São Paulo (AE) – Nos últimos cinco anos, desde a publicação dos primeiros rascunhos de seqüenciamento do genoma humano, cientistas se surpreenderam ao descobrir que o número de genes no DNA do homem é o mesmo de um rato: cerca de 25 mil. Ficou claro que o que faz do Homo sapiens a espécie mais evoluída do planeta não é apenas o tamanho do seu genoma ou o número de genes, mas a maneira como esses genes funcionam e interagem entre si. Um conceito que, agora, começa a tomar forma também no cérebro humano.
De acordo com um estudo publicado por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o benefício de ter um cérebro maior – uma das grandes vantagens evolutivas do ser humano em relação a outros primatas – não está apenas na quantidade de massa cinzenta ou no número de neurônios. Pode estar, sim, relacionado à maneira como esses neurônios estão distribuídos no cérebro e como eles interagem entre si para formar uma rede neuronal de altíssima complexidade.
A pesquisa comparou a quantidade e distribuição dos neurônios no cérebro de seis espécies de roedores: camundongo, hamster, rato, porquinho-da-índia, cutia e capivara – em escala crescente de tamanho. Os resultados mostraram que há, de fato, um aumento no número de neurônios conforme o tamanho do cérebro. Surpreendentemente, porém, a maior parte desses neurônios adicionais está concentrada no cerebelo (uma estrutura freqüentemente ignorada nos estudos cerebrais) e não espalhada pelo córtex (a camada superior do cérebro), como seria de se esperar. ?É uma indicação de que, talvez, estejamos olhando para o lugar errado, sobreestimando a importância do córtex por causa de seu volume?, diz a pesquisadora Suzana Herculano-Houzel, autora principal do estudo. ?Se o que importa é o número de neurônios, o que mais se destaca no cérebro é o cerebelo?.
Enquanto a proporção de neurônios no córtex permaneceu constante para as seis espécies (18%, em média, independentemente do tamanho do cérebro), a parcela de neurônios localizados no cerebelo em relação ao total do cérebro aumentou de 59%, no camundongo, para 75%, na capivara. ?O que cresce em poder computacional é o cerebelo?, diz o neurocientista Roberto Lent, que também assina o trabalho na revista ?PNAS?. ?Isso é uma surpresa completa, pois a superioridade do córtex na ciência é praticamente absoluta?. Até recentemente, segundo ele, o cerebelo era visto apenas como um órgão de controle motor – um erro que ele mesmo cometeu em seu livro, Cem Bilhões de Neurônios, publicado em 2002. ?Temos de reavaliar nossos conceitos?, afirma Lent.