Ronaldo Rogério de Freitas Mourão
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O continuum espaço-tempo compreende quatro dimensões: três para o espaço e uma para o tempo. |
A noção de continuum espaço-tempo foi introduzida pelo matemático alemão Minkowski em 1908, há quase 100 anos, numa exposição matemática concernente à geometria do espaço e do tempo, tal como havia sido definida pela Teoria da Relatividade Restrita de Albert Einstein, em 1905, no artigo consagrado às leis fundamentais do eletromagnetismo: Sobre a eletrodinâmica nos corpos em desenvolvimento.
O continuum espaço-tempo compreende quatro dimensões: três para o espaço e uma para o tempo. Um evento se posiciona no tempo e no espaço pela coordenadas ct, x, y, z. que dependem todas do seu referencial. É muito difícil imaginar que o tempo não esteja simultaneamente associado ao referencial no qual foi determinado. No entanto, esse fato foi confirmado experimentalmente, em particular nos aceleradores de partículas. Na realidade, o tempo depende do referencial no qual foi medido, não sendo, portanto, absoluto. O mesmo vale para o espaço: o comprimento de um objeto pode ser diferente segundo o referencial usado na sua determinação.
Continuum é um conjunto de elementos que podem passar de um a outro sistema de maneira contínua. Essa noção é utilizada em física, lingüística, arte, jogos, etc.
Cone de luz
Superfície no espaço-tempo que delimita a direção possível dos feixes de luz que passam por um determinado evento.
Em física, cone de luz é o conceito que descreve a evolução temporal de um clarão de luz no espaço-tempo de Minkowsk. Sua origem está associada à relação passado e futuro. É um conceito que permite criar uma distinção entre um evento passado e outro futuro. Ele pode ser visualizado no espaço tridimensional, se os dois eixos horizontais tiverem sido escolhidos para representar as dimensões espaciais e o eixo vertical for o tempo.
Para Isaac Newton, o tempo, além de constituir um conceito diferente do espaço, era considerado uma linha única, sem começo e nem fim, ou seja, infinito em ambas direções. O tempo era considerado eterno no sentido que sempre existiu e que existirá para sempre. Ao contrário, a maioria das pessoas acreditava – algumas acreditam até hoje – que o universo físico tinha sido criado mais ou menos no estado em que viviam.
Tal conceituação preocupou diversos filósofos, dentre eles o alemão Emmanuel Kant, que questionou: se o universo tivesse sido criado, qual seria a razão para que tenha se esperado uma um tempo infinito antes da criação? Por outro lado, se o universo tivesse sempre existido, por que tudo ia acontecer mais tarde se já tinha acontecido?
Essas questões deram origem ao chamado paradoxo da ?antinomia da razão pura? por sugerir uma contradição lógica que não tinha solução. No entanto, essa contradição existia somente no modelo matemático newtoniano, no qual o tempo era uma linha infinita, independente do que estivesse ocorrendo no universo. Com a introdução de um modelo matemático totalmente novo – a teoria da relatividade geral – proposto por Einstein em 1915, a questão assumiu uma nova problemática.
Na realidade, a relatividade geral associava a dimensão temporal com as três dimensões do espaço para formar o que se chama espaço-tempo. Por outro lado, com a teoria de Einstein incorporava-se o efeito da gravidade como uma conseqüência da distorção do espaço-tempo pela presença da matéria no universo, fazendo com que o universo não fosse plano, mas curvo. Ora, nesse espaço-tempo, quando um objeto se desloca em linha reta, sua trajetória é encurvada em virtude de ser curvo o espaço-tempo no qual se deslocavam.
Na teoria da relatividade -confirmada por um grande número de experimentos – o espaço e o tempo estão intimamente associados entre si. É impossível curvar o espaço sem o tempo sofra os seus efeitos. Deste modo, o tempo assumia a sua forma, ou seja, curvo como espaço. Ao encurvar o espaço-tempo, a relatividade geral transformou-os num cenário passivo em relação ao qual ocorrem os eventos. Na teoria newtoniana – o tempo existia independentemente do espaço – o que fazia Deus antes da criação do universo? Não vamos adotar aqui a resposta de Santo Agostinho, que teria dito que nesse momento Ele preparava o inferno para quem fizesse essa questão ou que antes de criar o céu e a terra Deus não havia criado absolutamente nada.
Como na Teoria Geral da Relatividade o tempo-espaço não existe independentemente do universo, é totalmente inconcebível que o tempo assim definido no universo tenha um valor mínimo ou máximo, ou, em outras palavras, um início ou um fim. Desse modo, não teria sentido questionar sobre o que aconteceu antes, no início ou depois do fim. No entanto, o modelo matemático da relatividade geral previa que o universo deveria ter um início e um fim. Einstein sustentava que o tempo deveria ser infinito em ambas direções. A aceitação dessa idéia provocaria questões que estariam fora do domínio da ciência.
Na relatividade geral, o espaço-tempo é encurvado não somente em virtude da presença da massa dos objetos, mas também pela energia; quando positiva, ela provoca no espaço-tempo uma curvatura que desvia o percurso dos feixes de luz em direção uns dos outros.
Consideremos o cone de luz do passado, ou seja, o deslocamento do espaço-tempo nos feixes de luz nas galáxias distantes que nos alcança no momento presente. Em um diagrama com a flecha do tempo orientada para cima e as coordenadas espaciais traçadas para os lados, num plano que intersecta o vértice do cone, tem-se um cone com seus vértices ou pontas em nós.
À medida que recuamos no passado, descendo no cone de luz a partir do vértice, iremos contemplar galáxias de uma época cada vez mais remota ou mais recuada no tempo. Como o universo está se expandindo, no passado todas elas deveriam estar muito próximas entre si; quando então a densidade de matéria seria maior. Podemos concluir que o nosso cone de luz no passado precisava ter uma certa quantidade de matéria quando alguém recua em seu interior; a quantidade de matéria é suficiente para causar no espaço-tempo a curvatura dos os feixes de luz em nosso cone de luz.
À medida que se retrocede no tempo, os corpos transversais do nosso cone de luz no passado alcançam o espaço máximo para diminuir novamente. Em conseqüência, o cone de luz no passado apresenta-se em forma de pêra. Assim, quando observamos as galáxias distantes, olhamos o universo em uma época anterior, em virtude de a luz deslocar-se com uma velocidade finita. Se representarmos o tempo por uma coordenada vertical e duas das três dimensões espaciais horizontalmente, a luz que agora nos atinge no ponto superior deslocou-se até nós em um cone de luz.
Nota
Esse artigo é o resumo da palestra de abertura do Simpósio Memória do Futuro, no Itaú Cultural, São Paulo, em 4 de julho de 2007.
Ronaldo Rogério de Freitas Mourão é fundador e primeiro diretor do Museu de Astronomia e Ciências Afins. Escreveu mais de 85 livros, entre outros, Explicando a Teoria da Relatividade. Consulte a homepage: http://www.ronaldomourao.com
