Primeiro teste de uma bomba nuclear

A idéia de uma explosão experimental não era novidade. Em 1940, os cientistas franceses haviam sugerido um ensaio no Saara e os ingleses numa zona deserta da Austrália. Em 1944, o general L. Groves escolheu Alamogordo, no deserto do Novo México a cerca de 350 km de Los Alamos e a 35 km da aglomeração habitada mais próxima.

Em um ano, o sítio se transformou num complexo de estradas ligando os centros de observação situados em abrigos de cimento armado construídos ao redor do ponto zero, onde havia sido edificada uma torre de aço, acima da qual deveria ser colocada a bomba a ser utilizada. Onde deveria ocorrer a primeira explosão experimental de uma bomba atômica. Essa operação foi denominada de ?Trinity?, nome atribuído por Oppenheimer para essa bomba de plutônio.

Em 15 de julho de 1945, enquanto o Little boy era embarcado no cruzador Indianápolis com destino a Tinian, ilha onde o Little boy e o Fat man foram depositados, 150 cientistas, reunidos em Alamogordo, se apressavam para assistir a um ensaio de uma das duas bombas de plutônio, batizada de Trinity, que ocorreu em grande segredo em 16 de julho de 1945.

À noite, os cientistas atômicos se reuniram no abrigo de cimento armado situado a 8 km do ponto zero: Oppenheimer, Chawick, Frisch, Lawrence, etc. Em 16 de julho de 1945, no fim da noite, como as condições meteorológicas se mostravam satisfatórias, foi decidido que o teste tivesse inicio. Assim, logo depois das 5 h da manhã, ocorreu a primeira explosão nuclear da história. Um relâmpago capaz de cegar, visível a uma distância superior a 35 km, foi seguido de uma enorme detonação que iluminou toda a região, sob uma luz muitas vezes superior à do Sol em pleno meio-dia. Era uma luz dourada-vermelha-violeta-cinza e azul, que iluminou cada um dos cumes das montanhas vizinhas. Trinta segundos mais tarde escutou-se a explosão. O deslocamento de ar chocou-se violentamente contra as pessoas e quase subitamente uma trovoada ensurdecedora e terrificantemente interminável se seguiu, mostrando que éramos pequenos seres blasfemadores que haviam ousado tocar nas forças até então reservadas ao Todo-Poderoso, comentou o general Farrel.

Participando do mesmo sentimento, Oppenheimer lembrou-se de uma citação do texto em sânscrito: ?Sou Shiva, o destruidor de mundos […] agora, me transformei num companheiro da morte, um destruidor de mundos. Estas palavras me vieram a memória instintivamente, e me lembrei também sentimentos de uma profunda piedade que me dominava?.

O general Groves prosseguiu o relato: ?Uma nuvem compacta, maciça se forma, em seguida sobe em flutuações para o alto com uma potência inimaginável. À primeira explosão se sucederam duas outras de menor luminosidade. A nuvem monta a uma grande altura. Ela toma a forma de um globo e em seguida de um cogumelo, a se alongar numa forma de uma chaminé e em seguida se espalhar em várias direções sob os ventos que sopravam em diversas altitudes?.

O chefe dos testes, Kenneth Bainbridge, murmurou espirituosamente na orelha de Oppenheimer: ?A partir de agora, nós somos todos filhos da p…?.

A potência da explosão foi avaliada em 20 mil toneladas de TNT. Esta operação ?Trinity? coroou o esforço científico e industrial que havia absorvido dois bilhões de dólares, em cerca de cinco anos.

Truman

A bomba tornou-se imediatamente uma arma diplomática, pois o presidente Truman, que substituiu Roosevelt e que se encontrava na Conferência de Potsdam, foi imediatamente informado do sucesso dessa explosão experimental. Deste modo, em 16 de julho de 1945, abriu-se a Idade Nuclear e o início de uma grande corrida mundial por arsenais nucleares e de armamento de todos os tempos.

Os sábios americanos estavam contentes por terem vencido os seus colegas alemães. Assim pelo menos pensavam eles. Algumas semanas mais tarde, eles foram informados que a bomba alemã, cujo medo havia conduzido a uma corrida científica durante quase cinco anos, não havia na realidade jamais existido, nem como projeto. Mas, qual era a razão? A razão era simples, Hitler e Göring não atribuíam nenhuma confiança aos físicos alemães que acreditavam que, a despeito da guerra, a fabricação de uma tal bomba era possível. Na verdade, um projeto atômico alemão havia existindo, coordenado por Heisenberg. Mas, devido à rivalidade que existia entre os pesquisadores agravada pelos recursos colocados disposição (cerca de 10 milhões de dólares, ou seja, 0,5% do orçamento norte-americano) fez com que a aventura da bomba alemã terminasse em julho de 1942. O governo alemão recusou dar a sua aprovação a um projeto que lhe havia sido apresentado por um físico cujo nome se ignora até hoje. Göring declarou a Hitler que um tal projeto absorveria uma soma considerável e que, em situação de guerra, esse orçamento não poderia ser suportado. Alegou também o fato de que esse projeto era quase totalmente hipotético. Todavia, a posição alemã mudou quando, em 1943, Hitler percebeu que unicamente as armas novas que não se baseavam na energia nuclear poderiam permitir que a Alemanha retornasse a iniciativa. Foi assim que nasceram as bombas voadoras. Hitler, no entanto, havia encorajado os rumores sobre um projeto atômico alemão ao declarar um dia: ?Que Deus me perdoe os cinco últimos minutos da guerra?. Joseph Goebbels havia invocado uma arma prodígio. Todas essas afirmativas impulsionaram o projeto Manhattan e a operação ?Alsos? que havia por fim de descobrir a equipe de Heisenberg e o seu material.

Ronaldo Rogério de Freitas Mourão é fundador e primeiro diretor do Museu de Astronomia e Ciências Afins, no qual hoje é pesquisador titular, sócio titular do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e autor de mais de 70 livros, entre outros, do ?Explicando a Teoria da Relatividade?.

Três efeitos arrasadores do bombardeio

Em 6 de agosto de 1945, às 2h30, hora local, a meteorologia sobre Hiroshima era satisfatória, o bombardeiro B29 batizado de Enola Gay (em homenagem à mãe do piloto norte-americano que comandava a missão), decolou do aeroporto militar norte-americano Tinian, nas Ilhas Marianas, sob o comando de Paul W. Tibbets, sendo a tripulação composta de Robert Lewis, Thomas Ferebee, William S. Parsons, Morris Jeppson e outros.O comandante Tibets era o único que conhecia os efeitos da bomba de 4 toneladas e meia que transportava no porão. Às 8h09, Hiroshima aparece entre as nuvens. Às 08h15min17seg a bomba é lançada. A explosão equivalente a 12.500 toneladas de TNT de 60 kg de uranium 235 ocorreu 40 segundos mais tarde, a 580 metros acima da cidade, provocando a morte de 140.000 civis. O número de sobreviventes foi superior a 300.000 que apresentaram efeitos de curto e longo termo decorrentes de doenças provenientes da exposição à radiação.

A bomba atômica produz três efeitos arrasadores. Nos primeiros milinéssimos de segundos a energia térmica liberada na atmosfera transforma o ar em uma bola de fogo de aproximadamente 1 km de diâmetro. Durante alguns segundos vários milhões de graus planaram acima de Hiroshima. No solo, a temperatura atingiu vários milhões de graus sob o epicentro da explosão. Num raio de 1 km, tudo foi instantaneamente vaporizado e reduzido a cinzas; até 4 km do epicentro os prédios e os seres humanos sofreram uma combustão instantânea e espontânea; as pessoas situadas num raio de 8 km sofreram queimaduras do 3.º grau.

Após o calor, ocorreu uma onda de choque que provocou um efeito devastador, causado pela enorme pressão devido a expansão dos gases; essa onda de choque progrediu a uma velocidade de 1.000 quilômetros por hora, como se fosse um muro de ar sólido. Ela reduziu a pó tudo o que se encontrava num raio de dois quilômetros. Dos 90 mil prédios da cidade, 62 mil foram completamente destruídos.

O segundo efeito ainda pouco conhecido em 1945 – foi o da explosão nuclear que espalhou a radioatividade, que provocou câncer, leucemia e outras doenças. Ela espalhou um terror muito maior do que as outras pois os seus efeitos só apareceram dias, meses e até mesmo alguns anos após a explosão.

A bomba medindo 4,50 metros de comprimento e 76 cm de diâmetro foi denominada pelos norte-americanos de Little Boy (Garoto). Sua potência equivalia a de 13 mil toneladas de TNT concentrado num pequeno espaço. Ela provocou a morte de 80 mil pessoas e deixou 70 mil feridos, sendo que muito desses morreram.

Em 6 de agosto de 1945, após o bombardeio de Hiroshima, a Casa Branca comunica ao povo norte-americano informando: ?Acabamos de lançar sobre o Japão a força de onde o Sol tira o seu poder. Nós temos domesticado a energia fundamental do universo?.

Nagasaki

Em 9 de agosto de 1945, às 11h02min00s, uma segunda bomba nuclear batizada de Fat man (Homem gordo) foi lançada por Charles W. Sweeney, Frederick L. Ashworth, e outros de um bombardeiro B-29 sobre a cidade de Nagasaki. O alvo foi trocado de Kokura para Nagasaki em virtude das más condições de visibilidade; somente 20 segundos de visibilidade sobre Nagasaki. A explosão equivalente a 22 mil toneladas de TNT foi obtida usando 8 kg de plutonium 239, com uma bomba de 4,5 toneladas, provocou a morte 70 mil civis.

Logo depois Harry Truman se pronunciou: ?O mundo constata que a primeira bomba atômica foi lançada sob Hiroshima, uma base militar; nós ganhamos, contra a Alemanha, a corrida da sua descoberta. Nós a utilizamos com a finalidade de reduzir a angústia da guerra e com o fim de salvar as vidas de milhares e milhares de jovens americanos. Nós continuaremos a empregá-la até conseguirmos destruir  completamente os recursos bélicos japoneses?.

A rendição

Em 15 de agosto, Hirohito, imperador do Japão, da era Show, anunciou a capitulação incondicional do seu país. Ele havia começado o seu reinado em 1926; era pequeno, frágil, rosto oval ornado por um fino bigode. Hirohito tinha 46 anos, quando se dirigiu pela primeira vez ao seu povo para comunicar chorando numa linguagem arcaica cheia de eufemismo uma mensagem muito direta: ?O Japão perdeu a guerra. O inimaginável aconteceu, é necessário aceitar o inaceitável: a rendição, a ocupação, a humilhação. Acabou o Grande Império?.

Ele escolheu salvar a nação no lugar de salvar a sua imagem. Hiroshima e Nagasaki acabavam de ser atomizadas e Moscou de entrar na guerra contra Tóquio. Nas semanas que se seguiram, enquanto se operava a rendição e as tropas de ocupação se instalavam, o imperador deprimido permaneceu invisível por atrás dos altos muros do seu palácio.

Mais tarde, em 2 de setembro de 1945, a rendição japonesa foi assinada. Assim estava terminada Segunda Guerra Mundial, que não acabou em 8 de maio com a capitulação do III Reich.

Em 6 de agosto de 1945, uma única bomba colocou o fim desse conflito. Dando início ao terrorismo de Estado.

Por que o grande interesse pelo Japão?

Uma vez assinada a rendição dos alemães, o único inimigo dos aliados que ainda se recusava a render era o Japão. Porque poderia virtualmente se considerar derrotado. Mais de 600 toneladas já haviam sido jogadas sobre o Japão provocando a morte de mais de 100 mil pessoas em Tóquio. Apesar das baixas, os japoneses continuavam lutando.

Mas o grande interesse dos aliados era a conquista e ocupação do território japonês. Várias operações de conquista foram programadas, dentre elas as duas principais foram: os planos ?Olympic? e ?Coronet?. O objetivo era claro: cada região, cada ruína deveria ser conquistada. A grande dificuldade é que o japonês tinha como mentalidade defender-se até a morte. Os norte-americanos não tinham dúvida sobre o resultado dos combates. Eles estavam seguros da vitória. No entanto, a questão era o preço de vidas humanas que seria imposto aos americanos e japoneses. O general Marshall estimava que as perdas, no mínimo, se elevariam a 500 mil mortos. Esta estimativa era duas vezes e meia superior à vitória sobre a Alemanha que havia causado a morte de 200 mil soldados. Eles estavam convencidos que era preciso essa enorme perda de vidas para concluir uma vitória já virtualmente conquistada.

Alguns raros dirigentes militares norte-americanos sabiam que eles poderiam dispor de uma nova arma: as duas bombas atômicas em construção no projeto Manhattan, para concluir a conquista do Japão.

A essa altura aconteciam os preparativos da Conferência de Potsdam, quando se deveria definir as condições de sobrevivência da Alemanha ocupada.

Stalin deveria manter a sua promessa estabelecida durante os acordos da Conferência de Yalta, segundo a qual a União Soviética deveria declarar guerra ao Japão. [Os norte-americanos seguros da sua vitória não gostariam que os soviéticos viessem a participar da ocupação do Japão. Todavia, Stalin estava interessado que a guerra com o Japão tivesse continuidade e que a sua participação fosse de tal modo importante que pudessem participar da ocupação do Japão.]

Truman e Churchill colocaram-se de acordo em informar muito discretamente a Stalin a existência da bomba, o que foi feito em 24 de julho de 1945, mas Truman não mencionou nem a palavra nuclear nem atômica. Stalin não prestou muita atenção.

Se por um lado, os norte-americanos, após os bombardeios maciços sobre algumas cidades japonesas, principalmente Tóquio, pressionavam o Japão a não prolongar inutilmente os combates e exigiam uma rendição incondicional, por outro lado, o sucesso da experiência atômica exigia uma decisão imediata, pois a sua utilização seria um dos meios de eliminar rapidamente as manobras russas e desse modo evitar uma penetração soviética na Ásia.

O conselho de cientistas, tendo como presidente Oppenheimer a mais três prêmios Nobel, dentre eles Fermi, foi constituída; eles são pela utilização da bomba contra o Japão. Com o objetivo de convencer o mundo do perigo que ela representava. Em oposição a esses, vários cientistas, liderados por Szilard, se mostravam claramente contra a utilização da bomba atômica contra o Japão. Apesar da bomba que havia sido programada para se defenderem da Alemanha esses cientistas não tinham pelo Japão um ódio comparável daquele que tinham pela Alemanha.

Mas a advertência dos cientistas teve pouco valor. Um dos homens que convenceu o presidente Truman a ordenar o bombardeamento atômico de Hiroshima foi o político J. Byrnes, um político racista oriundo da Carolina do Sul. Ainda em Potsdam, em 27 de julho, Truman aprovou e assinou a ordem de lançamento da bomba atômica sobre o Japão redigida pelo coronel L. Groves.

Com a aprovação de Churchill, que irá também assinar o pedido, Truman redige um comunicado solicitando a rendição incondicional dos japoneses e, informando que caso essas condições não forem aceitas, o governo norte-americano iria utilizar a bomba atômica. Em 26 de julho, este ultimato é enviado ao Japão: a rendição incondicional ou a exterminação. Em 28 de julho, os japoneses rejeitam o ultimato. Quatro cidades foram designadas: Hiroshima, cidade industrial, com bases militares e importante porto de onde saiam as frotas para o Pacífico; Kokura, principal arsenal; Nigata, porto, siderúrgicas e refinarias; e Kyoto, grande centro industrial. A partir desse momento, nenhuma delas foi bombardeada; era necessário que cada uma delas fossem o menos possível atingida, pois dessa maneira seria possível determinar a real capacidade de destruição da bomba, cujo poder destruidor não poderia ser questionado. (RRFM)

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