em Farmacologia pela Universidade de Buenos Aires e pós-doutor pela University of Califórnia at Los Angeles, quem, sumariamente, descobriu os principais mecanismos moleculares de formação, evocação, persistência e extinção de memórias e sobretudo a separação funcional entre as memórias de curta e longa duração, o que lhe valeu, dentre outros louvores (mais de 30 premiações), uma publicação em Nature. 

Em sessão solene do conselho universitário, recebeu o título de doutor honoris causa da UFPR no bojo de um pronunciamento academicamente soberbo da vice-reitora Márcia Mendonça. O notável e humilde cientista fez um longo elenco de agradecimentos e com menção às duas únicas qualidades que julga ser detentor: honestidade e fidelidade. Izquierdo detem exatamente 500 publicações plenas em periódicos especializados, mais 17 livros e 76 capítulos de livros. Seus ex-orientados de mestrado somam 38 e os de doutorado, 43. A platéia do evento usufruiu de uma densa palestra proferida pelo mestre em Consolidação da Memória. Numa das pranchas exibidas, ainda em exímio domínio de memória, não se furtou em recitar o significado de cada sigla indicativa de uma dúzia de drogas e seu mecanismo de ação sobre receptores específicos.

Não bastassem as circunstâncias de acima, que fizeram do evento uma festa de real qualidade, outra figura notável da ciência brasileira (e incidentalmente parceiro de Izquierdo – similis similibus congregantur) ali compareceu e ilustrou a platéia com uma revisão dos avanços em príons (moléculas glicoprotéicas de alta funcionabilidade celular e tissular, as quais, de início, eram mero e reducionista sinômino da síndrome da ?vaca louca?): Ricardo Brentani. Fundador e diretor do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer (SP), é médico com doutorado pela USP; preside a poderosa, enxuta e funcional Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo). Auto-definido como um cientista-oncologista de príons, laminina, microarrays e câncer de mama. Poucas palavras-chave para um mundo de ciência, de proteção à vida feminina e de fatos moleculares universalizados. Detem 151 publicações plenas e 15 livros / capítulos de livros. Orientou 17 mestrados e 41 doutorados.

Diferentemente de Izquierdo (meditativo, muito sizo e pouco riso), Brentani faz o ?tano? nato: descontraído, vigoroso, agitado. Também completará seu 70.º aniversário em 2007, e quem sabe uma interessante oportunidade a ser considerada pela UFPR em repetir a concessão do galardão máximo. Afinal, haverá de dar sua modesta colaboração de mais um lustro de vida cada um. Com isto se atinge, em 2012, um sesquicentenário de ciência da mais elevada qualidade e exemplo pujante para as novas gerações de cientistas tão mergulhadas em artimanhas internéticas e menos voltadas no exercício da criatividade, terreno onde Izquierdo e Brentani foram, são e serão qualificados, no mínimo, como costumados esbanjadores. No mesmo ano a UFPR completará seu centenário.

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Dado o espaço restrito e alguma incidental falha de memória, não poderia historiar a contribuição de todos os 31 palestrantes do ?Satélite?, mas numa justificada patriotada paranista fica o registro das apresentações – em pé de igualdade com os demais pares de Brasil e exterior – dos professores Cláudio da Cunha, organizador do evento (?cochichos? moleculares entre o gânglio basal e hipocampo), Roberto Andreatini (glucocorticoides, estresse e depressão), Sílvio Zanatta (comando do príon na adesão celular) e Maria A. Vidal (inibidores de COx e NOS em doença de Parkinson). Parabéns, portanto, à Farmacologia da UFPR.

Recomendamos a leitura do livro (95 págs.) Memória, criteriosamente elaborado pelo professor Ivan Izquierdo e publicado pela ArtMed, de Porto Alegre. Dissolvidos os enlaces sinápticos, uma pessoa sem memória é um ninguém. Despe-se da cidadania. Se a perda da memória é maleficamente seletiva, no máximo chega a converter um voraz pedinte de votos em péssimo político o que (e já não mais quem !) equivale a um analfabeto político. E este é o pior de todos pois dentre outras iniqüidades rouba, deixa roubar ou cobra propina sobre malversação do dinheiro público que seria da educação e merenda das crianças, remédio e hospital dos velhos, enfim daquelas realizações que fazem de um país qualquer uma verdadeira nação.

José Domingos Fontana (jfontana@ufpr.br) é professor emérito da UFPR, pesquisador 1.ª do CNq (1996-2006) e prêmio paranaense em C&T (1996).

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