José Domingos Fontana

continua após a publicidade

A revista Ciência e Cultura, editada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), contemplou em seu volume de julho-agosto-setembro (Ano 57, n.º 3) a Física como núcleo temático. Vale então a pena resgatar algumas passagens ali abordadas nas quais a menção de Einstein é quase uma constante como o mago bivalente do tempo e do espaço.

Pintores impressionistas do final do século XIX se renderam ao chamamento da 4.ª dimensão (além das três devotadas aos planos do espaço), o tempo. Claude Monet usava pintar vários quadros nos quais fixava o motivo, mas alterava o instante de criação da obra. Por ora, montes de feno em função das estações do ano. Noutra obra, a fachada da Catedral de Rouen em diferentes horas do dia. Estava assim incorporada a temporalidade à pintura, ou seja, imagens que existiam simultaneamente no tempo e espaço. Paul Cézane, com a Natureza morta com cestas de frutas, violando a noção de perspectiva e flutuando objetos, os fazia serem afetados pelo espaço que os continha, enfatizando a interação. Já no início do século XX, Pablo Picasso, através do cubismo, incorporou completamente o tempo à espacialidade. Sua Les Demoiselles d?Avignon traz uma mulher agachada que oferece a simultaneidade das imagens de frente e de costas. Esta revolução das técnicas da pintura, nos dizeres dos professores J. C. Reis, A . Guerra e M. Braga (RJ) mostram que Física e Arte têm mais coisas a dizer uma à outra do que se pode imaginar.

Comemora-se em 2005 tanto o Ano Internacional da Física quanto o do Esporte e da Educação Física. Um adulto, nada mais que para repor a energia que perde na forma de irradiação para o meio ambiente, carece de cerca de 1.650 calorias/dia. Um atleta bem preparado pode dispor de 802 Watts (1,09) HP durante 1 minuto (e.g., corrida de 100 metros rasos) ou de 1.375 Watts (1,87 HP) durante 10 segundos (e.g., instantes iniciais do 1.º round de uma luta de boxe). Maior a potência despendida, menor o tempo de sustentação da mesma. O máximo que um atleta de 70 kg poderia despender seria 3,9 HP durante o tempo restrito de um segundo; é que o poderia acontecer, por exemplo, no treino da largada de uma corrida de 100m. Neste particular, cabe o comparativo predador e presa. A chita atinge velocidade máxima (temporária) de 30,5 metros/segundo (110 km/h) enquanto a presa fica um pouco aquém em 28m/s 101 Km/h). Uma saída salvadora é então o drible lateral ! Frente a estes números, o homem fica em apenas 12,5 m/s (45 km/h) sem a desculpa de ser bípede pois a avestruz também o é e alcança os notáveis 23/s (83 Km/h). (Lembrar de comparar o volume e massa das pernas dos dois modelos biológicos!). Na água o homem-campeão, por conta da resistência do meio, reduz seu desempenho máximo (provas de 50m) a 2,3 m/s ou seja, pouco mais do que o dobro da velocidade no andar de um adulto. Em 1925 o recorde para os 100m rasos foi de 10,37s; o atual é de 9,84. Uma conquista de meio segundo em 80 anos! O corpo humano se aprimora, mas os limites das leis físicas são imutáveis, de acordo com M. A . F. Gomes (UFPE, PE).

Um estudo do Instituto de Física (IoP) inglês do ano 2000 atesta que no mesmo ano 43% dos empregos em manufatura no Reino Unido se centravam em indústrias baseadas em Física e que, durante a década anterior, 52 mil novas indústrias haviam se instalado neste ramo. No Canadá, levantamento pelo Comitê de Física do Conselho Nacional de Pesquisa em Engenharia e Ciência (NSERC) indicou que, por conta de financiamentos dirigidos pelo conselho, da inserção de recursos humanos formados em Física e dos absorvidos pelas empresas privadas e ainda do próprio desempenho empresarial, as empresas consolidadas (spin-off), para um investimento de US$ 35 milhões, geraram um faturamento de US$ 109 milhões. No Brasil, o exemplo mais bem consolidado como desdobramento de pesquisas em Física é aquele de comunicações baseadas em fibras óticas da Universidade de Campinas em parceria com um centro de pesquisas (CPqD-Telebrás) e uma empresa (ABCXTal) absorvedora tanto dos recursos humanos formados pela Unicamp quanto dos conhecimentos desenvolvidos, processo tripartite iniciado já em 1983, ou seja, pouco mais de uma década após a descoberta da fibra ótica com baixa perda de luz ou duas décadas após descoberta similar de aplicação do laser. A Xtal foi recentemente adquirida pela Fiber Core norte-americana e segue, no Brasil, como a maior produtora de fibras óticas : 1,1 milhão de quilômetros/ano, sendo 20% destinados à exportação. No cenário nacional, segundo C. H. B. Cruz, ex-reitor da Unicamp, no período de 1982 a 2002 se estruturaram 22 empresas de porte, 12 em Campinas, oito em São Carlos (também em São Paulo) e dois no Recife.

continua após a publicidade

Um curitibano dos mais ilustres deu seu adeus em 8 de março deste ano: César Lattes. Logo aos 23 anos (após uma formatura precoce na USP) comprovou a existência do méson-pi, micropartícula que mantém coeso o núcleo atômico e ajudou a desenvolver as emulsões fotográficas especiais para o registro da trajetória do méson. O prêmio Nobel de Física de 1950 foi para o inglês Cecil Powell. Os co-descobridores da partícula, Lattes e Occhialini, não o compartiram. Lattes era (felizmente) um gênio irreverente. De acordo com a G. Barata e F. Natércia, caminhar descalço pela Unicamp ou levar seu cão de estimação a uma defesa de tese eram alguns de seus hábitos bizarros.

Notável a presença da Física em nossos dias. Ontem, hoje e sempre. Dos  galardonados pelo Prêmio Nobel de Física deste ano em função das descobertas sobre a luz (óptica quântica), o decano, Roy Glauber, tem 80 anos.

continua após a publicidade

José Domingos Fontana (jfontana@ufpr.br) é professor emérito da UFPR, pesquisador 1.ª do CNPq e 11.º Prêmio Paranaense em C&T.