O que faz um homem ser diferente de um chimpanzé ou uma mosca ser diferente de um rato? A busca por uma resposta, aparentemente óbvia do ponto de vista morfológico, é um dos principais desafios da pesquisa genômica atual. Homem e chimpanzé têm praticamente o mesmo número de genes e são quase 100% idênticos geneticamente. Como, então, podem ser tão diferentes? Um estudo publicado na última edição da revista Genome Research, nos Estados Unidos, reforça a idéia de que a complexidade biológica não está apenas no número de genes, mas na maneira como cada organismo é capaz de regular o funcionamento do seu genoma.

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Com um detalhe importante: essas unidades reguladoras não fazem parte dos genes, mas estão embutidas no chamado "DNA lixo" – a parte do genoma que não codifica proteínas. Os cientistas compararam os genomas de vários organismos de quatro grandes grupos: vertebrados, insetos, vermes e leveduras (fungos). O objetivo era procurar por seqüências semelhantes – ou seja, conservadas – entre as espécies de cada grupo. A conclusão é de que, nos organismos mais complexos, há mais seqüências conservadas nas regiões que não codificam proteínas do que nos próprios genes.

Algo que, segundo os cientistas, confirma a importância dessas regiões não codificadoras para a regulagem da expressão gênica. De fato, quanto mais complexo o organismo, maior a proporção de elementos conservados no DNA lixo. Entre os vertebrados, por exemplo, 82% das regiões conservadas não correspondem a genes. "Isso sugere que, nos vertebrados, e também nos insetos, a maior parte do DNA que consideramos funcional não está codificando proteínas", disse o autor principal da pesquisa, Adam Siepel, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz.

O conceito básico por trás disso é que as seqüências de DNA que são semelhantes entre várias espécies foram conservadas ao longo de milhões de anos de evolução. E, portanto, devem ter alguma função importante. A presença de elementos conservados dentro do DNA lixo mostra que eles, apesar de não codificar proteínas, também exercem papel fundamental dentro do genoma. Muitos, segundo os cientistas, correspondem a seqüências reguladoras, que controlam a maneira como os genes são expressos – se eles estão desligados ou ligados, por exemplo, ou se estão ligados com força total ou apenas meia força.

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Organismos mais complexos possuem um maquinário de controle mais elaborado e, portanto, conseguem expressar seus genes de maneira mais complexa – mesmo que tenham um número semelhante ou menor de genes comparado a outros organismos. "É como ensinar genes velhos a fazer novos truques", diz o pesquisador brasileiro Marcelo Nóbrega, do Lawrence Berkeley National Laboratory, que foi um dos revisores do estudo.

"Uma das grandes questões da biologia é explicar quais são os truques que a natureza usa para que pequenas modificações no código genético produzam diferenças tão grandes entre espécies", diz Nóbrega. Se o número de genes fosse o único fator determinante, a raça humana certamente sucumbiria ao poder genético do milho, que possui duas vezes mais genes do que o homem (50 mil). "Está claro que não basta só ter os genes, é preciso saber usá-los. Se você me der cimento, tijolo, concreto e água eu posso construir uma casa ou uma garagem, um edifício ou um viaduto. Tudo depende das instruções que eu vou receber para lidar com aquele material."

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Os cientistas ainda não sabem exatamente como esses elementos reguladores funcionam. Eles podem atuar diretamente sobre os genes ou sobre o RNA mensageiro codificado por ele, impedindo que a mensagem chegue à fábrica de proteínas da célula (o ribossomo).