O Decreto n.º 6.170, que dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios com órgãos ou entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos, foi alvo de duras críticas esta semana.
O tema foi discutido durante o XXVI Encontro Nacional do Conselho Nacional de Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnologia (Confies), que terminou no último dia 17, em Curitiba. Entre os pontos questionados está o fato de os dirigentes das fundações não poderem ter ligação com as universidades.
Os diretores de fundações não estão nada satisfeitos com o decreto que passou a valer em julho deste ano. O assessor jurídico da Fundação da Universidade Federal do Paraná (Funpar), Hélio Flávio Leopoldino Rodrigues, diz que as regras estabelecidas servem para dar transparência e controle às organizações não-governamentais (ONGs), que não tinham nenhuma legislação para normatizar a aplicação das verbas. Porém, o governo resolveu colocar as fundações no mesmo pacote.
O problema é que as fundações já eram reguladas por uma legislação própria, a Lei 8.858/1994. Existem vários órgãos que fazem o controle do dinheiro que entra nas instituições e que é destinado às pesquisas. Entre eles o Tribunal de Contas do Estado, Tribunal de Contas da União, Ministério Público Estadual e Ministério Público Federal.
As novas regras devem trazer uma série de dificuldades. Uma delas é que proíbe-se, assim, o repasse de verbas para entidades privadas que tenham um servidor como dirigente para evitar qualquer tipo de favorecimento. No caso das ONGs, a medida dá mais transparência a todo o processo, mas complica o dia-a-dia das fundações.
O superintendente da Funpar, Hélio Hipólito Simiema, diz que os diretores devem entender como funcionam as universidades e fundações para conseguir fazer uma boa administração.
Os professores das universidades conseguem cumprir bem este papel porque fazem parte da estrutura. Além disso, segundo o estatuto da Funpar, por exemplo, o gerenciador da fundação não recebe salário. A remuneração vem da instituição de ensino.
Outro ponto questionado pelo assessor jurídico da Funpar é a adoção do sistema de cotação prévia de preços, que simplifica a contratação de terceiros para a realização de determinados serviços.
Segundo Rodrigues, a mesma medida não pode ser adotada pelas fundações, já que o volume de dinheiro movimentado é muito maior do que em uma ONG. Além disso, nem sempre é vantagem ficar com o menor preço, dependendo da tecnologia empregada e da estrutura de cada empresa. O sistema ideal para as fundações é processo de licitação.
Críticas
Além do Decreto 6.170, os participantes do encontro também criticaram a Portaria Interministerial 475/2008, editada pelos ministérios da Ciência e Tecnologia e da Educação.
Hélio Rodrigues explica que a norma fere a autonomia das universidades quando determina como será a composição da equipe de pesquisadores: é preciso que dois terços dos professores sejam da instituição que recebe a verba. Isso também inviabilizaria alguns experimentos científicos, já que atrapalharia o intercâmbio de docentes de várias instituições.
O representante do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Genildo Lins de Albuquerque Neto, defende que não houve alterações na legislação. O decreto foi el,aborado seguindo as regras existentes hoje, como a Lei de Responsabilidade Fiscal e Lei das Diretrizes Orçamentárias.
O único trabalho foi juntá-las no mesmo documento , segundo ele. Além disso, a partir de agora, as universidades podem inscrever seus projetos por meio eletrônico e toda a população tem acesso ao que está sendo feito, podendo acompanhar a prestação de contas.
Mas o superintendente da Funpar rebate a afirmação e diz que há uma série de inovações. O presidente do Confies, Paulo Bracarense, afirma que será elaborado um documento e enviado ao governo, questionando as mudanças.
Resultados rápidos versus estudos elaborados
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Visão prática e investimentos: mercado e instituições diferem no foco. |
A Lei de Inovação Tecnológica, de 2005, tem a finalidade de promover a interação entre as universidades, instituições de pesquisa e setor produtivo, estimulando o desenvolvimento de produtores inovadores pelas empresas brasileiras. Mas os reflexos ainda são pequenos.
O diretor de programas da Funpar, Wanderlei Veiga, diz que empresários e pesquisadores ainda não acertaram o passo. O setor produtivo quer resultados rápidos, mas os pesquisadores preferem a realização de um estudo bem elaborado, o que demanda tempo. O foco das pesquisas também difere.
Várias delas, apesar de serem importantes, não têm uma visão prática. Além disso, a pesquisa sempre representa risco e poucos empresários estão dispostos a pagar o preço.
“É necessário uma mudança cultural”, conclui. Mesmo assim, ele cita importantes avanços na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Desde 2003, quando foi criado o Núcleo de Propriedade Intelectual, já foram iniciados 80 processos de patentes. Até aquela data, a UFPR não tinha nenhum.
Porém, são bem poucos os realizados em parceria com a iniciativa privada. Além da mudança cultural há outros entraves à inovação tecnológica e eles estão na lei de inovação. Um deles se refere ao pagamento de royalties sobre os inventos para pesquisadores, universidade e o departamento que desenvolveu a pesquisa.
O problema é que o dinheiro deve ir para o caixa do Tesouro Nacional, o que dificulta a distribuição para os envolvidos no projeto. O superintendente da Funpar, Hélio Hipólito Simiema, afirma que as universidades têm orçamento engessado e são as fundações que dão maior mobilidade, possibilitando os estudos. Daí a necessidade de resolver todas as questões levantadas pelo Confies.
Pesquisa fica longe das empresas
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Bracarense: longo caminho. |
As empresas brasileiras ainda fazem pouca inovação tecnológica. A avaliação é do presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnologia (Confies), Paulo Bracarense.
Porém, ele afirma que o País já vem dando os primeiros passos para o avanço nesta área. Um exemplo foi a regulamentação da Lei de Inovação Tecnológica, de 2005.
Para Bracarense, o Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer quando o assunto é o desenvolvimento de novas tecnologias. Ele diz que, no País, 80% dos doutores trabalham em universidades públicas e uma boa parte das pesquisas não é destinada à inovação, à introdução de um produto novo no mercado. Situação bem diferente da dos Estados Unidos. Lá, 85% dos doutores estão dentro das empresas.
A distância entre o conhecimento gerado nas universidades e o mercado faz com que o número de patentes no Brasil seja bem menor do que em outros países que adotaram medidas para desenvolver esta área há mais temp,o. A Coréia do Sul, por exemplo, em 30 anos conseguiu superar o Brasil e, hoje, o País não tem 10% do número de registros obtidos pelos coreanos.