Foto: Ciciro Back/O Estado

 Jon Hall: "País peca por não utilizar tecnologias próprias".

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No Brasil, as desigualdades digitais fazem paralelo com as sociais. Na última semana, o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), órgão responsável por administrar a rede no País, divulgou um estudo sobre o uso de tecnologias da informação e da comunicação, onde os números mostram paradoxos difíceis de serem conciliados. Enquanto 55% dos brasileiros jamais utilizaram um computador e 68% da população nunca acessou a internet, a minoria conectada bate recordes mundiais em horas navegadas na rede de computadores. ?A renda e a educação da população brasileira são os dois principais determinantes para os índices de acesso à internet?, afirma Rogério Santanna dos Santos, conselheiro titular do CGI.br e coordenador do projeto na entidade.

Segundo o CGI.br, a metodologia utilizada seguiu o padrão internacional da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e do Instituto de Estatísticas da Comissão Européia (Eurostat), permitindo comparação internacional. A margem de erro é de 1,5%. Para formar um banco de dados abrangente sobre a realidade da internet no País, o CGI.br se uniu ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ao Instituto Ipsos-Opinion e ao Ibope/NetRatings, que mediu a utilização da rede no Brasil entre agosto e setembro de 2005, em 8.540 domicílios.

Segundo Santos, o acesso cresce à medida que aumenta o nível educacional e a média de renda da população. Os representantes da classe A têm 46 vezes mais chances de ter um computador em casa do que os das classes D e E. Já entre quem usa a internet, essa mesma proporção cai para 20 vezes. ?O uso da internet não depende exclusivamente da posse do computador. Como grande parte dos internautas é jovem, o acesso ocorre também em escolas e telecentros?, explica Clifford Young, diretor-geral da Ipsos Opinion.

Outro fator que explica a exclusão digital é a geografia dos grandes centros urbanos. ?Entre dois indivíduos igualmente pobres, o que mora na periferia tem três vezes menos chances de ter acesso a um computador do que quem mora próximo a um bairro nobre?, acrescenta. Apenas 16,6% possui um computador em casa.

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O levantamento também mostrou que 24% dos entrevistados conectados acessaram a internet nos últimos três meses, sendo que 9,6% costumam navegar diariamente. Quanto ao uso da rede, 41% o fazem para atividades educacionais, 32% para fins pessoais e 26% no trabalho. Brasília é a cidade com o maior número de pessoas conectadas, seguida de São Paulo, Curitiba e Rio de Janeiro.

Entre as principais atividades realizadas na internet por aqueles que utilizaram a rede nos últimos três meses destacam-se o uso do e-mail (17,21%), a realização de atividades escolares (11,48%), a procura de informações sobre bens e serviços (8,94%) e o envio de mensagens instantâneas (8,48%).

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Quanto à realização de compras pela internet, a pesquisa mostra que 20% das pessoas que utilizaram a rede nos últimos 12 meses compraram algum produto ou serviço. Entre os produtos mais comprados estão: filmes e música (17,9%), equipamentos eletrônicos (14,4%) e livros, revistas ou jornais entregues digitalmente (14,1%).

Os resultados de acesso domiciliar para a utilização de serviços de governo eletrônico também foram apresentados. Dos internautas, 12,68% usaram algum desses serviços nos últimos 12 meses, como consulta ao CPF (6%), declaração do imposto de renda (5%), informações sobre serviços públicos de educação (3%), inscrições em concursos públicos (3%), informações sobre empregos (2%) e pagamentos de IPVA, multas e licenciamento (2%).

Os maiores navegadores do mundo

Os brasileiros com acesso à internet são os maiores navegadores do mundo, tendo permanecido em média 18 horas e 42 minutos ligados à rede em outubro. Esse dado, no mínimo curioso. foi outro destaque na apresentação feita pelo CGI.br. O recorde anterior também era brasileiro. Em junho, a média havia chegado a 18 horas e 28 minutos, superando os tempos apresentados por países como Estados Unidos e Japão. Os dados são de pesquisa feita pelo Ibope/NetRatings.

A parceria com o IBGE prevê a inclusão de um módulo com 23 questões básicas sobre penetração e uso da internet na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) 2005, incluindo indicadores sobre local de acesso à internet, freqüência de uso, tipo de serviços e atividades realizadas. Serão pesquisados 140 mil domicílios ainda este ano. Segundo o CGI.br, os resultados estarão disponíveis em outubro de 2006. ?Nosso objetivo é produzir e divulgar indicadores que auxiliem o governo na elaboração de políticas públicas que garantam o acesso às tecnologias da informação e comunicação no País?, afirma Rogério Santanna, conselheiro do CGI.br.

Cerca de 60% dos entrevistados acessaram a rede por meio de computador pessoal, 2% através de laptops e 21% tiveram acesso à internet com a ajuda do telefone celular. ?Ficamos surpresos com o total de pessoas conectadas por meio do aparelho celular. Isso demonstra que o celular caiu mesmo nas graças do brasileiro, que está se adaptando bem a todas as possibilidades disponíveis?, diz Santanna. (DD)

Inclusão não beneficia classes D e E

Os dados domiciliares levantados pelo estudo CGIbr/Ipsos, segundo os seus coordenadores, também evidenciam o caminho que as políticas públicas de inclusão digital do governo Lula estão tomando. Quando perguntados sobre a intenção e disponibilidade financeira para comprar um computador, somente os entrevistados das classes B e C têm interesse e dinheiro suficiente para serem beneficiados pelo programa PC Conectado, por exemplo, que através de incentivos e parcerias com fabricantes de computadores oferecerá PCs populares por R$ 1,4 mil, com facilidades para o pagamento.

?Com a pesquisa, percebemos que as classes D e E não são sensíveis aos programas de inclusão digital que visam baixar os preços dos computadores?, explica Clifford Young, diretor-geral da Ipsos Opinion. ?Para essas pessoas, principalmente os jovens dessas classes sociais, a inclusão somente acontecerá se o governo atuar em outra frente, intensificando o acesso à internet nas escolas e em telecentros?, conclui.

Para o presidente da Linux International, Jon ?Maddog? Hall, que se dedica a promover a utilização do software livre no mundo, o País peca por não utilizar tecnologias próprias, o que atrasaria a popularização da informática. ?O Brasil envia cerca de U$ 1 bilhão por ano para empresas de software nos EUA. Esse montante seria suficiente para criar tecnologia própria, empregos e conseqüentemente popularização da internet e da informática no País?, afirma. (DD)