Uma descoberta da Universidade de São Paulo (USP) começou a criar um caminho para entender a ocorrência do autismo, um conjunto de manifestações que causam alterações nos relacionamentos interpessoais, comunicação e no comportamento.

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Os pesquisadores identificaram um dos genes associados a um dos modelos de autismo, uma síndrome muito heterogênea. Pode parecer pouco diante do enigma que ainda cerca o autismo.

Mas abrem-se as portas para um maior conhecimento na influência genética para a sua ocorrência. As causas ainda não estão plenamente esclarecidas, mas é consenso entre os cientistas que há um forte peso genético nisto.

A pesquisadora Maria Rita Passos Bueno, professora do Laboratório de Genética de Desenvolvimento Humano da USP, explica que o gene identificado está associado a um modelo de autismo causado por pequenas alterações em vários genes, aumentando a pré-disposição para o autismo.

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“Achamos uma destas pequenas alterações. É um início de um grande processo que está sendo desenvolvido. Para nós, é um resultado animador e positivo”, esclarece. A descoberta foi publicada no início deste ano pela revista científica Brain Research.

Segundo Bueno, os objetivos da pesquisa são identificar genes importantes para o aparecimento do autismo e, com isso, passar a ter uma ferramenta para o diagnóstico, que atualmente não existe.

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“Hoje, o diagnóstico é apenas clínico”, afirma. A pesquisadora assegura que, conhecendo melhor o que leva ao autismo, é possível também realizar um tratamento mais apurado e direcionado.

Além da sequência desta pesquisa, Bueno está fazendo o estudo de células-tronco de pacientes autistas. Quando as crianças diagnosticadas perdem o dente de leite, este é fornecido para a pesquisa.

A partir daí, realiza-se a transformação da célula-tronco presente no dente em neurônios. “Assim podemos verificar se há algum problema funcional. Outro benefício é estudar o efeito de medicamentos em testes laboratoriais”, conta.

O assunto é complicado e os pesquisadores ainda precisam lidar com a dificuldade de ter acesso aos pacientes. Bueno comenta que a pesquisa também necessita de mais recursos e pessoal. “Dependemos de publicações e, com esta primeira publicação, podemos conseguir um pouco do que precisamos”, relata.

Sinais aparecem nos primeiros anos de vida

Luciene: “A mãe é quem percebe que existe alguma coisa diferente”.

Os sinais do autismo aparecem ainda nos primeiros anos de vida. Pais precisam estar atentos ao comportamento do filho e procurar ajuda quando notar que algo está diferente. Quanto mais cedo começar o tratamento, melhor será a vida do autista.

“Quando se detecta cedo, não desenvolve o autismo de forma grave. Quanto mais deixar para frente, pior. Na maioria da vezes, a mãe é quem percebe que existe alguma coisa diferente. Mas nem toda família quer enxergar”, comenta Luciene de Oliveira Vianna, do Centro Conviver, especializado no atendimento de autistas em Curitiba. Ela tem um irmão autista e, por causa dele, começou a trabalhar nesta área.

Vianna explica que os autistas têm problemas de relacionamento. Não buscam a interação com outras pessoas. Também apresentam problemas no comportamento, como a repetição de falas ou situações. A comunicação também é dificultada. Alguns não desenvolvem a fala.

“Muita gente tem a imagem do autista como um ser isolado, que vive em seu próprio mundo. Não é isso. Ele não se isola porque quer. É porque ele não consegue ultrapassar essa barreira,”, frisa. Depois das desconfianças, o problema é encontrar ajuda especializada. Chega ser comum levar a criança em vários médicos diferentes até encontrar a identificação.

Comportamentos

Essa dificuldade aconteceu com Simone Zelner e Rose Mendes Túlio, mães de crianças autistas que estão recebendo tratamento no Centro Conviver. As duas começaram a perceber diferenças nos comportamentos dos filhos em virtude da comparação com outras crianças da mesma idade. Zelner já desconfiava que poderia ser autismo e levou o filho em vários médicos.

“Ele fez todos os exames possíveis e imaginários. Você praticamente vira seu filho do avesso e não aparece nada. Eu questionava sempre com os médicos. Teve um que chegou a dizer que era eu quem precisava ser tratada”, comenta.

Rose Mendes Túlio assegura que perdeu a conta de quantos médicos ela consultou para verificar o que acontecia com o filho. “Até que encontrei uma neurologista que falou que poderia ser autismo”, diz.

Para Thiele Roth, também mãe de autista, as informações encontradas na internet ajudaram a entender um pouco mais sobre o autismo. No entanto, ela aconselha filtrar bem os dados. O que é exceção ou casos extremos pode parecer comum.

“Teve uma época que eu não queria ler mais nada”, lembra. Quando o filho foi diagnosticado, ela escondeu por algum tempo da família. E, quando contou, já expressou os pontos mais positivos, para evitar um rótulo.

As três mães estão muito esperançosas quanto ao tratamento dos filhos, pela abertura de um mundo de possibilidades. Cada conquista, como uma palavra aprendida pelo filho, traz uma alegria imensa.