Além disso, este tipo de programa tem o código-fonte aberto. Ou seja, os usuários podem conhecer e modificar a lista de comandos que forma o software. O sistema operacional Linux, por exemplo, é desenvolvido com a colaboração de centenas de programadores de todo o mundo, que trabalham de graça para que todos possam usar um programa melhor. O software proprietário, como Windows, exige pagamento de licença, não dá acesso ao código-fonte e pertence a uma única empresa.
“A experiência gaúcha mostrou que é possível”, afirma o deputado Walter Pinheiro (PT-BA). “A vantagem não é só o preço. O software livre traz ganho técnico e operacional. A produção interna de software teve êxito em diversos órgãos do Rio Grande do Sul.”Ao lado do deputado Sérgio Miranda (PCdoB-MG), Pinheiro é autor da ação que paralisou, no ano passado, a licitação dos computadores nas escolas, realizada pelo Ministério das Comunicações. Um dos motivos foi o pouco espaço dado ao software livre.
Encontro de Lula com Bill Gates
O crescimento do software livre no governo federal traria perdas para a Microsoft. Bill Gates – fundador da empresa e homem mais rico do mundo – convidou o presidente eleito para um encontro nos Estados Unidos. A visita ainda não foi marcada. A idéia de integrantes do PT é que Lula se encontre também com representantes do software livre, como o programador Richard Stallman. O convite da Microsoft aconteceu em abril, quando o diretor-presidente da companhia, Steve Ballmer, encontrou-se com Cristovam Buarque em Seattle, nos Estados Unidos.
“A estratégia da Microsoft para atender ao governo permanece a mesma com a vitória de Lula”, diz o gerente de Marketing para Governo da empresa, Afonso Lamounier. No ano fiscal encerrado em junho de 2002, a subsidiária brasileira da Microsoft faturou R$ 878,5 milhões. “O governo, em todos os níveis, não chegou a 10% do faturamento”, explica Lamounier, que considera importante ampliar o espaço de participação das compras governamentais no faturamento da companhia. Quanto às propostas de integrantes do PT, o executivo afirma que é preciso “separar a visão comercial da ideológica. Em nenhuma das localidades governadas pelo PT deixamos de ser parceiros.”
Boa experiência no Rio Grande do Sul
Uma das condições para a manutenção da estratégia da Microsoft é que não sejam criadas leis que “limitem a concorrência”, de acordo com o gerente de Relações Públicas, Carlos Ximenes. “Se tentarem cercear a competitividade, ficaremos preocupados.” Na semana passada, a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou uma lei dando preferência ao software livre. De autoria de um deputado do PT, o projeto recebeu votos favoráveis também da bancada do PMDB, que assumirá o governo no próximo ano.
“No Rio Grande do Sul, o apoio ao software livre já transcende aos partidos”, diz Mario Luis Teza, vice-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul (Procergs). Teza elaborou e enviou à equipe de transição uma proposta, chamada “Pão e Liberdade”, mostrando que os recursos economizados com a adoção do software livre poderiam ajudar no Programa de Combate à Fome. O documento pode ser encontrado no endereço www.softwarelivre.rs.gov.br.
Novas soluções
Ele cita vários exemplos de redução de gastos pelo governo do Rio Grande do Sul usando o software livre. Segundo o vice-presidente da Procergs, os custos de informatização de 3.100 escolas gaúchas caíram de R$ 87 milhões para R$ 47 milhões. Com o DiretoGNU, que reúne sistemas de correio eletrônico, agenda e catálogo, o projeto da Rede Corporativa do Governo do Estado do Rio Grande do Sul (Rede RS) economizou entre R$ 30 milhões e R$ 60 milhões. A Rede RS interliga 60 órgãos do governo e atende a 300 mil funcionários públicos. O Banrisul, maior banco do Estado, deixou de gastar R$ 9 milhões com suas iniciativas de software livre.
A questão de custos, porém, é somente um dos argumentos para a adoção do software livre. “Até por questões de orçamento, seria difícil para o presidente Lula levar adiante todos os projetos sem o software livre”, diz Teza. Outra questão importante, destacada pelo vice-presidente da Procergs, é o incentivo à criação de soluções locais, o que desenvolve a mão-de-obra e o conhecimento. “Desde que criamos o projeto de software livre no Rio Grande do Sul, em 1999, o objetivo de desenvolver novas soluções foi o que mais avançou.”
Preço baixo em São Paulo
Em São Paulo, a Prefeitura adotou o software livre em seus 20 telecentros, que atendem a 62 mil usuários da periferia da cidade, oferecendo correio eletrônico, acesso à internet e treinamento em informática básica. No lugar do Windows, o sistema operacional é o GNU/Linux. Ao invés do Microsoft Office, a suíte de aplicativos é o OpenOffice. O navegador Galeon substitui o Internet Explorer.
Devem ser criados mais 80 telecentros até fevereiro de 2003, com o objetivo de atender a um total de 300 mil pessoas. A Prefeitura comprou 1.600 computadores para a ampliação, pagando R$ 930 por máquina. “Economizamos quase R$ 1 mil por micro em licenças de software”, afirmou Sérgio Amadeu da Silveira, coordenador do governo eletrônico na Prefeitura. “Foi o preço mais baixo já pago pela administração pública no País.”
Ele destaca que o Brasil ainda é um mercado bastante comprador de software. O País paga anualmente cerca de US$ 1 bilhão por ano em royalties de programas de computadores ao exterior. “Não temos nada contra a Microsoft, mas queremos desenvolver tecnologia aqui.”
Questão de princípios
A equipe da Prefeitura paulistana passou todas as informações sobre a experiência local ao grupo de tecnologia do novo governo. Segundo Lamounier, da Microsoft, a empresa doou as licenças de software para a Prefeitura de São Paulo e participa do projeto desde o começo. “Seria melhor se eles permitissem conviver as duas soluções.”
A Prefeitura optou, porém, por substituir os programas da Microsoft por software livre. “Com o software proprietário, a cada dois anos precisaríamos fazer atualizações, que poderiam custar R$ 2 milhões”, diz Silveira. Ele explica que o primeiro motivo para a opção pelo software livre é de princípios. “As linguagens básicas de computação não deveriam ser proprietárias de nenhuma empresa.”