Tecnologia biomolecular de ponta, estrutura operacional de primeiro mundo e pesquisadores altamente capacitados. Elementos que subsidiem a excelência em pesquisa não vão faltar aos recém-inaugurados Planta de Insumos para Diagnósticos em Saúde e Instituto Carlos Chagas (ICC) – unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Paraná.
A implementação de ambos, que funcionarão anexos à sede do Instituto Tecnológico do Paraná (Tecpar), pode significar um salto tanto na área de pesquisa como na produção de insumos para testes imunobiológicos.
Por exemplo, serão produzidos kits de diagnósticos que poderão detectar a presença de vírus no período de incubação (como o HIV), quando os exames convencionais não são capazes de identificá-los. Fator que pode promover uma evolução ao serviço de saúde prestado à população.
Inicialmente, a Planta de Insumos, que recebeu investimentos de cerca de R$ 15 milhões – recursos da Tecpar, da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), da Fiocruz, da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) e do Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP) – deverá produzir kits NAT (testes de ácido nucléico) de diagnóstico de HIV e Hepatite C. A nova tecnologia será empregada na triagem das bolsas de doação de sangue, trazendo mais segurança para as transfusões.
O diferencial dos kits de insumos produzidos pela planta é justamente a redução da janela imunológica – período em que já ocorreu a infecção, mas ainda não há a possibilidade da detecção do vírus no exame de sangue.
Isso é possível porque o NAT detecta o material genético dos vírus, enquanto o teste tradicional depende do surgimento de anticorpos. O fato de os insumos serem produzidos no Paraná, segundo o diretor-presidente do Tecpar, Aldair Rizzi, significa uma redução substancial no custo dos exames realizados por estabelecimentos do Serviço Único de Saúde (SUS).
De acordo com Rizzi, o País deve economizar cerca de R$ 200 milhões anuais com a produção dos kits. “Esses testes não eram realizados porque não tínhamos tecnologia para isso. Era necessário importar os materiais para fazer os exames”, conta.
Rizzi diz que, com a implantação da planta, o Paraná sai na frente na questão da fronteira tecnológica da saúde humana e contribui para o equilíbrio da balança comercial do País, já que há um déficit de aproximadamente US$ 7 bilhões por ano com a importação de insumos biológicos. “Isso reduz o domínio do mercado de medicamentos e insumos de empresas internacionais.”
Rizzi ressalta que, atualmente, o número de pessoas infectadas pela aids chega a 600 mil, enquanto que o número de infectados pelo vírus da Hepatite C alcança três milhões no Brasil.
“O sistema de saúde ganha porque faríamos o diagnóstico mais barato, com muito mais rapidez em relação ao teste tradicional. O objetivo é subsidiar até cinco milhões de testes por ano”, adianta. Futuramente, os testes serão estendidos a outras doenças.
Multiteste
“O sistema de saúde ganha porque faremos o diagnóstico mais barato, com muito mais rapidez em relação ao teste tradicional. O objetivo é subsidiar até cinco milhões de testes por ano.”Aldair Rizzi, diretor-presidente do Tecpar. |
Outros produtos, que já estão em análise, poderão ser produzidos pela Planta de Insumos para Diagnósticos e,m Saúde, com destaque para o multiteste, que é capaz de verificar, ao mesmo tempo, até cem doenças em até cem indivíduos, tendo o resultado pronto em cerca de 30 minutos.
Inicialmente, o multiteste se concentrará no diagnóstico de HIV 1/2, HTLV I/II (que causam uma das espécies de leucemia), sífilis, doença de Chagas e hepatite B – doenças que podem ser transmitidas pelo sangue. Além disso, também estão sendo realizados estudos para detectar novos alvos potenciais para drogas contra a doença de Chagas.
A nova unidade da Fiocruz e a Planta de Insumos foram inauguradas no início do mês com a presença do presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha; do ministro da Saúde, José Gomes Temporão; do governador do Paraná, Roberto Requião; e do presidente da Hemobrás, João Baccara.
Na ocasião foi assinado o acordo de cooperação técnico-científica entre os órgãos, o que possibilitará abranger áreas como biociências e biotecnologia em saúde no Estado e abrir cursos de pós-graduação em tecnologia específica. Até o final de 2009, o Tecpar investirá R$ 14 milhões em reestruturação tecnológica para diversificar e aprimorar a produção de vacinas e antígenos.
Parceria que agrega experiência e renome
Ao firmar acordo de cooperação técnica com o Tecpar, a Fiocruz delega ao Instituto Carlos Chagas as atividades de pesquisa básica, pesquisa aplicada e ensino, que, até então, eram desenvolvidas pelo IBMP desde 2001. O diretor de gestão da Planta do IBMP ressalta que a parceria agrega ao Instituto Carlos Chagas o know how de pesquisadores renomados.
“As atividades ganham agora corpo institucional, além da perspectiva de ampliar o corpo de pesquisadores e maior estabilidade orçamentária”, afirma Mário Santos Moreira.
Segundo ele, a Fiocruz passou a trabalhar internamente, em 2007, um processo de nacionalização de suas atividades. “Como no Paraná já havia uma experiência positiva com pesquisadores importantes da Fiocruz, com pesquisa científica acadêmica com atuação na área de biotecnologia bastante produtiva, decidiu-se que o IBMP seria uma das primeiras novas unidades da Fiocruz no País”, diz.
Atualmente a fundação conta com representações em Minas Gerais, Pernambuco, Bahia e Amazonas, todas criadas na década de 70, além da sede do Rio. Moreira conta que o projeto de expansão da Fiocruz ganhou força depois que o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, anunciou, no PAC da saúde, que esse processo seria um projeto do próprio ministério.
Segundo ele, com a Fiocruz, além das linhas de pesquisas que não têm uma matize geográfica, o Instituto Carlos Chagas assume também uma preocupação maior em desenvolver pesquisa com termos relacionados às condições sanitárias do Paraná.
Moreira relata também que serão criados, a partir de março, um curso de mestrado e outro de doutorado na área de biociência, além de implementado um intercâmbio científico e tecnológico com universidades do Estado.
Segundo o diretor-presidente do Tecpar, Aldair Rizzi, a vinda da Fiocruz para o Paraná só foi possível graças à existência de planejamento e investimento permanentes, além da possibilidade de ganhos que a instituição teria em parceria com o Tecpar.
“Isso é um salto de qualidade, pensando em perspectiva de futuro na área de biotecnologia, área que o Paraná e o Tecpar passarão a se tornar referências”, afirma.
Gripe A será um dos enfoques da nova planta
De acordo com o vice-diretor de Desenvolvimento Institucional da Fiocruz e diretor de gestão da Planta do IBMP, Mário Santos Moreira, as pesquisas e o projeto de produção dos insumos propiciaram viabilidade técnica e financeira para que a Planta de Insumos saísse do papel.
Com isso, a expectativa, segundo Moreira, é que a estrutura seja utilizada para produzir outros produtos destinados à contenção da proliferação das demais enfermidades que possam atingir a população, como é o caso de vacinas e medicamentos para os casos de Gripe A.
Moreira, lembra que, dentre as principais críticas direcionadas aos órgãos ligados ao Ministério da Saúde em relação à epidemia de Gripe A, estão as eventuais faltas de reagentes para realização dos testes de diagnósticos, de medicamentos e de vacina.
Contudo, ele ressalta que, mesmo assim, o Brasil está à frente da maioria dos países, não só da América Latina, mas também da Europa, já que o País vai produzir os três itens fundamentais para a contenção da epidemia.
“O fato é que estamos nos preparando para produzir o antirretroviral no Rio de Janeiro e essa planta, a partir do mês que vem, começa a produzir o kit para o diagnóstico da gripe. Isso só será possível porque aprendemos com outros produtos”, conta.
Moreira elogia a política de pesquisa brasileira. “É o Estado usando seu poder de compra para fomentar o mercado nacional. Se essa iniciativa não fosse tomada por entes públicos, ainda estaríamos à mercê de fornecimento internacional dos insumos”, diz.