Ronaldo Rogério de Freitas Mourão
Foto: Nasa |
Chuva de meteoros causada pelo cometa Swift-Tuttle no Colorado, Estados Unidos, fotografada em 2000. |
Amanhã, entre três e cinco horas da madrugada, em direção ao nordeste, próximo ao horizonte, junto à constelação de Perseu, será possível – caso as condições atmosféricas forem favoráveis – contemplar a máxima intensidade de uma das mais belas chuvas de meteoros: as Perseidas.
Como a Lua nova ocorreu ontem, não haverá luar e, portanto, o fundo do céu estará mais escuro, fato que permitirá observar os meteoros de brilho mais tênue.
Essa chuva de meteoros está associada à poeira deixada em sua órbita pelo cometa Swift-Tuttle. Apesar de o cometa não estar muito próximo da Terra, ao atravessarmos o rastro de partículas que o cometa deixou em sua trajetória – o que ocorre todos os anos no mês de agosto – os pequenos fragmentos do cometa ao se chocarem com a atmosfera terrestre à velocidade de 200 quilômetros por hora causam um fenômeno luminoso popularmente conhecido como estrela cadente, um meteoro, fenômeno luminoso produzido pelo atrito desses fragmentos do rastro do cometa ao se chocar com as moléculas da atmosfera.
Em geral as partículas se desintegram, provocando uma chuva de estrelas cadentes. Como essas estrelas cadentes têm origem na constelação de Perseu, denomina-se essa chuva de Perseidas e aos meteoros de perseídeos.
O espetáculo deste ano deve ocorrer às 3h da madrugada de amanhã, ou seja, depois da meia-noite do domingo. Esses meteoros, na ordem de 60 a 100 por hora, são relativamente grandes, lentos e coloridos, constituindo uma das mais belas chuvas de meteoros.
Como a constelação de Perseu está situada mais ao norte, as observações no Brasil serão melhores no Norte e Nordeste. Para uma boa visualização dos fenômenos, convém procurar um local longe da poluição luminosa das grandes metrópoles.
Mais próximo do horizonte, abaixo da constelação de Perseu, encontram-se as Plêiades – o aglomerado estelar aberto que os índios brasileiros utilizavam para marcar o início do período das chuvas -, que faz parte da constelação do Touro, onde será possível também observar o planeta Marte, com a sua bela coloração avermelhada, que em dezembro deste ano estará mais próximo da Terra.
História
A história dos enxames das Perseidas é de quase dois mil anos. O primeiro espetáculo desse tipo foi registrado pelos observadores chineses em 17 de julho do ano 36. Outra ocorrência mais antiga, nos fins de julho do ano 714, foi amplamente documentada pelos chineses, japoneses e coreanos.
Na Europa, essa chuva de meteoros foi registrada pela primeira vez no ano de 811. Existem muitos registros dessa chuva em 830. A existência de Perseidas, como a maior chuva anual de meteoros, foi reconhecida, em 1835, pelo astrônomo belga Adolphe Quételet (1796-1874), em Bruxelas, pelo norte-americano E.C. Herrick, nos EUA, e por diversos outros observadores. Desde então tem sido observada anualmente.
Por muitos anos as Perseidas foram conhecidas tradicionalmente como as lágrimas de São Lourenço, por coincidir o dia de máxima atividade dessa chuva de meteoros com a provável data da morte de São Lourenço, em 10 de agosto de 258.
Entre 1864 e 1866, o astrônomo italiano Giovanni Schiaparelli (1835-1910), ao calcular a órbita das Perseidas, mostrou que ela é quase idêntica à do cometa periódico Swift-Tuttle. Foi a primeira prova matemática encontrada, que associava um enxame de meteoros a um cometa.
Ronaldo Rogério de Freitas Mourão é fundador e primeiro diretor do Museu de Astronomia e Ciências Afins. Escreveu mais de 85 livros, entre outros do Manual do Astrônomo. Consulte a homepage http://www.ronaldomourao.com.
Cometa leva nome de descobridores
O cometa Swift-Tuttle foi descoberto independentemente pelos astrônomos norte-americanos Lewis Swift (1820-1913) e Horace Tuttle (1829-1889). O primeiro observou-o no dia 15 de julho de 1862, em Marathon, EUA, e o segundo, três dias mais tarde, na cidade de Cambridge, EUA. Logo depois o cometa tornou-se visível a olho nu. Assim, na vizinhança do seu periélio, segunda quinzena de agosto, o brilho do cometa atingiu a segunda magnitude. No fim de agosto, o cometa esteve a 0,35UA da Terra, ou seja, 52,5 milhões de quilômetros, quando então sua coma possuía um diâmetro de meio grau e uma cauda de 25 graus. Aliás, convém registrar que desde o início do mês de agosto foi possível observar jatos de matéria nas proximidades de sua cabeça assim como flutuações periódicas de sua luminosidade, com período da ordem de três dias. Foi possível acompanhar a trajetória do cometa até o fim de outubro de 1862, o que permitiu o cálculo de uma órbita que evidenciou tratar-se de um cometa com período orbital de aproximadamente 120 anos.
Em 1982, após ter selecionado as 212 melhores observações individuais entre 440 efetuadas durante os três meses em que foi possível observá-lo, o astrônomo norte-americano Brian Marsden (1937-) recalculou uma nova órbita. Se considerarmos que as observações disponíveis desse cometa estavam compreendidas num intervalo de tempo equivalente a 0,05% do tempo necessário para o cometa percorrer toda a sua órbita, é muito fácil compreender a razão da grande imprecisão que envolvia a determinação dos seus elementos orbitais. Por outro lado, não foi possível encontrar nenhuma observação de aparição desse cometa anterior a 1862, o que poderia precisar com maior exatidão o seu período orbital. Aceitava-se um período de 120 anos, com um erro de dois anos. Desse modo, o último reaparecimento do cometa era muito incerto. Assim, várias datas para o seu retorno ao periélio foram consideradas: março a novembro de 1980; abril a junho de 1981 e finalmente, maio a dezembro de 1982. Foi redescoberto, em 26 de setembro de 1992, pelo astrônomo amador japonês Tsuruhiko Kiuchi de Usuda, Nagano, com binóculo de 25×150, como um objeto de magnitude 11,5 na constelação da Ursa Maior. Após essa redescoberta o astrônomo norte-americano Brian Marsden determinou o período de sua órbita ao redor do Sol em 135 anos. A massa desse cometa foi estimada em um milhão de vezes inferior à do nosso planeta. O interesse particular do cometa Swift-Tuttle é a sua associação com o enxame meteorítico das Perseidas, cujos meteoróides entram na atmosfera com a velocidade de 60km/s e produzem um grande número de meteoros brilhantes, alguns deles com rastros persistentes. Em geral, eles se desintegram na atmosfera, a uma altitude de 60 a 120km de altura. (RRFM)